“Finalmente, a felicidade parece ter me encontrado! E eu encontrado ela, a razão da minha felicidade! Feliz! Feliz! Feliz!” Quando Felipe postou a mensagem no Facebook, seis semanas depois do término do namoro de três anos com Virgínia, ela chorou por dois dias seguidos, mas aguentou firme em silêncio, sem esboçar qualquer reação ou resposta. “Sério! Passei a partir de hoje a acreditar em alma gêmea! Só pode ser isso! Acho que nossos destinos foram traçados na maternidade! Obrigado, meu Deus! Que momento! Feliz! Feliz! Feliz!” Três dias depois, na segunda postagem, a resposta de Virgínia a Felipe estava redigida, com toda a carga de ódio, dor e mágoa provocada pelo atribulado fim da relação, depois de uma suposta traição por parte de Felipe. Foi uma amiga de Virgínia que impediu o enviar da resposta, usando boa dose de argumentação, amparo, bom senso e conselhos. “Mudança de status: Em um relacionamento sério – Comentário: Feliz! Feliz! Feliz!” Trinta segundos depois que Felipe assumiu na mesma rede social estar em um novo compromisso, o seu celular tocou. Era a impulsiva Virgínia enlouquecida com a “novidade”. Ela não se aguentou e mesmo sem falar com Felipe há semanas, resolveu ligar. Antes, porém, ele deixou o telefone tocar por doze vezes até atender... – Alô! Felipe? Por que não atende esta droga, hein? – Oi, Virgínia! Quanto tempo! Tudo bem? – Fez isso só para me irritar, né? Fala... – Comigo está tudo bem... Antes que pergunte... – Estou vendo! – O que foi desta vez? Seja rápida! Não tenho muito tempo... – Só queria ser a primeira a te parabenizar pelo novo relacionamento! – Sei... – Felicidades ao novo casal! Muitas felicidades... – Hum... Sei... Como tu és irônica, hein Virgínia! – O que eu fiz, Felipe? – Nada, Virgínia! Nada... – Nada mesmo! Só liguei para te parabenizar... – Isso é ciúme? – Há! Há! Há! Eu com ciúmes, Felipe? Era só o que me faltava! Tu só podes estar louco em pensar uma coisa destas... Esquecestes que fui eu que te dei um “pé na bunda”, hein? Não gosto de resto, meu amor! – Resto? Bom saber que é assim que me vê, Virgínia! Estás cuspindo no prato em que comeu! Comeu e se lambuzou... – Deixa de ser idiota, Felipe! Palhaço! – Está bom! Eu sou idiota! Vamos encerrar por aqui. Não estou com vontade de discutir contigo de novo. Era isso? – Não! – O que mais, Virgínia? – Quem é a vagabunda? Posso saber? – Há! Há! Há! – Por que está rindo? – Desde quando eu preciso dar satisfação da minha vida pra ti, Virgínia? Não entrou na tua cabeça que acabou entre a gente? Que eu tenho uma vida nova agora? – Eu descubro! – Ué! Tuas amigas detetives ainda não descobriram? – Deve ser uma destas piriguetes... Tomara que seja... Assim ela vai fazer contigo o que tu fizestes comigo... Cuidado ao passar pelas portas, viu? – Chega! Eu não preciso dar satisfação da minha vida pra ti, Virgínia! Eu já te disse mil vezes que não te traí! Quer acreditar, acredita! Não quer, não acredita! Eu vou desligar! – Espera! Espera! – O quê? – Espera... – Fala... Quatro segundos de silêncio. – É que... – Fala, Virgínia! – Quer voltar pra mim, Felipe? A indagação pegou Felipe de surpresa, que silenciou por um instante. Cinco segundos depois... – Quer ou não, Felipe? – Virgínia... – A gente pode recomeçar do zero... Sem cobranças... Corrigindo os erros... – Virgínia é que... – Eu sei que ainda há amor entre a gente, Felipe! Vamos voltar? Larga essa piriguete e volta pra mim... – Não, Virgínia! – Eu sou o amor da tua vida e tu da minha... – Engraçado! Agora que vistes isso? Quando me dispensastes não estava pensando assim, não é? – Eu errei! Eu errei ao escutar os outros! Me desculpa! Vamos voltar? – Não! Agora sou eu que não quero mais nada contigo. Estou completamente apaixonado pela Daniele! – Da... Da... Daniele? A da farmácia? – É... Estou amando novamente! Em menos de duas semanas de relação já descobri que ela é o amor da minha vida! – Eu não acredito! Como eu fui tonta! Como não desconfiei que aquela simpatia toda quando íamos lá não era à toa... Eu não acredito! – Podes acreditar! – Tua exposição nas redes sociais está ridícula! – É o amor... Que mexe com a minha cabeça e me deixa assim! – Ridículo! É o fim... – Fim mesmo, Virgínia! Acabou entre nós... Já era! – É realmente isso que queres? Ficar com aquela vagabunda? – Não fala assim dela! – Aposto que vocês já andavam juntos há tempos! Como eu fui boba, meu Deus! – Chega, Virgínia! Acabou entre a gente. Não me liga mais! Passar bem. Tchau! Abraço... – Felipe... Virgínia demorou alguns dias para se recuperar da dispensa de Felipe. Entrou em um estado de tristeza profunda. Trancada em casa, não se relacionou socialmente com ninguém neste período. Começou a melhorar apenas depois de um curioso acidente. Era uma quarta-feira. Chovia e ventava moderadamente. Sozinha em casa e com fome, mesmo com o mau tempo, Virgínia resolveu ir à padaria, que ficava a duas quadras de sua residência, comprar algo para comer. Dirigiu-se ao local sem se olhar no espelho. Estava escabelada, sem maquiagem, de calça de moletom com um pequeno rasgo na perna esquerda e um moletom surrado da Minnie que tinha há anos. Em meio ao trajeto, uma rajada de vento fez com que o guarda-chuva que a protegia dos pingos virasse do avesso, dobrando as barbatanas ao contrário. Na tentativa atrapalhada de recolocá-las na posição correta, com o guarda-chuva de lado e na altura do peito, impulsionou-o “contra o vento” para frente. Foi então que, desastradamente, bateu em Anderson, que pilotava rapidamente a sua bicicleta, fugindo da chuva, depois de voltar do trabalho. A “guarda-chuvada” fez com que ele perdesse o equilíbrio e caísse no chão. Por sorte, não se machucou. Assim, nasceu o primeiro contato de Virgínia e Anderson. Já a paixão de Felipe por Daniele foi arrefecendo ao passar dos dias e as dúvidas em relação aos sentimentos aumentando. As comparações entre Virgínia e Daniele foram inevitáveis e crescentes a cada instante. As postagens no Facebook com declarações de amor foram se extinguindo. Começaram as primeiras brigas e os traços contrastantes das personalidades do casal a aparecer. Mesmo assim, os dois saíram para comemorar um mês de relação. Sábado. Em um restaurante. Quando Felipe e Daniela ingressaram de mãos dadas em um badalado restaurante da cidade tiveram uma desagradável surpresa. Enxergaram logo na entrada, acomodados em uma mesa, Virgínia e Anderson. Depois de conversarem muito pelo telefone após o acidente, os dois resolveram sair para se conhecerem melhor. Era oficialmente o primeiro encontro. Ao ver Virgínia com outro homem, Felipe se abalou completamente. Os seus sentimentos por ela afloraram subitamente. A “pancada” inesperada doeu forte. Perturbado, quis largar Daniela e correr para os braços de Virgínia. Quis ir até à mesa e tirar satisfações. Cogitou em fazer uma declaração e pedir perdão. Ou ao menos fazer uma confusão. Respirou fundo. A emoção estava à flor da pele, foi quando uma pontinha de razão guiou os seus pensamentos. Não era hora nem local para tal cena... Percebendo a reação do namorado com a situação, Daniela convidou Felipe para ir embora. Ele não quis. Queria vigiar cada passo de Virgínia, ver quem era o canalha que estava com ela. Queria tentar captar detalhes daquela nova relação. Se ela estava feliz. Ver se o cara era melhor que ele. Enfim, sentou-se em uma posição no restaurante que lhe permitiu ter uma visão diagonal para Virgínia. Pediu um uísque ao garçom. Precisava tomar alguma coisa forte naquela noite. Mal sabia ele que as surpresas não tinham acabado e que trocaria o foco logo em seguida. 10 minutos depois. Restabelecido do choque inicial, a estratégia de Felipe foi interpretar no restaurante. Encenou que estava feliz, soltando altas e largas gargalhadas. Cumprimentou a todos de forma efusiva. E, principalmente, tentou demonstrar que estava completamente apaixonado por Daniela, beijando-a e abraçando-a. Enquanto isso, no outro canto do lugar, Virgínia se encantava com as histórias contadas pelo garoto tímido. Foi então que, aproveitando-se do momento do namorado, que Daniela resolveu fazer uma revelação. – Amor! – Fala minha vida! – Eu preciso te contar uma coisa... – Conta. O que houve? – É uma novidade que vai mudar a nossa vida... – Fala logo! Estou ansioso... – Eu não sei como tu vais reagir! – Fala logo! – Está bem! Vamos lá... Que nervosa! Felipe: eu estou grávida! – Como é que é? O que estás me dizendo, Daniela? – Isso que ouvistes! Eu estou grávida! Vamos ter um filho! Tu serás papai! E mesmo com o restaurante lotado, eufórico, Felipe não se conteve e gritou: – Eu vou ser papai! Foi cumprimentado por todos e até ganhou uma música em homenagem do músico que se apresentava no restaurante. Virgínia viu toda a cena em silêncio. Baixou a cabeça por um instante e depois sorriu com o prazer doce da vingança. Foi a primeira a perceber que pelo tempo de relação e o fato da confirmação da gravidez, o filho que Daniela esperava não era de Felipe. Aproveitou o murmurinho para beijar Anderson pela primeira vez. Três meses depois, durante uma ecografia de rotina, Felipe descobriu a armação de Daniela quando a médica revelou a quantidade de semanas da gravidez. Era o fim do relacionamento. Arrependido, ele tentou voltar para Virgínia prometendo amor eterno. Era tarde demais. Ela já estava envolvida pela sua nova paixão... A vida e suas nuances.
Nota do Editor: Rodrigo Ramazzini é cronista.
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