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Contos
05/08/2007 - 17h51
Prazer, madame Natalie
Celamar Maione
 

Eduarda passava de ônibus, em companhia da amiga Margareth, por uma rua do subúrbio, quando viu o anúncio: "Cigana Madame Natalie. Resolvo problema no trabalho, falta de dinheiro e faço a pessoa amada voltar em três dias. Só 10 reais". Eduarda fez sinal para descer. Margareth tentou impedir:
- Tá doida? O ponto é mais na frente.
- Agora é aqui. Não viu o anúncio? Essa Madame faz a pessoa amada voltar em três dias. Orlandino vai voltar pra mim.

Puxou a amiga. As duas desceram. Era uma rua sossegada em Cascadura, com várias casas coloridas, uma ao lado da outra. A de Madame Natalie, com janelas azuis, estava fechada. Parecia não ter ninguém. Tocou a campanhia. Não funcionou. Resolveu bater palma.
- Ô de casa! Tem alguém em casa?
A porta se abriu. Uma senhora gorda, aparentando 60 anos, cabelos avermelhados, com um vestido estampado, abriu a porta com um sorriso no rosto:
- Pois não? Em que posso ser útil?
- A senhora é Madame Natalie?
- Não. Sou a mãe dela. Em que posso ajudar?
- Desci do ônibus quando vi o anúncio. Queria uma consulta para...

Foi interrompida pela senhora.
- Sei, sei. Tem que marcar hora pelo telefone. Hoje todos os horários estão ocupados.
Eduarda fez voz de choro. Precisava falar com Madame Natalie com urgência. Pagaria qualquer coisa. Diante do pedido desesperador, e da voz embargada de Eduarda, a senhora fez sinal para que aguardassem. Voltou cinco minutos depois e chamou-as para entrar.

A sala estava com uma luz avermelhada. Havia 8 mulheres, todas caladas, olhando para o nada. Eduarda e Margareth sentaram-se num sofá de canto. Eduarda olhou tudo em volta e comentou:
- É boa. Está cheia.
Quase 10 horas da noite e ainda tinha uma cliente para ser atendida. Margareth se preocupou.
- Não é melhor voltar outro dia? Já é tarde.
- Se você quiser, vai. Vou ficar.

Margareth foi solidária e esperou com a amiga. Eduarda foi atendida. Passava das 11 da noite. Fez sinal para Margareth entrar junto com ela, mas a mãe de Natalie proibiu a entrada da amiga:
- Ela espera. Entre sozinha, por favor.

Quando Eduarda entrou, se surpreendeu. Esperava encontrar uma mulher gorda, de rosto redondo e cabelos pintados. Ao invés disso, ficou frente a frente com uma jovem aparentando 25 anos, magra, cabelos pretos, lisos, compridos, olhos grandes e verdes, lábios grossos e de um sorriso enigmático. A roupa também era bem diferente das roupas usadas por ciganas tradicionais. Madame Natalie vestia uma mini-saia jeans e blusa de malha branca. Diante do olhar de espanto de Eduarda, procurou ser amável.
- Prazer, Madame Natalie! Minha mãe me disse que estava aflita. Por favor, sente-se.

Eduarda sentou-se e olhou atentamente para Madame Natalie. Ficou imaginando, com um olhar invejoso, de onde havia saído aquela mulher bonita, aparentando tanta personalidade. Foi tirada de seus pensamentos pela voz macia de Madame Natalie.
- Qual o motivo da urgência?
- Orlandino. Terminou o noivado por causa de outra. Eu o amo. Você disse no anúncio que faz a pessoa amada voltar em três dias...

Madame pegou a mão de Eduarda delicadamente e olhou por alguns instantes. Respirou fundo. Fez uma cara de quem não gostou do que viu. Pegou o baralho e pediu para ela dividir.
- Este homem deve sair do seu caminho. Por que não o deixa partir?
- No anúncio você promete fazer a pessoa amada voltar em três dias. Pode fazer ou não?
- Poder, posso. Mas sairá caro. Tem que fazer o trabalho com uma cueca dele junto com um retrato e um presente que ele tenha lhe dado. Traz pra mim. E não serão três dias, pela situação, uns seis dias. O caso é complicado.

Madame Natalie deu um papel para Eduarda, com todo o material que precisaria para fazer Orlandino voltar. Combinaram um prazo de seis dias.
- Além dos dez reais da consulta de hoje, terá que me dar mais 400 reais. Tenho que comprar o restante do material.

Eduarda não argumentou. O desespero era grande. Fez o cheque e combinou de voltar dois dias depois para dar prosseguimento à magia que traria Orlandino de volta. Se despediu esperançosa. No dia seguinte, faltou ao trabalho. Combinou com Margareth de dizer ao patrão que estava doente. Precisava bolar uma maneira de pegar uma cueca do ex-noivo. Enquanto Eduarda planejava o roubo da cueca, Madame Natalie suspendeu as duas consultas da tarde. Disse à mãe que precisava atender um empresário no Centro da cidade.

Antes de entrar num edifício, na Gomes Freire, olhou para todos os lados. Chamou o elevador e saiu no quarto andar. Pegou as chaves e abriu a porta do apartamento 403. Assim que entrou, jogou bolsa para um canto e sapato para o outro. Serviu-se de um copo de vinho. Meia hora depois, a porta do apartamento voltou a se abrir. Madame Natalie deu um sorriso.
- Demorou, Marco Antonio!
Foi logo desatando o nó da gravata e, abraçado a Madame Natalie, perguntou, ansioso:
- Eduarda caiu na sua conversa?
- Quem não cai na NOSSA conversa? Quantas noivas desesperadas já não engordaram nossa caixinha mensal? Só achei horroroso o nome que você inventou dessa vez!


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi e atualmente trabalha na Nova Brasil FM. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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