Três da madrugada. Subiu as escadas cambaleando. O hálito de cerveja o incomodava. O estômago apertava. A cabeça girava. Antes de entrar em casa, pegou uma bala de hortelã e colocou na boca. Procurou a chave no bolso da calça. Nada. Procurou no bolso do paletó. Ouviu um barulhinho. Finalmente. Pegou e rodou a chave na fechadura, devagar, para não fazer barulho. O poodle da vizinha latiu. Deu um pulo para trás. Prometera a Elvira nunca mais chegar tarde. Ela o ameaçara. Terminaria o casamento se acontecesse de novo. Não queria trair a esposa. Mas não resistiu. Tinha a cabeça mole demais. As mulheres eram seu ponto fraco. Elas o provocavam. Tinha imã. Atraía mulheres de todos os tipos e idade. A loira era linda. Um fenômeno. Acenou com o olhar enquanto atravessavam a avenida Rio Branco. Os bicos dos seios endurecidos na blusa transparente lhe deram vertigem. Quase morre atropelado. Ela o puxou para a calçada antes que o ônibus o deixasse no asfalto. Estavam embriagados de tesão. Fez o convite. Beberam e gargalharam como velhos conhecidos. Terminaram a noite num motel ordinário no Centro da cidade. Quase três da manhã lembrou-se de Elvira. O coração acelerou. Deixou a loira perto de casa. Fingiu que anotou o telefone no celular. O aparelho estava desligado. Abriu a porta. Colocou os pés na sala com o coração acelerado. Deu um pulo. A luz do abajur clareou o rosto de Elvira. A esposa estava com os olhos trepidando de ódio. Um sorriso de mulher mofada na boca pequena. A cadeira de balanço rangia. Nas mãos, ela segurava uma arma. Lambia os beiços. Passional. Desgovernada. Num gesto de desespero, tentou desarmá-la. Só que, enquanto ele saía com as outras, ela treinava pontaria. Um tiro no coração. Sem barulho. Eficaz. Com pose de vilã de filme de bang-bang, saiu da cadeira, chutou o corpo com cara de nojo, cuspiu no rosto do morto, colocou a arma dentro da mala, trancou a casa e desceu as escadas em silêncio. Na calçada, um Monza 89 esperava-a com os faróis ligados. Na direção, uma mulher com o cabelo pintado de duas cores fazia sinal. Entrou no carro. Olharam-se cheias de cumplicidade. A motorista partiu apressada. Elvira respirou aliviada. Missão cumprida.
Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
|