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Contos
25/08/2008 - 12h26
O marido de Narinha
Celamar Maione
 

Lemos lia o jornal no sofá da sala, depois do almoço de sábado, quando Narinha apareceu, eufórica.
- Adivinha quem vem passar seis meses aqui no Rio?
- E eu sei lá.
- A Nice.
- Nice? Sua sobrinha? A filha da Sônia?
- É, homem. Tá com a memória fraca?
- É a filha caçula da sua irmã, não é? Faz tempo que a gente não vê a Nice.
- Oito anos. A última vez, foi quando passaram o natal no Rio. A Nice agora tá com vinte anos. Vem fazer um curso no Rio e vai ficar aqui em casa.
- Aqui? Já vi que vamos ter dor de cabeça.
- Deixa disso. Será um prazer receber minha sobrinha. Seis meses só.
- Quero ver.
- Ela chega na segunda.
- Mas já?
- Sim. A Sônia falou comigo agora pelo telefone.

Segunda-feira, quando Lemos voltou do trabalho encontrou a sobrinha sentada, confortavelmente, no sofá da sala. Assim que ele apareceu, ela correu para abraçá-lo.
- Tio, quanto tempo! Que saudade. O senhor continua o mesmo.

Nice apertou Lemos com força, roçando o corpo no dele. Sem graça, ele desvencilhou-se e cumprimentou a jovem, friamente. Morena, das coxas grossas, cabelos cacheados e muito namoradeira, ela sabia o impacto que causava nos homens e adorava provocá-los com olhares convidativos. O tio foi o primeiro homem que a rejeitara. Sentindo-se desprezada, ficou curiosa para descobrir o que Lemos escondia por trás daquela aparente virtude.

Impetuosa, no dia seguinte, assim que o tio saiu para o trabalho, perguntou a Narinha em tom amistoso:
- Tio Lemos é bom marido?
- Em que sentido?
- Ele comparece na hora do sexo.
- Nossa Nice, que pergunta! Me deixou sem graça agora.
- Só queria saber. A senhora não precisa responder. Eu entendo.
- Bom perguntar. Preciso mesmo desabafar. Acho que Lemos tem outra. Não fazemos sexo há cinco meses. Ele perdeu o interesse por mim.
- Conversa com ele, tia. Pressiona. A senhora é muito nova para ficar sem sexo.
- Em primeiro lugar, tira esse negócio de senhora. Estou com 34 anos. Somos amigas.

Passaram a manhã arquitetando uma maneira de descobrir se Lemos tinha uma amante. No final da conversa, Nice perguntou:
- Tem certeza, tia? Será que vai dar certo? Posso mesmo?
- Vamos testar a fidelidade dele. Quero ver se ele me trai ou é broxa.

Com a aprovação da tia, Nice passou a insinuar-se para Lemos. Quando ele chegava do trabalho, a sobrinha o recebia numa camisola transparente. Sem saber como sair dos assédios, que o constrangiam, reclamou com a esposa:
- Será que você não percebe o que está acontecendo dentro da sua casa?
- O que?
- Sua sobrinha me assedia.
- E daí? Nem me preocupo. Você não é de nada mesmo.
- Duvida da minha masculinidade? Não provoca, hein?!
- Tá aí, estou provocando. O que você vai fazer? Vai transar comigo ou com ela?
- Já vi tudo, sua sobrinha tá colocando coisa na sua cabeça.

Irritado, Lemos mudou de assunto, falando sobre a previsão do tempo. Narinha achou estranho. Depois de quase dois meses assediando o tio, sem sucesso, Nice concluiu:
- Sabe o que eu acho tia? Jura que não vai ficar zangada comigo?
- Juro. Diga. Anda. Quero saber sua opinião.
- Tio Lemos é gay. Casou para disfarçar. Me rejeita o tempo todo. Finge que nem é com ele. Nenhum homem agiria assim. Só gay, tia. Só gay.

Depois da conversa com a sobrinha, Narinha passou a observar as atitudes do marido. Será mesmo que casara-se com um gay? Talvez a culpa fosse dela. Vai ver era fria na cama. Por isso ele resolveu ser gay. Será que se ela fosse mais ousada no sexo, Lemos voltaria a ser homem? Não parava de pensar. A cabeça girava. Passou noites insones. Imaginava o marido beijando outro homem e sentia náusea. Esperaria Nice voltar para Brasília e conversaria mais á vontade com o marido. Dois dias depois da sobrinha partir, Narinha agiu. Lemos jantava, depois do trabalho, quando ela perguntou, sem rodeios:
- Você é gay? Seja sincero. Não me faça sofrer.

Pego de surpresa, Lemos tomou um copo de água para se recuperar e respondeu, secamente:
- Quer a verdade? Tem certeza? Vai suportar?
- Suporto tudo. Não agüento mais mentira.
- Então aguarde. Amanhã vai saber de tudo. Vamos acabar com isso. E não reclame, viu.
- Não vou reclamar. Quero a verdade, por pior que seja.

Narinha passou a sexta-feira angustiada. No final da tarde, Lemos ligou:
- Toma um banho bem relaxante que é hoje.

Ela atendeu o pedido de Lemos e caprichou no visual. Colocou a colônia preferida, penteou os cabelos e passou um batom vermelho e sensual. Esperou o marido com o coração disparado. Quando ele abriu a porta, acompanhado de um homem alto e elegante, ela não entendeu. Sorridente, Lemos os apresentou:
- Narinha, minha esposa.
- Narinha, esse é o Rocha, colega de escritório. Faz sala pra ele, enquanto tomo um banho. E serve esse vinho, por favor.

Confusa, Narinha colocou o vinho na taça e estendeu as mãos trêmulas para Rocha. Ele pegou-a suavemente pelo braço e puxou-a para perto dele. Entorpecida, ela obedeceu. Em seguida, beijou-a docemente nos lábios. Narinha correspondeu. Empolgado, Rocha passou-lhe as mãos pelo corpo, enquanto tirava-lhe as peças de roupa, jogando-as para Lemos, que sentado na cadeira de balanço, observava os dois, com os olhos faiscando de prazer.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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