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COLUNISTA
Celamar Maione
12/05/2009 - 07h00
Maria Cristina
 
 

Sábado de sol. Maria Cristina se levantou da cama, fez café e chamou o marido:
- Osório, vamos à praia?
- Que horas são?
- Quase nove.
- Preguiça. E mesmo assim, dia de sábado, a praia está cheia.

Virou-se para o lado, resmungou alguma coisa e voltou a dormir. Maria Cristina se encaminhou para a sala reclamando baixo:
- Eu me casei com um merda. Não gosta de nada.

Abriu a janela e olhou para a rua com o olhar distante. Sônia, vizinha da casa em frente, lhe fez o convite:
- Vem até aqui. Hoje fiz um super café da manhã. Com direito ao bolo que você gosta!

Aceitou. Empolgou-se ao ver uma farta mesa preparada cuidadosamente pela vizinha. Sônia contou o motivo da comemoração:
- Lembra do Julinho? Meu menino?
- Claro. A última vez que eu o vi estava com 13 anos.
- Pois é. Foi morar com o pai em Sergipe, mas voltou para ficar definitivamente comigo. Meu garoto está com 19 anos. Você não vai reconhecer.

Julinho apareceu na sala cinco minutos depois. Maria Cristina impressionou-se com a beleza do rapaz. O menino franzino transformara-se num belo homem. Alto. Forte. Cabelos pretos ondulados e olhos brilhantes, cheios de juventude. A mulher, carente de carinho, sentiu uma pontada no estômago ao lembrar do marido que dormia em casa: “Horrível, barrigudo e preguiçoso”. Voltou à realidade com Julinho abraçando-a.
- Dona Maria Cristina, lembro da senhora. A senhora brigava tanto comigo porque minha bola de futebol às vezes ia parar dentro da sua varanda.

Riram das lembranças. Maria Cristina voltou pra casa meio-dia. Osório reclamou impaciente:
- Posso saber onde você se enfiou?
- Interessa?
- Claro. Quero almoçar e descansar, para mais tarde ir ao Maracanã. Hoje tem jogão de bola.
- Ah é?! Pois eu tenho uma novidade pra você.

Olhou pra esposa curioso. Mordendo os lábios, Maria Cristina falou com voz afetada:
- Hoje não tem almoço.
- Quê isso? A gente almoça fora a semana toda, hoje quero comer da sua comidinha.
- Vai ficar querendo. Eu vou para o quarto ler e dormir.
- Não vai almoçar?
- Não. Tomei um farto café da manhã na casa da Sônia. O filho dela voltou pra casa.
- O garoto voltou é? O pai deixou?
- Voltou para morar com ela.
- Egoísta. Não trouxe um pedaço de bolo pra mim?
- Você não merece.

Osório tomou banho e saiu. Almoçou um prato feito no botequim da esquina. A semana foi entediante para Maria Cristina. De casa para o trabalho, do trabalho pra casa. Passou a colorir a vida com sonhos eróticos. O protagonista? Julinho. Imagina-se passeando com ele pelas areias da praia de Copacabana. Terminava o passeio assistindo o pôr-do-sol no Arpoador. Aos 35 anos, sentia-se uma mulher sem motivação para viver. Lamentava o casamento falido, sem filhos, com um marido frio e distante.

Julinho tornou-se uma válvula de escape. Uma ilusão que a incentivava a acordar todos os dias. Numa sexta-feira, ela chegou mais cedo do trabalho, e encontrou o rapaz voltando da faculdade. Convidou-o para um café. Conversaram na sala. Maria Cristina empolgou-se acreditando que o sonho poderia se transformar em realidade. “Loucura?” – ela pensou – “Não, loucura é continuar casada com Osório“ – justificou.

Osório chegou do trabalho e encontrou Julinho na sala. Entrou na conversa. O rapaz passou a visitar o casal quase todos os dias. Quando Julinho saia, Osório comentava com a esposa:
- Que rapaz gentil! Sabe que não temos filhos e resolveu nos fazer companhia!

Maria Cristina não gostou do comentário e devolveu:
- Ele não tem idade para ser meu filho. Nunca seria mãe aos 16 anos.
- Não falei por mal. Você leva tudo a sério demais. Como você é mal-humorada!
- Eu?

Osório fugiu da discussão aumentando o som da televisão. Antes de dormir, falou com a esposa:
- Amanhã saio cedo de casa. Vou fazer um extra no trabalho.

Maria Cristina gostou. Seria uma ótima oportunidade para conversar a sós com Julinho. Não teve sorte. Sônia avisou que o filho saiu cedo com amigos. Carente, Maria Cristina insinuava-se para Julinho. Ele fingia não entender. Ela insistia. Ele fugia. Prometeu não desistir. Daria um tempo.

Resolveu passar um final de semana na casa da mãe. Longe do marido, assediaria Julinho por telefone. Despediu-se de Osório dizendo que voltaria segunda-feira depois do trabalho. Ligou no sábado para o celular do rapaz. Desligado. Domingo a mesma coisa. Desistiu da estratégia. Voltou para casa no domingo à noite, desolada. Passava das onze quando enfiou a chave na fechadura. Silêncio. Maria Cristina pensou: “A pústula do Osório deve estar roncando”.

Do corredor percebeu que a luz do abajur do quarto estava acesa. Andou em silêncio. Não queria acordar o marido. O coração quase parou quando entrou no quarto. Osório e Julinho estavam na cama aos amassos. A respiração parou. Pensou em gritar. Avançar nos dois. Teve uma idéia. O desespero a encorajou. Tirou várias fotos no celular. Agiria rápido. Foi até o quarto ao lado, abriu o armário e pegou dinheiro no bolso da calça do marido. Em seguida, pegou os talões de cheque de Osório. Voltou para a casa da mãe.

Usou o computador do quarto do irmão. Mandou as fotos para todos os e-mails conhecidos. Espalhou pela internet. De madrugada, treinou a assinatura de Osório.

Pela manhã, despediu-se da mãe. Falsificou a assinatura do marido e deixou apenas dez reais na conta dele. Raspou a conta conjunta. Estourou os limites dos cartões adicionais comprando roupas e sapatos. Passou o dinheiro da poupança que tinha com Osório para uma conta particular. Ligou para o trabalho e xingou o chefe. Desligou aliviada.

Viajou sem destino.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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