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Contos
09/12/2008 - 13h11
A irmã
Celamar Maione
 

Assim que Valdemar colocou o carro na garagem, a discussão começou.
- Cara-de-pau, você não vale nada!
- Eu? Tá maluca, Rose?! O que foi que eu fiz?! Pode me dizer?
- Você e a piranha da minha irmã flertaram descaradamente no churrasco.
- Como? A Ritinha e o Sinval se amam. Ele estava ao lado dela o tempo todo.
- Tá vendo? Peguei você. Como é que você sabe que o Sinval tava do lado dela?
- Ele é marido dela e eu vi, não sou cego.

Deitaram-se. Rose apagou a luz . Valdemar tentou tocá-la. Ela gritou:
- Tira essas patas sujas e infiéis de cima de mim!

Valdemar se virou para o lado e dormiu. Saíram para trabalhar brigados. Na hora do almoço, Valdemar ligou para a cunhada.
- Precisamos conversar com urgência. Tem um tempo pra mim na hora do almoço?
- Claro, cunhadinho. Me diga o nome do restaurante.

Valdemar chegou primeiro. Dez minutos depois, Ritinha apareceu, com rosto tenso.
- O que aconteceu? Que urgência é essa?
- Sua irmã.
- Está doente?
- Cismou que eu e você temos um caso.
- Jura? – Ritinha deu uma risada – Não liga. Daqui a pouco passa. A Rose sempre foi ciumenta.
- Mas o ciúme dela é sem fundamento e pode acabar em tragédia.
- Cruzes, bate na madeira! Nunca demos motivos para desconfianças.
- Eu sei, por isso chamei você aqui. Fala com ela. Imagina se cai na boca do Sinval?
- Deus me livre, nem é bom pensar!
- Então, fala.

Ritinha prometeu procurar a irmã para terem uma conversa séria. Na sexta-feira apareceu para jantar com Rose. Ajudou-a a colocar à mesa e durante a refeição entrou no assunto.
- Como está seu casamento?
- Por que a pergunta? Que curiosidade é essa?
- Curiosidade de irmã.
- Eu sei porque você quer saber.
- Então me diga.
- Você e Valdemar estão de caso.
- De onde você tirou essa história?
- Pensa que eu não sei? Que não vejo a troca de olhares?
- Essa acusação é muito séria. Você tem que ter provas.
- E precisa? Basta olhar vocês dois.
- Perdi a fome! Seu ciúme passou dos limites. Chega.

Ritinha pegou a bolsa e saiu batendo a porta. Nervosa, chegou em casa e ligou para o celular de Valdemar.
- Sinto muito, impossível conversar com a Rose.
- Não vai mais me ajudar?
- Desculpe, se vira, a esposa é sua.

Sinval chegou na sala no exato momento em que Ritinha desligava o telefone reclamando.
- Por que está tão zangada? O que aconteceu?
- Nada.
- E por que essa cara emburrada?
- Já disse, não é nada.
- Quanto mais negar é pior. Fala, o que está acontecendo?
- A doida da minha irmã cismou que eu e Valdemar estamos de caso.
- E estão?
- Se eu tivesse iria comentar com você?
- Estratégia. Sei lá. Ela não ia tirar isso do nada. Onde há fumaça há fogo!

Irritada, empurrou o marido e foi para o quarto:
- Ah não, chega! Você também?!

No dia seguinte, antes de ir para o trabalho, Sinval passou no escritório de Valdemar. O cunhado o recebeu com tapinhas nas costas e o convidou para um café. Conversaram sobre futebol, churrasco e crise mundial. Sinval despediu-se, aliviado. “Coitado do Valdemar, ele não tem nada com a minha mulher. Só pode ser coisa da mente fértil da minha cunhada”.

Para alívio de Ritinha, Sinval se convenceu da inocência da esposa. Já Rose passou a atormentar a vida do marido. Ligava para Valdemar dez vezes por dia. Interrompia reuniões. Fuçava celular. Cheirava a roupa. Esperava o marido na porta do trabalho. A gota d´água foi no churrasco da tia Marinete. Na frente de toda a família, Rose acusou o marido de traí-la com Ritinha. O bate-boca se formou. Sinval pegou a esposa pelo braço e foi embora. Marinete puxava os cabelos e gritava histérica e a mãe de Ritinha e Rose, depois de uma crise de tremedeira, desmaiou.

Envergonhado, Valdemar saiu da festa esgueirando-se pelas paredes. O show familiar só terminou, depois que os primos adolescentes de Rose colocaram o som nas alturas para abafar o burburinho familiar. Quando Rose chegou em casa, no início da madrugada, encontrou o marido com as malas prontas. Não impediu a saída do marido. Sentou-se no sofá e disse, entediada:
- Vai, pode ir, e não esquece de levar o cachorro pulguento que está na área. Ele é seu e eu não tenho saco de limpar merda de cachorro.

Um mês depois da separação, Rose andava pelas ruas bem-humorada, cumprimentando as pessoas e brincando com as crianças. A vizinhança estranhou. Enquanto esteve casada, nunca tratou os vizinhos com tanta consideração. O relacionamento com a irmã também melhorou. Era queridinha pra lá, irmãzinha pra cá. Ficaram tão unidas, que Ritinha ia fazer uma excursão com as amigas e recomendou:
- Toma conta do meu marido, hein?! Liga pra cá todo dia pra saber se ele chegou cedo do trabalho ou ficou na farra – brincou.
- Pode deixar, maninha. Sua palavra é uma ordem.

Ritinha viajou numa sexta-feira à tarde. No sábado, início da noite, Rose ligou pra casa dela:
- Sinval, sou eu, Rose. Você pode vir aqui em casa? É urgente. A tábua de carne caiu no meu pé e tá doendo muito. Acho que quebrei um dedinho.

Vinte minutos depois, o cunhado chegou, preocupado:
- Machucou muito? Deixa eu ver.

Sinval ajudou Ritinha a deitar-se no sofá. Gentil, foi até a cozinha e pegou um saco de plástico com gelo. Quando colocava a compressa no tornozelo da cunhada, ela o agarrou pelos braços, puxando-o para perto de si. Ardilosamente, encostou a cabeça no peito dele e fez dengo:
- Adoro um cafuné, Sinval. Preciso tanto. Estou tão carente!


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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