Noite fria de quarta-feria. Macedo assistia ao jogo do Flamengo pela televisão, quando Marinilce apareceu na sala aborrecida. - Não tá me escutando chamar lá do quarto? - Fala?! O que é? Vou perder o gol do mengão. - Depois você vê isso. Agora vai lá no quarto para pegar o edredom em cima do armário. Não alcanço. - Edredom? Outro? Mas você não pediu para eu pegar um na segunda-feira? - Pedi. Agora tô pedindo para você pegar outro. - Como se gasta sabão em pó nessa casa – reclamou Macedo. - O que tem uma coisa a ver com a outra? - Usou o edredom dois dias e já colocou pra lavar? - Não. Esse que você vai pegar é outro. Quem vai dormir com ele sou eu. - Você? - É. - Você está querendo dizer que cada um vai dormir com um edredom? - Nossa como você é inteligente! – debochou Marinilce. Macedo, que ia se levantando do sofá, tornou a sentar-se. - Macedo, eu quero dormir. Vai logo pegar meu edredom. - É por isso que nosso casamento tá indo para o buraco. Agora cada um dorme com um edredom. Daqui a pouco dormiremos em camas diferentes... - Não acredito que você vai arrumar briga por causa disso. - Posso saber por que a princesinha quer dormir com um edredom só pra ela? – ironizou. - Porque durante a noite você puxa o cobertor para o seu lado e eu fico morrendo de frio. - E por que você não me acorda ou puxa o cobertor? - Toda noite, Macedo? Não é mais fácil cada um dormir com um edredom? - Não. Assim eu não posso ficar juntinho de você. - Na hora que a gente dorme você tá juntinho. Depois você se espalha e aí quem se dá mal sou eu. - Eu não vou pegar outro edredom. Nós vamos dormir juntinhos. Fim de papo. - Ah é? Vou no seu Aníbal pedir para ele pegar o edredom pra mim! - Duvido. Você não é besta. - É? Decidida, Marinilce abriu a porta. Macedo impediu-a de sair. A discussão recomeçou. - Marinilce, desiste da história de cada um dormir com um edredom. Você está colocando nosso casamento em risco. - Deixa de ser besta, Macedo. Dez anos de casados. Até parece que casamos ontem! - Fim de papo, Marinilce! O jogo vai começar! Vai dormir com o edredom que tem e quando eu for deitar, me viro. - Tá frio Macedo. De noite você vai puxar o edredom e quem vai ficar com frio sou eu! - Isso vai dar em separação. Foi por causa disso que o casamento do Ismael acabou. - O que tem a ver o casamento do Ismael com o nosso? - Primeiro a esposa começou a dormir no sofá por causa da tosse do Ismael Depois, foi dormir na casa da mãe. E em seguida... arrumou um amante. - Não dava para ele tomar um remédio pra tosse? - Outro edredom, não! Fim de papo! O jogo vai começar. Psiu! - Ah é? Então vou no apartamento da Judith pedir um edredom emprestado. - Pois então, vá! Só estou lhe avisando: Nosso casamento está por um fio! Marinilce saiu decidida. Tocou a campainha na casa da vizinha. Sérgio André atendeu: - Você poderia chamar a Judith? - Hoje ela vai dormir na casa da irmã. Deseja alguma coisa? Entra – disse, simpático. Marinilce achava o marido da vizinha pedante, mas aceitou o convite para entrar. Ele fez um café e gentilmente ofereceu a ela. - Posso ajudar em alguma coisa? Aquela pergunta delicada fez Marinilce gelar as entranhas. Estremeceu quando Sérgio André tocou-lhe levemente nos braços. - Está sentindo alguma coisa? O café está muito quente? Não respondeu. Um torpor estranho tomou todo seu corpo. Ajeitou a roupa e gaguejando despediu-se de Sérgio André. - Eu falo com a Judith depois. Saiu batendo a porta. Chegou em casa em estado de êxtase. Os pensamentos fervilhavam. Passou pela sala e não deu boa noite ao marido, que gritava sem tirar os olhos da TV: - E aí? Pegou o edredom com a Judith? Não respondeu. Cobriu-se ainda em estado de letargia e adormeceu. Sonhou que fazia sexo selvagem com Sérgio André. Acordou suspirando. Voltou a dormir e a sonhar. Com medo de desagradar Marinilce, Macedo dormiu com um lençol. Tremendo de frio, pegou no sono quando o dia clareava.
Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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