Tereza colocou o filho de dois anos para dormir e foi até o quarto, abriu o armário, pegou a camisola nova e se trancou no banheiro. Tomou um banho demorado, espalhou creme pelo corpo, se vestiu, penteou os cabelos e passou uma colônia de rosas na nuca. Saiu do banheiro esbanjando charme. Rubens esperava na cama. - Como você está cheirosa! Vem cá, deixa eu sentir esse cheiro gostoso. Sorrindo, entrou nos braços do marido. Cinco minutos depois Rubens adormeceu. Tereza olhou para o teto frustrada. Estavam juntos há oito anos. Na época do namoro e nos primeiros anos de casados, o sexo era quente. Depois que ela engravidou, sem explicação, o marido perdeu o desejo. Quando Tereza cobrava sexo, ele desconversava. Num sábado, quando Rubens chegou em casa bêbado, depois do aniversário do sobrinho mais velho, recusou-se a transar com Tereza. Enraivecida, ela jogou um livro em cima dele e o acusou de infidelidade. Pressionado, Rubens confessou, com a boca mole: - Não sinto mais tesão por você. Você agora não é mais mulher, é mãe do meu filho. Na tentativa de salvar o casamento, Tereza procurou uma terapeuta de casal. Rubens não compareceu às sessões. Ela fez garrafada, simpatia e até promessa. Tudo inútil. Intrigada, procurou uma cartomante. - Seu marido tem uma amante. - Então essa coisa de que sou mãe do filho dele é desculpa? - É. - O que faço? - Gosta dele? - Gosto de sexo e ele é meu marido. - Procure inovar e se enfeitar na hora da intimidade. Tereza comprou calcinha e camisola novas. Não adiantou. Frustrada, desabafou com a irmã: - Meu casamento está por um fio. Uma cartomante me falou que Rubens tem outra. - Será? - Ele não me procura mais e quando forço a barra parece que me faz um favor. - Será que ele desconfia de você? - Nunca me acusou de nada. A desculpa dele é outra. - Qual? - Diz que depois que o Juninho nasceu, não sente mais desejo por mim. - Quer continuar casada? - Claro! Ficar sem marido? Jamais. Já diz o ditado, ruim com ele, pior sem ele. - Então coloca um investigador atrás do cachorrão. Tereza contratou um detetive. Um mês depois, ele deu-lhe a notícia com um sorriso de canto de boca: - Seu marido é um virtuoso. Vai de casa para o trabalho e do trabalho para a casa. - Não é possível. Mentira?! - Não encontramos nada. Fizemos escuta telefônica. Tiramos fotos. Nada. - Nenhuma suspeita? - Nenhuma. Seu marido é fiel. Um pai de família exemplar. Saiu do escritório confusa. Será que ele estava com problema na próstata? Desconfiava dela? Ou se contentava com sexo virtual, já que ficava muito tempo no computador de madrugada? Não se conformaria com qualquer desculpa. Gostava de sexo. Faria mais uma tentativa. Numa quarta-feira, depois de colocar o filho pra dormir, montou um cenário romântico. Acendeu velas, incensos e espalhou pétalas de rosa pela sala. O marido, que assistia TV, reclamou: - Tô vendo meu futebol e você pra lá e pra cá na frente da televisão. Esse cheiro de incenso tá me sufocando. E essas velas acesas? Quer colocar fogo na casa? Desapontada, se trancou no quarto emburrada. Da cama ainda ouviu o marido gritar: - Golllllllll! Dá-lhe Mengão!! A raiva incendiou-lhe o peito. Não gostava de rejeição. Lembrava da infância. Tinha cinco anos quando o pai abandonou a mãe. Decidiu mexer com os brios do marido. Talvez desse resultado. O que não podia – pensou – era continuar casada com um homem sexualmente distante. No final de semana, na hora do jantar, fez nova tentativa, Rubens reagiu, impaciente: - De novo? Não cansa? Pode dar um tempo pra mim? - Que tempo você quer? - Você parece uma tarada. Caramba, você é a mãe do meu filho, vê se entende! - Então nunca mais vamos fazer sexo? NUNCA MAIS? - Sinto Tereza, é mais forte do que eu. - E se eu fosse uma puta? - Você não é uma puta. Você é mãe do meu filho! Com o peito apertado, ela gritou, jogando o prato no chão: - O JUNINHO NÃO É SEU FILHO! - O QUÊ? - RUBENS MACHADO JUNIOR NÃO É SEU FILHO! Com a cabeça girando, Rubens jogou a tigela de arroz contra a parede. Com o sangue subindo-lhe às faces, pegou a mulher pelo braço e foi empurrando até a cama: - Puta! Sua puta mentirosa. - Não é mentira. SEU FILHO NÃO É SEU FILHO. Transaram selvagemente. Tereza adormeceu. Rubens não conseguiu pregar o olho. Foi até a geladeira e bebeu uma cerveja pelo gargalo. Bebeu mais outra. De madrugada, bêbado, acordou a esposa: - Me diz: Quem é o pai do Juninho? QUEM? - Hã? O quê? - Quem é o pai do Juninho?! - Deixa isso pra lá. Esquece. Vem dormir. - Quem é? Preciso saber. - É o seu irmão Geraldo! Ele é o pai do Juninho. Com o orgulho doendo, sentiu a vida descer pelo corpo. Abriu o armário, vestiu uma camisa e foi até a gaveta. Remexeu, pegou a chave do carro e saiu batendo a porta. Tereza escutou quando o marido saiu cantando pneu. Olhou o relógio. Cinco da manhã. O céu clareava, quando Rubens tocou a campainha na casa do irmão. Regina, esposa de Geraldo, acordou o marido, assustada: - Quem será a essa hora? Ele se levantou sonolento. Espiou pelo olho mágico e abriu a porta nervoso: - O que houve? Aconteceu alguma coisa com o Juninho? Mudo, Rubens puxou a pistola e deu dois tiros no peito do irmão. Em seguida, colocou a arma na cabeça e atirou. Foram velados juntos. Durante a cerimônia fúnebre, a família e os amigos comentavam a tragédia, chocados. Sentada perto dos caixões, Tereza fazia cafuné em Juninho enquanto trocava olhares discretos com Ricardinho, um jovem de vinte anos, filho do irmão mais velho dos falecidos. Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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