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Contos
26/02/2008 - 14h10
O flagrante
Celamar Maione
 

Duarte saiu do banco e caminhava distraído pela Senador Dantas, quando sentiu alguém segurar seu braço esquerdo, com força. Assustado, já ensaiava uma reação, quando a mulher falou primeiro:
- Desculpe moço, dá para o senhor fingir que é meu namorado?

A loira alta, cabelos longos escovados, olhos verdes, corpo escultural, vestida num tubinho preto, parecia saída de um conto de fadas. Desconfiado, Duarte pensou que se tratava de uma brincadeira.
- É pegadinha? Pra qual programa? Vê lá o que vai fazer, sou casado.
- O senhor está vendo aquele homem do outro lado da rua?
E apontou discretamente para um ruivo alto, mal encarado, de óculos escuros.
- O que tem ele? É seu namorado? Se é, por favor não me meta em confusão.
- Não conheço. Está me seguindo desde que saí do restaurante. O senhor só precisa fingir que é meu namorado. Sorria e converse comigo até o meu trabalho.

Quase chorando, a loira só faltou se ajoelhar em plena Senador Dantas. Duarte aproveitou, apertou o braço da mulher e para dar mais realidade à cena, tascou-lhe um beijo no rosto. Ela sorriu sem graça e os dois caminharam abraçados, conversando, como se fossem velhos conhecidos. Empolgado, ele nem percebeu que do outro lado da rua, passava a cunhada Marizete acompanhada da filha.
- Fabiana, aquele ali não é o Duarte?
- É, é o tio, sim. Com um mulherão. Quem diria? Faz o gênero quietinho, barrigudinho, mas tá mandando ver na rua.
- Anda, Fabiana, me dá seu celular, vamos tirar umas fotos, a Maria Augusta precisa saber disso.

Seguiram os dois, que sorriam e se abraçavam, como um casal apaixonado. Quando chegaram na portaria do trabalho da mulher, Duarte se despediu a contragosto e perguntou:
- Antes de subir, você podia pelo menos me dizer o seu nome?
- Amanda. Muito obrigada pelo que o senhor fez por mim. Deus lhe pague.
- Quando precisar é só chamar. Duarte, às suas ordens!

Educadamente, Amanda se despediu, virou as costas e pegou o elevador. Duarte voltou para o trabalho sonhando com as pernas grossas da mulher no tubinho preto. Marizete e Fabiana chegaram em casa ansiosas e conferiram as fotos.
- Olha essa, Fabiana, Duarte faz pose como se fosse um ator de Hollywood.
- E essa, mãe? Parece que saíram do motel. A loira não tá com o cabelo molhado?
- Pois eu vou lá na Maria Augusta mostrar essas fotos e é agora.

Maria Augusta acabava de fazer o jantar quando a campainha tocou. Abriu a porta. Marizete e Fabiana entraram, eufóricas:
- O que houve?
- O Duarte já chegou?
- Não. Vai chegar mais tarde. Por quê?

Mãe e filha se entreolharam.
- Aconteceu alguma coisa com o meu marido?
Marizete falou, meio reticente:
- Eu tenho uma coisa pra lhe mostrar e eu não sei se você vai gostar.
- Anda, o que é?
Chamou a irmã para sentar ao seu lado no sofá, abriu o celular e mostrou as fotos:
- Você vive reclamando do Duarte, diz que ele não quer saber de sexo. Pois ele trai você com uma loira que parece filha dele.

Maria Augusta via e revia as fotos. Boquiaberta, juntou as sobrancelhas, apertou os lábios e roendo as unhas se despediu da irmã e da sobrinha:
- Vocês foram muito gentis em me mostrar as fotos. Obrigada. Agora podem ir.
- Ei, o que você vai fazer? Vai pedir a separação? Vai procurar a loira?
- Eu preciso pensar. Daqui a pouco o Duarte chega. Podem ir, obrigada. Tchau.

Bateu a porta empurrando a irmã e a sobrinha. Quando o marido chegou, Maria Augusta serviu o jantar sem dar uma palavra. Acostumado com a frieza da esposa, Duarte não notou nada de errado. Jantaram em silêncio. Durante a madrugada, enquanto o marido roncava, Maria Augusta olhava para ele dormindo e curiosa pensava: "O que essa loira viu no Duarte? Não tem dinheiro. É gordinho, baixinho, sem graça!? O que ele faz com ela que não faz comigo?"

A carência tomou conta de Maria Augusta. Tremeu de desejo. Fazia tempo que não sabia o que era o carinho de um homem. Sonhou que dançava numa boate erótica rodeada por vários homens vestidos de cigano. Acordou decidida. Sábado, aniversário do marido, daria uma festa surpresa. Comunicou a vizinhança. Convocou os cunhados e chamou a irmã. Marizete estranhou:
- Festa surpresa?! O Duarte trai você com uma mulher que tem metade da sua idade e você vai fazer uma festa surpresa pra ele?
- Isso é problema meu. O marido é meu e quem decide sou eu.

No sábado, quando Duarte chegou do futebol, os convidados o esperavam e assim que entrou na sala, cantaram parabéns. O homem chorou de felicidade. Nunca imaginara que a esposa, que o tratava tão friamente nos últimos anos, pudesse organizar tamanha surpresa. Enquanto a música tocava e a bebida era servida, Maria Augusta falava com orgulho do aniversariante:
- Marido bom é o Duarte. O Duarte é um garanhão! Orgulho da raça!

As vizinhas lambiam os beiços de inveja, curiosas para saber, afinal, qual o borogodó do Duarte. Os maridos comentavam, enciumados:
- O que será que o Duarte anda fazendo que a gente não faz?

Marizete, horrorizada, reclamava com a filha:
- Minha irmã é uma depravada! Louca. Devassa. Onde já se viu uma mulher traída fazer festa surpresa e ainda chamar o marido de garanhão?

Sentindo-se decepcionada com a atitude de Maria Augusta, pegou a filha pelo braço e foi embora antes de partirem o bolo. Quando a festa acabou, Duarte se trancou no banheiro para chorar, emocionado.

Ao entrar no quarto, se deparou com Maria Augusta deitada na cama de calcinha e sutiã. Passando a língua pelos lábios, ela disse, em tom de voz sensual:
- Vem meu garanhão. Faz comigo o que você faz com as outras!

Sem entender o comportamento liberal da esposa, mas excitado, Duarte se jogou nos braços de Maria Augusta e se amaram como há muito tempo não acontecia.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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