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COLUNISTA
Celamar Maione
05/10/2009 - 12h01
Tarado por calcinha
 
 

Pericles adorava calcinha. Sonhava com calcinha, venerava calcinha. Quando criança, amava espiar a mãe e a irmã pelo buraco da fechadura. No banho, deliciava-se quando, por um descuido, elas deixavam as calcinhas penduradas no box. Ao completar 22 anos tornou-se um obsessivo pela roupa íntima feminina. Familiares e amigos acreditavam que só um psicólogo poderia entender-lhe a tara. Sempre que uma mulher o interessava, logo ele perguntava curioso:
- Eu sei que pega mal, mas por favor, não se ofenda com o que vou perguntar. Poderia me dizer que tipo de calcinha você gosta de usar?

As mulheres sentiam-se invadidas com a pergunta e o romance acabava antes de começar. As amigas o achavam um boboca infantil. Ele não se importava. Ria de fazer borbolhas. Na mesa de bar, com dedo em riste, defendia suas idéias como se estivesse num palanque. Ficava vermelho e se engasgava com os petiscos.
- Não admito ir para a cama com uma mulher de calcinha furada e grandona e nem com calcinha de florzinha. Não sou pedófilo!

Recebia conselhos:
- Cara, tá certo que você gosta de calcinha cavadinha, preta, sensual, também gostamos. Mas ficar perguntando isso pra mulher que você acabou de conhecer é grosseria. Não se mede uma mulher pela calcinha que ela usa.

Pericles retrucava:
- Você transaria com uma mulher com a calcinha suja? Rasgada? Melhor broxar antes do que broxar na cama.

Nas festas ou baladas os amigos ignoravam Péricles. Não queriam passar vergonha. Na cara-de-pau, ele perguntava às desconhecidas nas baladas:
- Que tipo de calcinha você gosta de usar?

Se recebia um fora, disfarçava e arrumava outra vítima.
- Posso ver sua calcinha? Deixa?

As mais desinibidas levavam na brincadeira e o chamavam de excêntrico. As mal humoradas, porém, partiam para a agressão verbal e o chamavam de bêbado. Nem assim tomava jeito. Ainda contava para os amigos gargalhando:
- Se a vadiazinha ficou ofendida é porque devia usar calcinha ordinária.

O coração de Pericles bateu mais forte quando conheceu Leninha. Moça linda e com sorriso de capa de revista. Era prima de um grande amigo. Encantou-se pela morena e abriu o coração para Reginaldo, que o preveniu:
- Vai com calma, é minha prima! Se ficar de palhaçada vai se ver comigo. É meu sangue.
- Pode deixar. Fica tranqüilo.

O namoro completou um mês. Meio a contragosto, Péricles segurou a curiosidade a respeito das calcinhas da moça. Tentando se controlar, pensava: “Uma mulher bonita só pode usar calcinha sensual. Ela é a mulher da minha vida”.

A primeira e única noite de quase amor entre os dois aconteceu na casa da namorada. Estavam sozinhos assistindo a um DVD. Depois de duas taças de vinho, começaram as carícias. Quando Pericles levantou o vestido de Leninha, gritou assustado:
- Cueca??!! Isso não é uma calcinha!!!?? É uma cueca do piu piu!
Com voz adocicada, ela o puxou pela nuca:
- Qual o problema, amor? Gosto de usar cueca. São mais confortáveis. Vem, gostoso, tira a minha cuequinha.

Ele perdeu o tesão. Broxou. Teve ânsia de vômito. Tonto, empurrou Leninha, vestiu-se e saiu se batendo pelas paredes. Nunca mais viu a jovem. Revoltado, Reginaldo tomou satisfação:
- Você é um desequilibrado. Precisa de um psiquiatra. Como você pôde humilhar minha prima assim, cara? Louco de pedra!

Péricles não se intimidou:
- Sou como sou. E pronto. Não gostou? Então bate.

Para evitar futuras decepções, Péricles passou a comprar calcinhas e distribuir entre as ficantes e namoradas. Em casa, tinha uma coleção delas, de todas as cores, modelos e tamanhos. Quando conhecia uma mulher, no primeiro dia presenteava-a.
- Na nossa primeira vez, faço questão que você use a calcinha que eu escolher. É um presente. Aliás, sempre que a gente tiver relações, quem escolhe a calcinha sou eu!

Pericles está casado com Mirialva há dois anos. Até hoje é ele quem compra as calcinhas da esposa.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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