Final de expediente. Saí do trabalho e fui tomar um drink no barzinho de música ao vivo que inaugurou perto do escritório. Entrei sozinho, fazendo reconhecimento do ambiente, desatei o nó da gravata e pedi uma cerveja. Tentando ser agradável, comentei com o barman: - Você é um cara de sorte, trabalha num lugar cheio de mulher bonita. Ele me respondeu com um sorriso seco, me serviu e foi atender outro cliente. Pensei em Marly. Estamos juntos há dez anos e na época da TPM sempre brigamos. Por isso que, ao invés de ir pra casa, preferi relaxar ouvindo música e quem sabe encontrando uma mulher para me proporcionar bons momentos. Nunca fui fiel. Fidelidade é utopia. Olhei curioso para a pista de dança e avistei uma mulher alta, num vestido preto, colado ao corpo bem torneado. Os cabelos longos e negros lembravam Cleópatra. Seus movimentos sinuosos me deram tesão. Era uma égua puro-sangue. Extasiei-me com a cena. Nossos olhares se cruzaram. Ela parou de dançar e veio em minha direção. Abriu um sorriso provocante, segurou os cabelos e deixou-os cair displicentes: - Me paga uma cerveja? Meus olhos famintos penetraram-lhe as artérias como uma faca amolada rasgando a carne. A vida é surpreendente. A cada segundo tudo pode mudar. Conversávamos muito próximos. - Desculpe, estou tão impressionado com a sua beleza, que ainda não perguntei seu nome – brinquei. - Meu nome é Larissa, mas pode me chamar de Lara. Nos apresentamos. O celular vibrou. Era Marly. Desliguei. “Pirei por Lara, Larissa”. - Você não quer ir para um lugar menos barulhento? – perguntei baixinho, no ouvido dela. Ela jogou os cabelos pra trás e fez beicinho: - Claro. Assim ficamos à vontade. Passamos duas horas de puro prazer e êxtase. Lara adormeceu. Voltei à realidade. Olhei o relógio, preocupado. Dei um pulo: “Onze horas! É hoje que Marly me expulsa de casa”. - Lara, acorda, precisamos ir. - Não vamos dormir aqui? - Não posso. - Por quê? - Sou casado. - Por que não me disse antes? - Você não me perguntou. Lara se levantou da cama, colocou o vestido, enfiou a calcinha dentro da bolsa, e antes de sair, me deu um tapa no rosto. - Deveria ter me contado. Eu tinha o direito de escolher. “Será que ela pensou que eu fosse pedi-la em casamento?” As mulheres são cheias de fantasias românticas. Não adiantou nada queimarem sutiãs em praça pública, se ainda sonham com o príncipe encantado, que vai libertá-las da bruxa malvada. Cheguei em casa quase meia-noite. Marly dormia igual a um anjo. Acordei com o café na cama. Marly é um amor. Fizemos as pazes. Só voltei a ter notícias de Lara dois meses depois, quando abri a porta do meu apartamento e a vi sentada no sofá, de pernas cruzadas, conversando com minha esposa. Senti uma pontada na boca do estômago. Marly me trouxe de volta: - Querido, deixa eu te apresentar Larissa. Minha nova amiga da academia. Jantou conosco. Durante o jantar, seus olhos pretos e irônicos desafiavam-me. Quando foi embora, Marly comentou: - Simpática minha nova amiga, né? - Não gostei. - Você nunca implicou com amiga minha. - Não estou implicando. Só disse que não gostei. - Larissa é uma mulher carente. Uma semana antes do casamento, descobriu que o noivo era casado. Passou cinco anos no analista. “Como é que eu podia adivinhar?” Da próxima vez que eu pegar uma mulher para dar uma rapidinha, peço para falar primeiro dos traumas passados. Que azar o meu, as duas tornaram-se amigas! Lara chegou a nos apresentar o namorado. O romance durou pouco. Além de alcoólatra, era viciado em jogo. Num sábado chuvoso, a campainha tocou insistente. Era Larissa. Estava com os olhos vermelhos de choro. Avisei que Marly voltaria logo. Convidei-a para entrar com um leve toque nos braços. Ela deu um salto e gritou: - Não toque em mim. Nunca mais toque em mim. ENTENDEU?! Fiquei sem ação. Vi o ódio em seus olhos. Pareciam duas lâminas prontas para me cortar. Senti pena daquela mulher linda e carente. Na segunda-feira cheguei do trabalho mais cedo. Marly fazia as malas. - Vamos viajar? - Não. Nosso casamento acabou. Vou-me embora. - Tá de sacanagem!? - Estou apaixonada por outra pessoa. - Quem? - Larissa. Lara. - Apaixonada por mulher?! Que brincadeira é essa?! Você nunca foi lésbica. Segui Marly até a sala. Pedi que ficasse. Bateu a porta na minha cara. O apartamento ficou enorme. Minha pose de macho desabou. Tinha 15 anos quando chorei pela última vez. O vizinho da casa amarela furou minha bola de futebol novinha que ganhei do meu pai. Durante duas semanas não tive notícias de Marly. Fui até o bar onde vi Lara pela primeira vez. Encontrei-as dançando. Me aproximei. Marly virou o rosto e saiu. Segurei Lara pelo braço. Ela me empurrou. - Já disse que não quero que me toque. - Pode me dizer o que você falou com a MINHA ESPOSA para ela sair de casa?! Foi fria e sarcástica: - Não falei. Fiz. - O que você está querendo dizer? - Você é uma merda na cama, seu babaca. Naquela noite não gozei. Marly voltou carregando um copo de caipirinha em cada mão. Deixaram-me sozinho na pista. Perdi. Fazer o quê? Uma loira peituda, com um vestido vermelho, me puxou pelo braço. Apertei-a contra o meu corpo. Ela gemeu. Mulher é caixinha de surpresa. Amo-as. Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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