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Contos
29/09/2008 - 10h04
O roubo da cueca
Celamar Maione
 

Madame Gertrudes confirmou:
- Tem que ser cueca.
- Mas como vou conseguir?
- Dá seu jeito. Ou então não vai ter o que deseja.
- E tem que ser usada?
- De preferência a cueca que ele estiver usando na hora H.

Leninha saiu da cartomante pensativa. Desde que Rosalvo terminou o namoro, não conseguia dormir, nem comer. No trabalho já levara uma advertência e no início da semana Seu Almeida ameaçou-a com demissão.
- Ou presta atenção no serviço ou procuro outra pessoa para ficar no seu lugar!

Convivendo com o desespero de Leninha, a secretária do gerente indicou-lhe Madame Gertrudes.
- Deu certo comigo. Ela faz a pessoa amada voltar em uma semana.
- Jura?
- Juro. Se fizer direitinho o que ela pedir, Rosalvo volta. Não tem erro.

No ônibus, retornando pra casa, pensava, sonhadora, em uma maneira de pegar a cueca do ex-namorado. Depois do jantar ligou pra amiga e confidente.
- Amanhã, depois do trabalho, passo na sua casa. Precisamos conversar.
- O que você aprontou?
- Tenho que contar pessoalmente. Até amanhã, Taty.

Castigada pela ansiedade, não dormiu direito. Acordou cheia de dor no corpo, mas feliz. Finalmente encontrara uma maneira de ter a cueca para fazer a amarração recomendada por Madame Gertrudes. Trabalhou empolgada. Seu Almeida notou a mudança e comentou:
- Não sei que bicho mordeu você, Leninha, mas sinto que hoje seu trabalho está rendendo.

Cinco da tarde bateu o ponto e foi direto pra casa da amiga. Taty esperava-a curiosa.
- Passei o dia na maior expectativa pra saber o que você quer me contar.
- Adivinha?
- Se eu tivesse bola de cristal, estaria rica, queridinha. Fala logo. Deixa de suspense.
- Achei uma maneira de Rosalvo voltar pra mim.
- Pensei que você já tivesse desencanado. Ele não vai voltar pra você. Esquece o cara.
- Como é que você sabe? Fui numa cartomante.
- Sim e daí? O que ela lhe falou?
- Vou fazer um trabalho para trazer o Rosalvo de volta em uma semana.
- E você acreditou?
- Se fizer direitinho vai dar certo. Tenho que tentar. E vou precisar de você.
- DE MIM?
- Sim. Preciso de uma cueca do Rosalvo.
- E o que eu tenho a ver com isso?
- Adivinha novamente?!
- Menor idéia.
- Você vai pegar a cueca.
- Como? Entrando na casa dele e roubando?
- Nada disso. Tem que ser cueca usada. Você vai seduzi-lo e transar com ele.
- Pirou? O cara era seu namorado. Você ainda gosta dele.
- Eu sei. Mas ele não quer mais ir pra cama comigo. Nem atende minhas ligações.
- E vai comigo?
- Mulher quando quer, consegue. Inventa uma desculpa. Liga pra ele, coloca um vestido sensual e seduza-o.
- E vai dar certo?
- Claro. Rosalvo é galinha.
- Éeeeeee?
- É e com certeza está ciscando em outro terreiro. Mas vou cortar isso. Quando a cueca estiver na minha mão, amarro ele de vez.
- É arriscado.
- Que risco você corre?
- Tá bom amiga, já que insiste, farei um esforço porque gosto muito de você.
- Então vamos ligar pra ele agora e marcamos logo o encontro. Tô ansiosa.
- Deixa comigo.
- Tô ligando. Toma, tá chamando. Fala com ele.

Combinaram para o dia seguinte. Leninha comemorou.
- Não disse que seria fácil?

No sábado Leninha foi pra casa de Taty ajudá-la a vestir-se.
- Vai com esse vestido. Tá lindo! Ele gosta de roupas decotadas.

Leninha levou Taty até a porta:
- Espero-a aqui na sua casa. Quero logo a cueca na minha mão.
- E se eu voltar só amanhã de manhã? – perguntou, sem graça.
- Voltando com a cueca, tá tudo certo.

Despediram-se. Com o coração esperançoso das apaixonadas, deitou-se na cama da amiga, acreditando ter encontrado o caminho para a felicidade. Assim que Taty se sentou no banco do carona, Rosalvo entregou-lhe um embrulho.
- Trouxe a cueca usada que você me pediu. Pode me explicar direito pra quê isso?
- A Leninha.
- O que tem a Leninha? Aprontou com você?
- Foi a uma cartomante e...
- E o quê? O que tem minha cueca a ver com isso?
- Recomendaram um trabalhado de amarração com a sua cueca. Ela pediu para eu ajudar. Coitada.
- Você ainda não contou que estamos namorando?
- Tá doido? Ela me mata! Deixa como está.

Rosalvo balançou a cabeça negativamente:
- Mulheres!

Antes de dar a partida no carro, colocou um CD da Adriana Calcanhoto. Em seguida, fez um cafuné em Taty e disse, com voz aveludada:
- Viu como me preocupo com você? Comprei o CD da sua cantora favorita.
- Te amo, Rô.
- Eu também.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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