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Contos
07/01/2008 - 17h21
A bola de cristal de Madame Daya
Celamar Maione
 

Lucinda rói as unhas e olha o relógio toda hora. Cinco minutos depois, Yarinha abre a porta e sai lentamente de cabeça baixa.
- E aí ? - pergunta Lucinda curiosa - Tudo bem?
Yarinha pega um lenço e, enxugando as lágrimas, responde indignada:
- Três, Lucinda. O Waldemar não tem uma, tem três amantes. TRÊS!
- A vidente falou o nome das amantes?
- Não. Disse apenas que são três.
- TRÊS?! Com aquela cara de santo?!
- Não existe homem santo. Santo tá no céu.
- Tem certeza que essa Madame Daya é boa?
- Tenho. Três amigas já se consultaram com ela. A bola de cristal de Madame é poderosa.
- Um dia pode errar.
- Ela acertou a morte do meu cachorro, o meu sarampo na infância.
- Por que você não vai a outra? Essas coisas precisam de confirmação.
- Nossa, Lucinda, você está mais interessada do que eu que sou esposa!

Lucinda muda o discurso:
- Bem, se você tem certeza que são três, se fosse meu marido, eu matava!
- Você é muito passional. Homem não gosta de mulher ciumenta. Por isso ficou solteirona.
- E o que você vai fazer? Passar a mão na cabecinha dele e se culpar?
- Não sei. Nessas horas mulher tem que usar a cabeça e não o coração.
- Francamente, você acredita que o Waldemar tá podendo com três mulheres?!
- O que ela falou bate, Lucinda! Justamente segundas, quartas e sextas, o Waldemar chega em casa mais tarde. Está fazendo um curso. É o que diz.

Lucinda fica pensativa, morde os lábios e fala com ar despeitado:
- É, então bate. Você devia se orgulhar do Waldemar. Três, né? E você?
- O que é que tem eu?
- Não transam? Não rola nada?
- Transamos. O meu dia é sábado - mente.
- Filho da mãe!
- O que você disse?
- Nada. Pensando alto.

Se despedem. Lucinda pega o ônibus dizendo que tem consulta marcada com o médico. Yarinha sai caminhando pelo centro da cidade numa tranqüilidade falsa. Rodou duas horas pelas ruas do centro, olhando vitrines e fazendo compras com o cartão de crédito de Waldemar. Antes de voltar pra casa, liga para ele:
- Oi, Wal! Hoje é quarta. Vai ao curso ou vai direto pra casa?
Waldemar responde, impaciente:
- Você está cansada de saber que não falto às aulas. Não precisa deixar comida pra mim. Como alguma coisa na cantina do cursinho - e desliga, apressado.

Era assim que Waldemar tratava Yarinha nos últimos seis meses. Com descaso e indelicadeza. Não iam mais ao cinema e sexo era uma vez ou outra. Num sábado, depois do almoço, Yarinha pegou-o olhando para o nada, com cara de apaixonado. E não era só isso, ainda havia a variedade de cuecas novas colocadas para lavar. Aconselhada por uma vizinha, procurou Madame Daya apenas para confirmar o que já desconfiava: o marido tinha uma amante.

Depois de tanto andar pelas ruas da cidade, perdida em divagações, resolveu ir pra casa da mãe. Dona Áurea não estava. Yarinha deitou-se no sofá e ligou a televisão. Antes de pegar no sono, pensou em Madame Daya - "ela foi certeira. E eu que não acreditava nessas coisas!"

Adormeceu, sorrindo, ironicamente. Enquanto Yarinha dorme no sofá da mãe, Waldemar sai do trabalho apressado, depois de receber uma ligação. Preso no trânsito, olha nervoso para o relógio. O celular toca. Atende angustiado.
- Calma! Estou chegando. Meia hora. Meia horinha só!

Estaciona o carro com pressa. Sobe três andares pela escada. Quando abre a porta do apartamento, Lucinda espera por ele, sentada no sofá e segurando um revólver com as duas mãos:
- Diz, seu canalha!? Quem são as outras duas amantes!?
Waldemar não entende.
- Que duas? Tá maluca? Só tenho você. Eu a amo!

O coração de Lucinda bate acelerado. Ela treme. Waldemar grita:
- Larga essa arma! Vamos conversar!
- Não largo! Eu sei de tudo! A bola de cristal de Madame Daya não mente.
Ele vai se aproximando para desarmar Lucinda.
- Quem é essa Madame? Vai, me dá essa arma. Abaixa a arma!

Lucinda treme. A garganta fica seca. Ela lembra das palavras de Yarinha: "Três, Lucinda! O Waldemar não tem uma. Tem três amantes! TRÊS!!!" Atira. Três tiros. Dois acertam a parede. O último atinge a cabeça de Waldemar. Quando a mãe de Yarinha chega em casa, encontra a filha dormindo no sofá.
- Yarinha, minha filha, acorda! São quase oito da noite. Não vai pra casa?

Yarinha levanta, sonolenta.
- Ferrei no sono. Não preciso mais ir pra casa!
- Aconteceu alguma coisa?
- Descobri que Waldemar me trai, mãe!
- Que vigarista! Se fosse comigo, matava!

A filha dá um sorriso vingativo, aperta os olhos, passa a mão pelos cabelos e revela:
- Não precisa, mãe! Encontrei alguém que faça isso por mim!
A risada maquiavélica de Yarinha ecoa na pequena sala.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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