João Paulo bateu com uma das mãos na mesa do bar mais uma vez e falou com ar de dono da verdade: - As mulheres são todas interesseiras! Gostam de um carro importado e de uma boa conta bancária. Não pago despesa de mulher. Meu dinheiro é meu! Só minha mãe usufrui dele. Os dois amigos que ouviam atentos o discurso de João Paulo, discordaram. Cassiano, amigo de infância, foi o primeiro a falar: - Você exagera. É por isso que está solteiro. Vai me dizer que a Ana é interesseira? Estamos casados há 6 anos e felizes. Jader, o outro amigo, também foi em defesa das mulheres: - Cassiano tem razão. Nem todas as mulheres são interesseiras. Você está precisando se apaixonar, namorar e casar. João Paulo bateu mais uma vez na mesa, indignado: - Tá louco. A solteirice é um sacerdócio. Na verdade o amor é um grande jogo de interesse. Os amigos balançaram a cabeça. João Paulo, inflamado, continuou o discurso: - E tem mais: quando saio com uma conquista, a despesa é dividida. Elas não quiseram igualdade? Uma vez saí com uma interesseira e levei para o motel. No final, na maior cara-de-pau, só para irritar, perguntei: vai dividir ou vai pagar sozinha? Cassiano comentou, já conformado com as idéias do amigo: - Esse aí não tem jeito não. É um escroto narcisista e arrogante! Acabaram rindo e pediram mais uma rodada de chopp. Incentivado pela risada dos amigos, terminou o discurso diante do olhar atento de um homem que estava sozinho na mesa ao lado: - Mulher é um bicho confuso: queriam igualdade e agora reclamam de solidão? As carentes até pagam para ter companhia. E eu lá tenho cara de psicólogo para acabar com a carência de alguém? João Paulo, 38 anos e bem sucedido profissionalmente, morava com os pais. Com um físico invejável, freqüentava academia todos os dias. Nunca namorou sério. Tinha aversão a compromisso. Enjoava logo das namoradas. Quando chegava nas festas, as mulheres se agitavam. Relacionava-se sempre com mais de uma. Além de namoradas, colecionava também amigos. Era popular. Não tinha amigas. Não acreditava em amizade entre um homem e uma mulher, principalmente com mulheres bonitas. Apaixonou–se por si mesmo. A primeira coisa que fazia, quando tirava a roupa no motel, era se olhar no espelho. Se admirava durante um tempo e dizia, cheio de orgulho, para a namorada que o acompanhava no momento: - Sou ou não sou gostoso? Cassiano era o melhor amigo. Apesar das diferenças de idéias, se respeitavam. Sabendo da aversão de João Paulo a casamento, costumava provocar: - Um dia aparece uma mulher para tirar você do sério! Quero ser padrinho dos seus filhos. - Isso que é amigo. Me desejar uma coisa dessas. Tenho alergia a compromisso e mulher pegando no meu pé...! Gosto de liberdade, trabalhar, ganhar dinheiro, viajar e aproveitar muito. Tem muita mulher gostosa se oferecendo. Não dá para ficar com uma só. Por causa de uma viagem de trabalho à Europa, Cassiano e João Paulo ficaram afastados durante um ano. Assim que voltou do exterior, ligou para o amigo: - Cassiano, tenho uma surpresa para você. Quando posso ir até sua casa jantar e revê-lo? Estou com saudade dos nossos papos! Marcaram um almoço três dias depois, no sábado. Quando João Paulo chegou acompanhado de uma jovem alta, simpática e sorridente e apresentou-a como noiva, Cassiano se surpreendeu: - Que milagre é esse?! Achei que ia morrer solteiro. - Pois é, milagres acontecem. Nos conhecemos na Espanha. Começamos a namorar para espantar a solidão e ficou sério. E mais: vamos casar e quero você padrinho do meu casamento. - Casar? Como manda o figurino: igreja, festa, véu...?! João Paulo interrompeu e continuou: - Exatamente... grinalda, flor de laranjeira, festa... padrinho... os pais dela são católicos tradicionais e fazem questão. - Quem diria... parabéns! Estou orgulhoso do amigo. No dia do casamento, com a igreja lotada, amigos e familiares de João Paulo comentavam o enlace, considerado uma grande zebra. Marcado para às 7 da noite, deu 7 e meia e nada de João Paulo aparecer. Cassiano ligou para o celular dele mas não obteve resposta. A noiva chegou e recusara-se a descer do carro enquanto o noivo não aparecesse. Quando o relógio bateu 8 da noite, as fofocas e comentários maliciosos começaram. O padre avisou que não teria mais casamento. Os pais de João Paulo ligavam para o celular do filho, que não atendia. A mãe de João Paulo tentava se desculpar com os familiares da noiva: - Deve ter acontecido alguma coisa... não é possível... saí de casa, ele estava se arrumando... Sentindo-se humilhada e prometendo se vingar dos homens, Melissa pediu ao motorista que a tirasse da porta da Igreja. Cassiano, finalmente, conseguiu contato com o amigo: - Rapaz, onde você se meteu? Tá a maior confusão na Igreja. Seus pais estão constrangidos.... a Melissa já foi embora... os convidados também... Do outro lado da linha, João Paulo ria: - Estou dirigindo em direção a Angra dos Reis com uma morena de dar inveja. Conheci na festa de solteiro. Lembra? Me fez perder a cabeça. A vida é boa demais para viver o resto da vida com uma mulher só... Quanto mais, melhor! Cassiano tentou convencer o amigo a voltar para dar uma satisfação. No final, sem sucesso, falou: - Cara posso dizer uma coisa, com todo respeito? - Diga. Somos amigos. Unha e carne. - Você é mesmo um escroto narcisista e arrogante!!! E começaram a gargalhar!
Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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