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Contos
03/06/2008 - 07h13
Cadê a Aparecida?
Celamar Maione
 

Acordei com a cabeça girando e o estômago parecendo uma bomba-relógio prestes a explodir. A boca seca e amarga denunciava que na véspera eu bebera além da conta. Não fazia idéia das horas. Levantei e abri a cortina. A claridade me cegou. Olhei o relógio e vi que já passava de uma da tarde. “Caramba!” – pensei. “Que dia é hoje?”

Sentei na cama, coloquei a cabeça entre as pernas. A náusea piorou. Me tranqüilizei quando me dei conta de que era domingo e não precisava trabalhar. Não lembrava o que acontecera na véspera. Deitei e refiz meus passos.

Pela manhã fui na oficina e enquanto o carro consertava, almocei na casa da minha mãe. No final da tarde peguei o carro e passei na ex para deixar o dinheiro para o dentista das crianças. Cheguei em casa depois das seis. Ia tirar um cochilo, quando o telefone tocou. Era o Carlão, amigo de copo, lembrando da festa na casa dele.
- Tô te esperando logo mais!
- Pra quê?! – perguntei, cheio de sono.
- Porra cara, a festa do meu aniversário!
- Putz, sabe que eu tinha me esquecido?
- Então tô te lembrando, porra! Vem curtir a vida de solteiro! Vai rolar muita bebida, mulher bonita e sacanagem!

Saí de casa dez da noite querendo ficar. Sabe quando bate aquele pressentimento sinistro? No caminho vi um bêbado ser atropelado. Foi pedaço pra tudo quanto é lado. A motorista atropeladora saiu do carro gritando por socorro. Eu dei ré e caí fora. Cheguei na festa com o estômago embrulhado. A cena não me saía da cabeça. Comentei com o Carlão, e levei um esporro.
- Caraca, vai ficar baixo astral por causa de um bêbado babaca? Não ferra, cara! Vem aqui que eu vou te apresentar à Aparecida.
- Deixa eu beber alguma coisa primeiro.
- Depois que você conhecer a Aparecida você vai esquecer que existe bebida!

Saiu me arrastando pela festa. Quando vi a Aparecida, os pensamentos mais depravados me vieram á cabeça. Fazia tempo que não via um mulherão daqueles.
- De onde saiu essa sua amiga? – perguntei, empolgado.
- Posso garantir que não foi de nenhum conto de fadas.
- É garota de programa? Se for, tô duro. Acabei de dar um dinheirão pra minha ex levar as crianças ao dentista.
- Quê isso! Aparecida é descolada. Transa pelo prazer de transar.

Estava com duas amigas feiosas. Aparecida chamava a atenção. Alta, cabelos lisos e negros, lábios grossos pintados de vermelho, uma calça branca que marcava o corpo perfeito, blusa prateada de alcinha e sandálias de salto alto, num pé delicadíssimo. Adoro pés. Sou tarado por mulheres com unhas bem cuidadas. Me aproximei meio sem graça. Carlão nos apresentou e me deixou conversando com ela e as amigas. Cinco minutos depois, estávamos bebendo e conversando a sós.

Antes das três da manhã, saímos da festa, com o fogo dos amantes queimando por dentro. Convidei Aparecida para tomar café na minha casa e entreguei a chave do meu carro pra ela.
- Toma. Dirige você. Se eu dirigir, não vamos chegar a lugar nenhum.

Aparecida deu uma risada excitada, apertou minhas coxas, pegou a chave fazendo charme e lá fomos nós em direção ao meu território nos entregarmos aos frágeis prazeres da carne. Abri a porta do apartamento e nos agarramos freneticamente. Levei-a direto para o meu quarto. Ela perguntou onde era o banheiro. Demorou dez minutos. Apareceu nua na minha frente e a gente foi se agarrando.

A mulher era uma fêmea insaciável. Não se contentou com uma. Queria mais. Reclamou, cheia de dengo, porque neguei fogo. Adormeci com ela me acariciando e pedindo mais sexo. Foi a última vez que a vi. Não sei nem se dormiu comigo ou se foi embora quando adormeci. Será que ainda estava no apartamento?

Cheirei meu travesseiro. Tinha o gosto doce de Aparecida. “Deve ter ido embora decepcionada com a minha performance sexual” – pensei. Procurei no banheiro e no quarto dos fundos, onde fica o escritório. A janela estava aberta. Fechei–a e fui até a cozinha. Nem sinal da mulher. Fiz um café bem forte, enquanto tentava me lembrar se ela se despedira ante de ir embora. Na sala encontrei sua bolsa jogada em cima do sofá. Abri e quando ia fuçar, o interfone tocou, insistente. Atendi, apreensivo.
- Seu Aníbal, aqui é o Amarildo!
- Já sei! Deixei o carro mal-estacionado na garagem?! Tô descendo.
- Não, seu Aníbal. A polícia tá aqui embaixo e vai subir pra falar com o senhor. Tentaram mais cedo, mas eu disse a eles que o senhor acordava tarde.
- E o que a polícia quer comigo?
- A moça.
- Que moça? O que tem a moça?

A campainha tocou. Desliguei o interfone na cara do Amarildo e corri pra porta. Dois homens sisudos me olhavam com olhos de lince prontos para o ataque.
- Boa tarde! Inspetor Almeida e Inspetor Souza. Precisamos lhe fazer umas perguntas.
- Sim, podem falar. Do que se trata?
- Aníbal Vasconcelos?
- Sim, sou eu.
- Sua situação está complicada. O senhor terá que nos dar detalhes da mulher que está morta na área interna do seu prédio.
- Mulher morta? Quê mulher? – meu coração disparou.

Precisava ganhar tempo. A boca ficou ainda mais amarga.
- Vou refrescar sua memória – falou o inspetor Almeida, com cara de poucos amigos. - Por volta das nove horas de hoje, uma mulher morena, trajando apenas uma calcinha branca, caiu ou foi jogada da sua janela. O vizinho do segundo andar subiu no elevador com o senhor e a vítima, por volta das quatro da manhã. Agora ela está morta. O que o senhor tem a nos dizer?

Eu não fazia idéia de como Aparecida caíra lá embaixo. Naquele momento compreendi que estava fodido. Minha cabeça rodou e meu estômago deu um nó. Deixei os policias na porta e corri para o banheiro. Meu vômito fedia a uísque misturado com cerveja. Meu suor tinha cheiro de medo.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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