Assim que Eliete coloca a chave na fechadura e abre a porta, Julinha pergunta: - E aí mãe, como ele é? Eliete suspira. Joga a bolsa para um lado, sapato para o outro, e esparramando-se no sofá, olha com ar sonhador para a filha. - Um deus grego! Meu novo chefe é um deus grego de 50 anos, corpo atlético e cabelos grisalhos. - Se for solteiro, com essa idade, é gay. - Divorciado! Livre para um compromisso sério. Viúva há três anos, Eliete confessara a Julinha que seu sonho atual era arranjar um namorado, pois sentia-se muito sozinha. Quando Doutor Josuebaldo, chefe de Eliete, morreu e ela foi informada que viria alguém de Brasília para substituí-lo, Julinha, com seus poderes paranormais, sentenciou: - Seu novo chefe será importante na sua vida. Aposto, será seu marido! Carente e entediada, Eliete encheu-se de esperança. Contou os dias para conhecer o homem que substituiria o antigo chefe. Quando Doutor Nogueira se apresentou ao trabalho, seguiu-se um alvoroço entre as mulheres, pois além de rico e bem-cuidado, o cinqüentão era divorciado e bonito. O sonho das solitárias e desamparadas. Eliete, secretária direta, passou a tratá-lo com a servilidade de uma escrava. Nogueira conversava gentilmente com ela durante os intervalos para o café. As colegas deram asas à imaginação. - Acho que o doutor Nogueira se interessou por você. Por que não o convida para um café na sua casa? Com medo de Nogueira achar o convite um abuso, se aconselha com as filhas. Sandrinha, que completara 16 anos recentemente, e era a mais desinibida, incentiva: - Convida, mãe! Deixa de ser boba. Se você não convidá-lo, outra convida. Quero conhecer meu padrasto - brincou. Eliete passa duas semanas fantasiando e enchendo-se de coragem. - Doutor Nogueira... - Já disse que não precisa me chamar de doutor. Para você sou apenas Nogueira. Eliete ruborizou e deu uma risadinha nervosa. - Queria convidá-lo para um jantar na minha casa. E para mostrar que o jantar não tinha segundas intenções e era respeitoso, completou: - Faço questão que conheça minhas filhas adolescentes. - Claro. Quando? Também tenho um filho adolescente. Atencioso, no dia do jantar, Nogueira levou um buquê de rosas para Eliete e flores do campo para as filhas. Foi simpático e fez questão de deixar a formalidade de lado. Depois da visita educada, Nogueira passou a tratar Eliete com mais intimidade no escritório. Conversavam e riam durante o expediente. Só. A amizade não evoluía para algo mais. Eliete fala de seu desencanto a uma amiga de trabalho: - Ele é gentil, me dá carona, vai lá em casa, mas não se declara. - Será que é impotente? Mas hoje tem o viagra. Seria tímido? - Tímido? Um homem de 50 anos, tímido? - A moda agora é homem tímido. Atrai as mulheres. Convide-o para o aniversário da Julinha. Julinha reuniria os amigos e parentes num restaurante para comemorar seus 18 anos. Eliete faz o convite a Nogueira. Ele responde de maneira enigmática: - Estarei presente, com certeza. Você terá uma surpresa neste jantar. O coração de Eliete dispara. No dia do aniversário de Julinha, Eliete sente-se apreensiva e comenta com a filha mais nova: - Meu coração está apertado. Tenho mau pressentimento. A jovem deixa Eliete com a pulga atrás da orelha. - O Nogueira não vale o prato que come! Eliete pega-a pelo braço. - Você sabe de alguma coisa? Responda! - Não. Algo me bateu no coração. Quando Nogueira chega ao restaurante, Eliete fica ao lado dele como um cão de guarda. Depois de muito wisky, Nogueira vai até o palco durante a apresentação de um grupo de forró, pede o microfone emprestado e começa um discurso inusitado: - Hoje é um dia muito especial pra mim. Eliete engole em seco. "O que será que ele vai falar? Vai me pedir em casamento? Não me preparei para isso. Estou nervosa!", pensa Nogueira continua o discurso: - Gostaria de em primeiro lugar agradecer a Eliete, essa funcionária dedicada, a acolhida que tem me dado no Rio de Janeiro. Em seguida, depois de chamar Eliete de querida sogrinha, pede a mão de Julinha em casamento. Depois dos brindes, os noivos dançam agarradinhos e comemoram a união surpreendente. Ninguém nota a ausência de Eliete, que sai do restaurante carregada por uma amiga. Enquanto a comemoração continua, Sandrinha vai até Nogueira e entrega-lhe um bilhete. Ele lê: "Vi você beijar a estagiária no dia em que fui à empresa visitar minha mãe. A foto está no meu celular. Se não me beijar com tal desejo, vou mostrar pra todo mundo". Nogueira procura Sandrinha com os olhos. Trocam olhares de cumplicidade. Depois, ele passa a língua pelos lábios e dá um sorriso de satisfação. Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi e atualmente trabalha na Nova Brasil FM. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
|