Onze horas da manhã de um sábado nublado. Célia Regina está na cozinha preparando o almoço, quando Olavinho chega com as compras. - Pronto. Está aí. Tudo o que você me pediu. Assim que tira as compras da sacola, grita para o marido: - Olavinho, vem aqui na cozinha um instante. - Peraí. To trocando de roupa. O que foi? - Você esqueceu da sobremesa! - Que sobremesa? - Cadê a lista de compras? Me dá aqui. Eu escrevi no papel. Olavinho procurou no bolso da bermuda e não encontrou. - Joguei fora - resmungou, contrariado. - O que eu esqueci dessa vez? - Os pêssegos e o biscoito champagne para o pavê. - Substitui o pavê pela banana. Eu trouxe banana. Faz banana frita. - Puxa, Olavinho, você sabe que mamãe adora pavê de pêssego. Ela não vem almoçar aqui em casa há mais de um mês. Não custa nada agradar. - Custa, sim. Minha ida ao supermercado. Diz a ela que pêssego está em falta. - Eu vou fazer isso com a minha mãe? Ela vai acreditar? - E o que é que você quer que eu faça? Que eu volte naquele supermercado cheio, com aquele povo passando com o carrinho por cima do meu pé? - Vai. É rapidinho. Não posso ir. Tenho que fazer o empadão. - Ah, não! Vou tomar minha cervejinha. Esquece a sobremesa. - Deixa de ser imprestável. - Quem inventou esse almoço foi você. Hoje é sábado, dia do meu descanso. Já fiz a minha parte. Agora, tchau! - Você NUNCA faz nada do que eu peço! - Como não? Você é que é uma insaciável. Nunca está satisfeita com nada. - Como eu posso ficar satisfeita com um marido que usa cueca furada e que só quer saber de encher a cara final de semana? - E você? É a senhora perfeita por acaso? Quem é que chega do trabalho e deixa calcinha suja jogada no quarto? Ou então fica duas horas no telefone fofocando? - Sinal de que tenho amigas! - E mulher tem amiga? Mulher tem concorrente. Ou você já se esqueceu que eu era namorado da sua ex-melhor amiga? - Agora eu entendo porque ela abriu mão tão fácil. Bela porcaria! - Porcaria? No início bem que você gostava. Chegava a urrar! - Tudo jogo de cena - ironizou Célia Regina. - Eu sei. Vocês são todas umas falsas! Olavinho anda de um lado para o outro, imitando voz de mulher: - "Nossa! Como a fulana ficou feia com aquele vestido! E o marido da sicrana, hein? Tá saindo com outra, sabia não, queridinha?" - Até que você leva jeito, hein - ironizou Célia Regina. - Vocês são umas invejosas! Vivem falando mal umas das outras. Falam demais. Enchem os nossos ouvidos. É por isso que tem muito homem virando gay. - Você também quer virar, Olavinho? - Não disse isso. Não coloque palavras na minha boca. Mulher tem essa mania. - E homem que só é unido na hora de torcer pro mesmo time? Olavinho completa: - E na hora da cervejinha, e eu já vou tomar a minha. Dá licença. Para chamar a atenção do marido, grita quando ele abre a porta da rua: - Sabe por que eu fico duas horas no telefone? Pra não precisar olhar para a sua cara de entojo! Ele fecha a porta e volta. - E você acha que eu estou satisfeito de olhar pra sua? De estar casado com uma mulher que pinta o cabelo de vermelho? - Você é um grosso mesmo! Estou cansada de tanta grosseria. - Ah é? Então vai morar com a mamãe, Célia Regina! - E deixar a casa pra você enfiar sua amante aqui dentro? - Que amante? Aturar uma mulher já é difícil, vou aturar duas? - Você pensa que eu não sei?! Dona Zulmira viu você no metrô com uma loira. - Tá doida?! - Sabia. Você está me traindo! Esse é o primeiro sintoma do adúltero, chamar a mulher de maluca! Se eu sou maluca, você é um broxa. Sabe há quanto tempo não sei o que é ter um homem? Olavinho olha para o teto, coloca as mãos pra cima e diz: - Essa encheção de saco toda, por causa de um pêssego! Célia Regina já ensaiava uma resposta quando a campanhia tocou. Era Maria Odete que entrou reclamando: - Vocês não têm vergonha, não? Dá para ouvir a gritaria assim que a gente coloca os pés na Vila. Ninguém está interessado em saber da vida sexual de vocês. - A culpa é do Olavinho. Ele não quer comprar uma simples lata de pêssego em caldas e biscoito champagne. Eu quero fazer o pavê de pêssego que a senhora gosta... e... - Sua filha que é culpada! Ela acha que sou empregado dela. - Vamos parar com essa briga inútil. Vim aqui pra almoçar. Sou visita. Só quero saber de uma coisa, você vai ou não vai comprar o pêssego e o biscoito para fazer o pavê da sua sogrinha? Ele pensou, respirou fundo, passou a mão pelo queixo e disse: - Tá bom! Tá bom! Lá vai o babaca de novo pro supermercado. Vocês venceram! Resmungando, sai batendo a porta. Maria Odete balança a cabeça de um lado para o outro e diz: - Coloca uma coisa na sua cabeça, minha filha, eles reclamam, mas acabam fazendo o que a gente quer. No casamento, quem manda, é a mulher. Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Atualmente, é Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou, recentemente, Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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