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Contos
12/03/2008 - 07h00
A ficante
Celamar Maione
 

Soninha e Alberto entraram no bar conversando animadamente. Pediram uma mesa. Sentaram-se e enquanto esperavam pelo chope, acariciavam-se. Quando Raquel aproximou-se e sorriu para Alberto, o idílio amoroso terminou. O rapaz deu um forte abraço na jovem que estava com um vestido curto vermelho que deixava as pernas grossas á mostra.
- Que saudade! Quanto tempo!?

Conversaram em pé, durante cinco minutos. Raquel se despediu de Alberto com um beijo no rosto.
- Depois passa lá na mesa para lhe apresentar minha amiga.
Quando Raquel saiu a discussão começou.
- Quem é essazinha?
- Uma amiga.
- Amiga? Seus olhos brilharam quando você a viu.
- Tá delirando, é?
- Não me dê diploma de idiota, quem é?
- Foi uma ficante.
- Quer dizer que vocês tiveram algo mais do que uma simples amizade?
- Passado. Nada sério.
- Você ficou muito empolgado. Nem me apresentou.
- Nem reparei. Desculpe.
- Claro, quando não lhe interessa, você não repara. É sempre assim. Lembra daquela festa na casa do Flávio?
- Ah não! Vai começar a relembrar coisa que já passou, só porque a Raquel veio falar comigo?
- Muita intimidade. Sorrisinho pra lá. Sorrisinho pra cá.

- Garçom, mais dois chopes, por favor.
- Não quero mais beber.
- Como não? Você me disse que estava com vontade de tomar um chope, conversar e depois sair para namorar.
- Não vou namorar. Vou pra casa. Perdi a vontade.
- Vai estragar nossa noite por causa de coisa que já passou?
- A Raquelzinha está sorrindo pra você. Não tira os olhos da mesa.
- E eu tenho culpa? Não posso fechar os olhos dela.
- Você e essa sua mania de ser cavalheiro com todo mundo. Menos comigo.
- Quando eu não fui cavalheiro com você?
- Naquele dia do bote. Se o Carlos não me segurasse, eu ia cair na água. Você é desatencioso.
- Reclama mas gosta de mim.
- Não sei mais se gosto.

Soninha fez biquinho. Ficaram em silêncio durante cinco minutos. Até que, com voz magoada, a namorada falou, pegando a bolsa:
- Já vou.
- Vamos?
- Vou sozinha. Não tem mais clima. Você estragou tudo. Você e a sua mania de ser gentil com as OUTRAS.
- Não vou ser grosseiro só porque você quer. Sou educado.
- Então fique com a sua educação. De repente amanhã você liga para a Raquelzinha. Quem sabe vocês não recordam os velhos tempos?
- Soninha, sua mente é muito fértil.
- Sabe o que mais? Não precisa ligar. Vai até a mesa dela e faz o convite.
- É isso que você quer?

Soninha não respondeu. Olhava para o alto, com o rosto apoiado na mão.
- Estou falando com você. É isso que você quer?
- Eu, não. Você. Quando a piranhete se aproximou da mesa, sua cara se transformou.
- Sua visão é poderosa.
- É? E quem passou a língua nos lábios e mexeu nos cabelos? Sinal de interesse.
- Tá vendo demais. Mas você está certa. Quem sabe minha noite não vai ser melhor com ela, já que você está cheia de coisinha!?

Soninha fuzilou Alberto com os olhos. Pegou o copo de chope e jogou-lhe no rosto.
- Pois então, faça bom proveito. Tchau!
Virou as costas e se foi. Sem graça, Alberto pagou a conta, se dirigiu ao banheiro, limpou o rosto e foi até a mesa de Raquel.
- Minha namorada já foi.
- É, nós vimos.
- Posso sentar?
- Claro. Senta ai. Quer um chope?
- É, vou pedir.
- Bom, deixa eu apresentar. Lurdinha, Alberto, Alberto, Lurdinha.
- E aí, depois daqui o que vocês vão fazer?
- Nós? Vamos pra casa, namorar.
- Namorar?
- É. Eu e a Lurdinha estamos ficando.
- Peraí, quando a gente ficava, você nunca me disse que era bi.
- Eu era hetero. Mas a Lurdinha me fez mudar de idéia. Agora sou homo. E fiel.

Levantaram-se e se despediram de Alberto, deixando-o pensativo.
- Ah sim, em homenagem ao encontro, paga a conta, Alberto? Dê lembranças à namorada. Como é mesmo o nome dela?

Nem esperaram pela resposta. Alberto deu um sorriso amarelo e um tchauzinho sem graça. Quando o garçom veio lhe trazer mais um chope, ele comentou:
- Rapaz, hoje eu estou com um azar.

O garçom deu um risinho tímido e limpando a mesa com um paninho, filosofou:
- Não repete essa palavra. Atrai coisa ruim. O senhor está é com falta de sorte.

Pegou o paninho e virou as costas. Alberto olhou para o nada e falou baixinho com cara de poucos amigos: "É, todo metido a esperto, também tem seu dia de otário".


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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