Cinco horas da tarde. Elvira e Maria Odete saíram do trabalho às risadinhas e cochichos: - Tomou coragem? - De hoje não passa. - Vai gostar. Faço há mais de um ano. - Ajudou no casamento? - Claro. Cada semana é uma novidade. - Amanhã te conto tudo. Me aguarde. Se despediram no ponto de ônibus. Elvira foi para casa disposta a dar um rumo novo ao casamento enfadonho. Quando chegou, tomou banho, colocou uma colônia refrescante e esperou ansiosa pelo marido. Alfredinho chegou reclamando: - Vou pedir demissão. Não agüento mais. Isso não é vida. - Alfredinho, muda o disco. Já conheço a ladainha. Vai tomar banho logo para a comida não esfriar. Quero conversar com você. O jantar foi servido. Comiam na mesa da sala. Elvira queria entrar na conversa, mas não sabia como começar. Alfredinho não tomava conhecimento da mulher. Jantava com os olhos fixos na televisão. Antes de recolher os pratos, Elvira tomou coragem. Sem olhar para Alfredinho, iniciou o assunto: - Alfredinho, você gosta de mim? - Por que essa pergunta fora de hora? - Quero saber. Sou sua mulher. Tenho direito, ora! - Gosto, ué. - Faria tudo o que eu pedisse? - Depende. - Do quê? - Depende do que vai me pedir. Se for para me jogar debaixo de um trem, claro que não! - Falo de sexo. - Sexo? O que tem sexo a ver com a nossa conversa? - Caramba, você assim tá me intimidando. - Então fala logo. Desembucha. Nem respirou: - Você tem alguma fantasia sexual? Alfredinho coçou a cabeça, olhou para a esposa, que curiosa, esperava a resposta: - Vou ao banheiro. Estou cheio de preocupação na cabeça e você me vem com história de fantasia sexual? Francamente. Ficou desconcertada. Sentiu-se quase uma tarada a violentar a mente preocupada do marido. Lavou os pratos prendendo o choro. Passou pela sala envergonhada. Nem olhou para Alfredinho. O marido de Elvira estava sentado no sofá e comentava o noticiário em voz alta com o apresentador. Elvira se trancou no quarto. Em seguida, choramingando, vestiu a camisola, apagou a luz e se deitou. Rolou na cama. Viu o marido entrar no quarto e dez minutos depois adormecer. Passou a noite em claro. Tomaram café emudecidos. Alfredinho saiu primeiro: - Não me espera para jantar. Vou chegar tarde. Não respondeu. Sentia-se humilhada. Rejeitada na sua feminilidade. Queria inovar a relação e distanciou-se mais do marido. Não se relacionavam há dois meses. Sentia falta. Ele sempre tinha desculpa para não conversar sobre o assunto. Quando chegou no trabalho, Maria Odete quis saber: - Como foi? Topou? Mentiu, constrangida: - Na hora. Vai ser no sábado. - Depois me conta. Quero saber tudinho. Elvira deu um risinho sem graça. Jamais exporia sua humilhação para a colega de trabalho bem resolvida com o marido. Sentiu-se sozinha e carente. Na hora do almoço, foi a um sex shop namorar a vitrine. Flertou com a imaginação. Distraída, esbarrou num senhor, uns 20 anos mais velho: alto, paletó e gravata, cabelos quase brancos. O homem pegou-a pelo braço, carinhosamente: - Assustei você, flor de laranjeira? O toque causou-lhe arrepios. Não conseguiu disfarçar a surpresa. O homem trazia no rosto uma compaixão quase angelical. Elvira tomou-se de ternura. Apresentaram-se e trocaram o número do celular. No dia seguinte, quando se aprontava para o almoço, o celular tocou. Viu o número, pensou em não atender. Tomou-se de um impulso juvenil: - Alô, quem é? - fingiu não conhecer. - Elvira, Amaury. Lembra de mim? - Hummmmm.... Amaury! Ah, sim! Ontem na rua. Que cabeça! - Vamos almoçar, flor? Respondeu um sim quase adolescente. Antes, fez charminho. O charme feminino usado no jogo da conquista. Passaram a almoçar todos os dias. A amizade cresceu. Junto veio, de início, uma intimidade fraterna. Depois, a curiosidade sexual. Elvira falava da insatisfação do casamento. Amaury reclamava da frieza da esposa. A vontade de uma intimidade maior aumentou. Entediada com o que a vida lhe proporcionara até aquele momento, Elvira tomou a iniciativa. Queria novidade: - Amaury, se eu lhe fizer uma pergunta indiscreta, promete responder com sinceridade? - Prometo. - Você tem alguma fantasia sexual? Pego de surpresa, tentou responder com naturalidade e inventou: - Várias. Vivo no mundo da fantasia. A realidade é um tédio. Cochichou-lhe, então, timidamente no ouvido. Ele deu uma gargalhada de excitação: - Vamos colocar em prática. Que tal segunda-feira depois do trabalho? Uma espécie de formigamento tomou-lhe o corpo. No dia combinado, antes de sair, mentiu para o marido: - Alfredinho, vou fazer extra hoje. Deixo comida fresca na geladeira. Quando chegar é só esquentar no microondas. Não conseguiu trabalhar direito. Olhava o relógio a todo instante. O dia se arrastava. O pensamento em Amaury ajudou-a a preparar os relatórios. Bateu o cartão. Saiu apressada. Se encontraram. Curiosa, Elvira perguntou: - Trouxe? - Claro. Tá aqui na pasta. Olha o embrulho. A mulher prendeu a respiração de tanta empolgação. Chegaram ao motel. Amaury pegou o pacote e se enfiou no banheiro: - Já volto. Elvira andava de um lado para o outro. Parecia uma criança à espera de um brinquedo novo. Nunca traíra o marido. "Mas seria por uma boa causa" - pensava para diminuir a consciência pesada. Quando a porta do banheiro se abriu, a sensação foi indescritível. Amaury, fantasiado, foi em direção a ela, puxou-a pela cintura, beijando-lhe a boca com sofreguidão. Em seguida, gemeu: - Minha mulher gato! Correspondeu, entusiasmada: - Me beija, meu super-herói! Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi e trabalhou na Nova Brasil FM. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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