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COLUNISTA
Celamar Maione
15/06/2009 - 13h00
O segredo da doutora Lacerdinha
 
 

Doutora Lacerdinha era uma chefe rigorosíssima. Temida e também odiada pelos funcionários, sentia prazer em humilhá-los. Saboreava com ares de sadismo, sentindo-se poderosa cada vez que descobria uma funcionária chorando no banheiro por causa de alguma bronca.

Quando chegava na empresa era um tormento para os subalternos.
- Guarda a revista que lá vem a bruxa!
- Gente... doutora Lacerdinha está chegando!
- Psiuuuuuu, silêncio, sente o perfume da peruona! É ela!

Era um tal de se ajeitar. Arrumar roupa. Parar de conversar. Jogar copinho de café no lixo. Doutora Lacerdinha chegava pisando firme e dando ordens.
- Claudomiro, vá até minha sala! Quero ver como ficou o relatório!
- Dulcineia, já ligou para o homem do tapete?
- Por que este ar-condicionado não está ligado? Já disse que quero a sala gelada quando chego.

O horário de expediente era de 9 às 18 horas, mas doutora Lacerdinha tinha simpatia por funcionários que chegavam duas horas antes e saíam duas horas depois. Geralmente quando chegava, às nove, gostava de ver os funcionários sentados em seus lugares. Quando percebia um lugar vazio perguntava com ares de enfado:
- Quem é o atrasadinho que senta neste lugar? Por que ainda não chegou? Nove horas! Manda na minha sala assim que colocar os pés na porta.

Às vezes, doutora Lacerdinha madrugava no escritório. Isso quando não trabalhava nos finais de semana e ainda convocava funcionários. Gostava de adiantar serviço. Nos dias em que acordava mal-humorada, passava o expediente trancada na sala e não saía nem para almoçar. Curiosos, os empregados colocavam o ouvido na porta na esperança de escutar alguma coisa. Tinha gente que jurava ouvir gemidos:
- Acho que está se masturbando...
- Coitada, no fundo é uma infeliz, deve estar chorando...

Os funcionários não conheciam a vida particular de doutora Lacerdinha. Sabiam apenas que não era casada e morava com a mãe. Costumavam especular:
- Parece que doutora Lacerdinha é viúva. O marido e o filho morreram num acidente de carro e ela dirigia.
- Que nada! É solteirona. Quem vai casar com essa perua?
- Foi abandonada pelo noivo no altar e revoltou-se!
- Traída pela melhor amiga...
- O noivo era gay... ficou com nojo de homem!
- Aposto que é virgem...

Ao que a funcionária mais debochada falou:
- Só se for nos ouvidos!

Eram muitas as especulações. Sabia-se apenas que ela administrava com mãos de ferro a filial da empresa com matriz em São Paulo. Aparentava 50 anos. Pintava os cabelos de vermelho – há quem apostasse que usava peruca – era magra, andava com roupas de griffe e perfumada. Porém exagerava na maquiagem e nas bijuterias. Daí o apelido de perua. A fama da doutora Lacerdinha era conhecida nas filiais de outros estados. Quando um funcionário discutia com um colega de trabalho, chegava atrasado ou faltava, era ameaçado com transferência para o Rio.
- Cuidado, se continuar faltando vai trabalhar com a doutora Lacerdinha no Rio de Janeiro!

Foi o que aconteceu com Joelson no Espírito Santo. Ele e o chefe tiveram um desentendimento sério; como Joelson era bom funcionário, seu Etebaldo fez-lhe uma proposta:
- Você sabe que nosso relacionamento está arranhado. Gosto de você, sei que é um excelente funcionário, mas infelizmente não podemos mais trabalhar juntos. Temos pontos de vista diferentes. Aceita esta transferência?

Com família para sustentar e medo do desemprego, não teve escolha. Os colegas de escritório sentiram pena.
- Vai trabalhar com aquela perua recalcada? Coitado!!

Foi recebido pelos colegas no Rio com festa.
- Oba chegou mais um para dividir o esporro com a gente!
- Legal, você vai adorar os seus colegas de escritório. Sou o Arthur...
- Oi, sou Luciana!
- E eu sou a contadora: Waléria.

Joelson sentiu-se à vontade. Quando doutora Lacerdinha chegou, apresentou-se:
- Senhora Lacerdinha, sou Joelson. Seu novo funcionário... venho do...

Foi interrompido. Quando ele chamou Lacerdinha de senhora... os funcionários se entreolharam... alguns abaixaram a cabeça...
- Xiiiiiiiiiiiiiiiiiii! Lá vem esporro.
- Coitadinho... logo no primeiro dia.

Lacerdinha o interrompeu furiosa:
- Faça-me o favor: me chame de DOUTORA Lacerdinha. Entendeu ou preciso explicar novamente? Como é seu nomezinho mesmo?

Joelson, sem graça, apenas balançou a cabeça e pronunciou baixinho o nome. Quando ela virou as costas, ele perguntou:
- Ela é advogada? Fez doutorado? É médica?? Por que doutora Lacerdinha?
- Não procure entender. Ela gosta de ser chamada de doutora. Deve ser algum complexo. Não discute. Chama a perua frustrada de doutora e pronto.

Com um mês de trabalho, Joelson não agüentava mais as arbitrariedades de doutora Lacerdinha. Quando falou que no domingo todos os funcionários trabalhariam, Joelson se revoltou.
- De novo?! É aniversário da minha filha. Já não basta que essa semana a perua só liberou a gente 10 da noite? Não agüento mais! Vou pedir demissão.

Os colegas aconselharam:
- Calma. Emprego tá difícil.
- É verdade. Temos que pagar nossas contas no final do mês. Tenha paciência!
- Chega! Paciência tem limite. Não aceito ser comandado por essa perua mal-amada e mal-comida. Vou pedir demissão agora.

Saiu apressado em direção a sala de doutora Lacerdinha. Nem pediu licença. Meteu a mão na porta e entrou. Ela estava sentada mexendo no computador e se assustou ao ver Joelson:
- Que atrevimento é esse?! Quem deu autorização para entrar na minha sala seu intrometido abusado?!
- Vim pedir demissão! Não agüento mais olhar para a sua cara de perua carente!

E para extravasar a tensão durante o mês que trabalhou com a doutora, exagerou: tirou as calças, arriou as cuecas e sacudiu o saco para ela.
- Aqui ó! Sou muito macho e não tenho medo de você, Lacerdinha!

Doutora Lacerdinha arregalou os olhos, se levantou da cadeira e por alguns instantes olhou admirada o pênis de Joelson. Em seguida, saiu correndo em direção a ele gritando. Um grito que mais parecia um uivo, quase uma redenção:
- Ai meus Deus! Acode! Nossa!!!... é muito bom... é bom de... demaissssssssss.

Não aguentou a emoção e desmaiou aos pés de Joelson, com um enorme sorriso nos lábios.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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