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Contos
21/01/2008 - 13h14
A afrodisíaca família da noiva
Celamar Maione
 

Tony tomou o último gole de chope e comentou, surpreso:
- Cara, você é maluco!
- A carne é fraca, Tony. A carne é fraca.
- Você é um sonso, isso sim!
- Vai me dizer que você nunca passou por uma situação parecida?
- Com sogra?! Nunca! Arturzinho, pensa bem, você vai se casar com a filha da sua amante daqui a uma semana!
- A coroa é gostosona. Não resisti!

Tony e Arturzinho cresceram juntos. Quando se formou, Tony foi trabalhar em outro estado. Agora estava de volta ao Rio para ser padrinho de casamento do amigo. Não se viam há quase dois anos e ficaram mais de três horas bebendo e jogando conversa fora. Depois de colocarem o papo em dia, na mesa de bar que freqüentavam na época da faculdade, se despediram com um forte abraço.
- Legal matar a saudade dos velhos tempos, mas ainda acho que você é maluco.
- Que nada, eu gosto é de mulher!
- A gente se vê então na sexta?
- Isso. Meu sogro faz questão desse jantar. Não falte. Você é o padrinho. Seu Ernesto é rigoroso, de família tradicional.
-Abre o olho, Arturzinho! Você tá comendo a esposa e a filha do cara.

Se abraçaram mais uma vez e despediram-se entre risos e piadinhas. Na sexta-feira, Arturzinho foi o primeiro a chegar para o jantar. Foi recebido pela sogra e amante Mara Lúcia.
- Tá bonito! Quero ver amanhã.
- Tá com ciúme porque vou me casar com a sua filha?
- Que nada. No fundo você é só meu. Gosto desse jogo excitante.

Nove da noite, o jantar foi servido e Ernesto fez questão de fazer um pequeno discurso enquanto a família comia reunida à mesa.
- ...e assim é com muito orgulho que dou a mão da minha única filha para Arturzinho. Esse jovem saudável, arrojado e com um futuro brilhante!

Mara Lúcia encerrou o discurso puxando as palmas. Depois do jantar, Tony conversou em particular com Arturzinho.
- Você tem razão, sua sogra é uma coroa pra perder o juízo. Mas a Marise também é bonitona.

O jantar terminou sem nenhum incidente. Na despedida, Marise confidenciou às primas que no dia seguinte realizaria o sonho de sua vida: casar-se com Arturzinho, o homem perfeito para marido. No final da conversa, fez um comentário intrigante, deixando as primas boquiabertas:
- Os homens preferem as casadas. Quem tem um, tem muitos!

No sábado, ao ver a filha vestida de noiva, Mara Lúcia sentiu uma pontada de inveja e logo pensou em Arturzinho durante o casamento. Sempre teve amantes mais jovens, mas nunca se apaixonara pelos namorados da filha. Agora, por ironia do destino, apaixonara-se por Arturzinho, o homem que lhe daria netos. De início, rejeitou a paixão, mas com o tempo, o desejo falou mais alto e foi correspondida em seus anseios. Resolveram viver um romance clandestino. O proibido os excitava e desentediava.

A voz da filha fez com que voltasse à realidade. Despediu-se de Marise, emocionada, e foi para a igreja acompanhada da irmã mais velha, de 52 anos, casada pela quarta vez, com um rapaz 20 anos mais jovem. Assim que desceu do carro, viu Arturzinho se aproximar. Trocaram olhares sensuais e sorrisos maliciosos. Ao ver a cena, Tony foi falar com o amigo, preocupado.
- Eu vi os olhares. Vê lá o que você e sua sogra estão aprontando. É a primeira vez que sou padrinho de casamento. Não quero ficar traumatizado - brincou.

Arturzinho tranqüilizou o amigo:
- Fica calmo. Vai dar tudo certo.

A noiva chegou dez minutos atrasada, num vestido evasê tomara que caia que a deixou deslumbrante. Marise chorou de emoção ao entrar na igreja, de braço dado com o orgulhoso pai, ao som de Pompa e Circunstância. Depois da cerimônia religiosa, os noivos dispensaram os cumprimentos, e ofereceram uma recepção no salão da igreja. Durante a comemoração, Mara Lúcia se aproximou de Arturzinho, cochichou-lhe no ouvido e saiu. Logo Arturzinho desapareceu da festa.

Mara e Arturzinho andavam pelos fundos da igreja quando encontraram a porta do quarto do padre, entreaberta. Entraram dando risadinhas excitadas. Pareciam dois adolescentes fugindo da escola. Aos beijos e abraços, transaram com sofreguidão nos lençóis branquinhos da cama do religioso. Enquanto isso, o padre se deliciava com o bufê no salão de festas. Voltaram para a recepção na hora do bolo. Marise chateou-se e resmungou entredentes:
- Posso saber aonde você se enfiou?
Arturzinho disfarçou sem encarar a esposa.
- Estava procurando um banheiro. Vamos, seu pai está chamando para partir o bolo.

Quando caminhava em direção à mesa do bolo, Arturzinho foi puxado pelo paletó por Catarina, irmã mais nova de Mara Lúcia.
- Eu sei de tudo! Toma o meu cartão. Assim que voltar da lua-de-mel, passa lá em casa. A viuvez me deixou carente.

Em seguida, fez cosquinha na cintura de Arturzinho e saiu cantarolando. Arturzinho apertou os lábios, respirou fundo e pensou : "acho que vou me divertir muito casado com Marise. A família dela é afrodisíaca!".

Estava tão distraído em suas tramóias, que nem reparou Marise trocando olhares sensuais com seu amigo. Tony não conseguia disfarçar a excitação. Ele acreditava que a culpa pelo frenesi era do calor que fazia no Rio, deixando as pessoas ensandecidas sexualmente.

Na hora de partirem o bolo, o sogro, chegado a um discurso, enalteceu a família e ainda fez questão de ressaltar que Marise era uma filha raríssima, por ter sido criada pela sua virtuosa esposa, Mara Lúcia.

Tony sacudia a cabeça penalizado: "Coitado, que homem babaca, não sabe de nada". Acabado o discurso, Ernesto enxugou o suor e ficou ao lado da sobrinha Izabel. Discretamente, beliscou de leve o traseiro da jovem, que deu um risinho mimado. Então ele suspirou, sonhador, e falou no ouvido da sobrinha, de apenas 19 anos:
- Sou ou não sou um artista, minha balinha de mel?


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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