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Contos
20/05/2008 - 08h00
Vamos dançar?
Celamar Maione
 

Lucineide conversava com Verinha e Marta no aniversário de Tavinho, quando um homem moreno, alto e de corpo atlético caminhou em direção a ela. As amigas comentaram, invejosas:
- Nossa, acho que esse colosso vem falar com você!

O homem aproximou-se e, sorridente, puxou conversa:
- Lembra de mim?
Lucineide fez pose, cruzou as pernas e respondeu, arrogante:
- Deveria?
Ele não se intimidou diante da secura e falou, gentilmente:
- Meu nome é Reginaldo. Estudamos juntos no primeiro período do curso de economia, depois eu não sei o que aconteceu, você sumiu. Mudou de curso?

Verinha e Marta olhavam para a amiga reprovando-lhe a atitude grosseira. Porém, estranhamente, Lucineide continuou, arrogante:
- Mudei, sim. Não gostei dos colegas de turma. E sinceramente, não lembro de você.
- Deixa de ser debochada - ele riu e continuou:
- Nós conversávamos durante os intervalos e você sempre foi muito brincalhona.
- Meu querido, não lembro mesmo - e ignorou-o, abaixando a cabeça.

Reginaldo desculpou-se e sem perder a pose, olhou para Verinha e sorriu.
- Já que sua amiga não gostou de mim, vamos dançar ou a estou incomodando também?
Verinha se atirou nos braços de Reginaldo com os olhos brilhando. Enquanto eles se encaminhavam, de mãos dadas, para a pista de dança, Marta reprovou a atitude de Lucineide:
- Não entendi?! O homem é lindo e simpático. Você deveria fingir que se lembrava.
- Eu lembro e até paquerava ele!
- Então, por que o tratou grosseiramente? Ele ficou sem graça.
- Homem tem que ser tratado assim. Imagina se eu ia me abrir toda? Não quero parecer uma mulher fácil.
- Você vai me desculpar, você foi muito estúpida e até mal-educada. Espantou o cara.
- Queridinha, homem gosta de ser maltratado e pisado.
- Não acredito. Quem espalhou isso foi algum gay ou uma mal-amada. Homem saudável gosta de ser bem-tratado.
- Que nada! Você vai ver. Está só me provocando.
- Não parece. Acho que você dançou. Olha a sintonia dele com Verinha.
- Está só me instigando. Logo volta com o mesmo papo e me tira para dançar.
- Se eu fosse você não teria tanta certeza - provocou Marta.

Enquanto conversavam, a namorada de Tavinho aproximou-se comentando:
- Verinha é uma sortuda! Dançando com um dos solteirões mais cobiçados do Rio.
- Jura? - instigou Marta.
- Vocês não o conhecem? Reginaldo é um bom partido, além de um rico executivo, é solteiro e educadíssimo. O único problema é que viaja muito e fica sem tempo para arranjar namorada.

Lucineide ficou intrigada:
- Se fosse tão bom assim estaria casado. Deve ser um galinha!
- Está enganada. Ele quer namorar sério, é um romântico assumido e com quase 40 anos acredita em relações saudáveis e até em alma-gêmea.

Marta deu um sorriso debochado e comentou, maliciosamente:
- Pelo jeito encontrou, olha como dança animado com Verinha!
Lucineide arrependeu-se da grosseria feita e mordeu os lábios de raiva. Teve vontade de gritar, quando Verinha, sorridente, despediu-se:
- Estou indo. Reginaldo me ofereceu uma carona.

O casal saiu de mãos dadas, conversando como velhos amigos. Marta virou-se para Lucineide e falou com ar professoral:
- É amiga, você dançou. Eu não disse?

Despeitada, Lucineide mentiu e disse que ele não lhe interessava. Uma semana depois da festa, ela tentou uma aproximação. Telefonou para Reginaldo desculpando-se e dizendo que lembrara-se dele. Educado, ele agradeceu e falou, com ar vitorioso:
- Sabe que você me deu sorte quando não se lembrou de mim? Adorei sua amiga.

Lucineide ligou mais três vezes, convidando-o para um café num fim de tarde. Foi dispensada, gentilmente. Deprimiu-se, quando seis meses depois, recebeu o convite de casamento de Verinha e Reginaldo. Nunca mais recusou uma dança. Nem dos parceiros baixinhos, barrigudinhos, sem charme, chatos e com mau-hálito. Quando as amigas comentavam que ela mudara o nível de exigência, Lucineide respondia, tentando convencer a si mesma:
- Quem sabe não é minha alma-gêmea? O que importa é a pegada. Numa dança, tudo pode acontecer!


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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