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Contos
02/08/2007 - 12h09
O aniversário da tia Vitória
Celamar Maione
 

Quando Albertino Junior chegou na festa de oitenta anos de tia Vitória houve constrangimento entre os familiares. Com uma saia justa preta, blusa de renda amarela, sapatos plataforma prateados e peruca loira, Albertino entrou, de mãos dadas com o novo namorado, Olavinho. Olavinho é desses homens que se confundem com um príncipe do século vinte e um. Alto, moreno, olhos verdes, musculoso, dentes alvos e sorriso encantador. Assim que chegou, atraiu a atenção das primas solteironas do namorado, que comentaram invejosas:
- Gislene, que mundo é esse! O que é isso? Nós aqui sozinhas e o gayzão do Albertino com este homem lindo.
- Ele está escancarando! Não disfarça mais a viadagem. Assumiu mesmo.

Albertino chegou, sorrindo, sem demonstrar a menor vergonha, e foi abraçar a aniversariante:
- Tia linda, fofa, espero que a senhora goste do que comprei.

Aproveitou e apresentou Olavinho como futuro noivo. Em seguida, Albertino foi falar com o restante da família e tia Vitória começou a passar mal:
- Pega meus remédios da pressão em cima da mesinha de cabeceira do quarto, Cremilda! Anda, rápido!

Alheio à confusão que se formou, Albertino foi falar com as primas:
- Margareth, você está uma fofa! Vestido maravilhoso! Adorei, prima! A-do-rei!
Depois, aproximou-se de Gislene, passando as mãos pelos cabelos dela. Respirou fundo e fez cara de nojo:
- Nossa, Gis!! Você está com esse cabelo ressecadíssimo! Precisa de uma hidratação urgente. Passa no salão. A hidratação sai de graça pra você.
- E você, como está? Nossa, engordou mulher!

Enquanto isso, Tia Vitória foi levada para o quarto, com falta de ar. Envergonhada, a mãe de Albertino se aproximou:
- Albertino, sua tia passa mal por sua causa.
- O que é que eu fiz?
- Chocou sua tia vestido desse jeito. Ela não tem mais idade para ver essas coisas.
- Que coisas, mamãe? Pelo jeito sou o único feliz aqui. Minhas primas são encalhadas e mal-amadas. E o primo Celinho? Me olha de cara feia. Ninguém mandou casar com aquele tribufu ao lado dele. Mulher horrorosa!

A mãe, inconformada com a atitude do filho único, olha para o alto se perguntando:
- Deus, onde errei?
- Você não errou. Me assumi! Sou feliz.
No quarto, tia Vitória reclamava de falta de ar. Marinete, a irmã mais velha, rezava um terço, excomungando o sobrinho. Cremilda abanava Vitória:
- Você quer que eu peça para o Albertino ir embora?
- Não! - respondeu tia Vitória, rapidamente.
- Albertino chocou você e choca os convidados. Atrapalha sua festa de aniversário.
- Chama ele aqui. - pediu tia Vitória, com a voz abafada.
Cremilda tentou argumentar. Vitória insistiu. Cremilda foi até a sala e encontrou Albertino dançando com Olavinho. Celinho resmungava com a esposa de olhar caído:
- Ridículo ter um primo traveco. Se no trabalho descobrem... Que vergonha! O que vou dizer ao meu chefe? Sou macho.

A esposa aproveita a ocasião insólita e fala o que pensa:
- Macho? Sei não. Adora vestir minhas calcinhas.
Enquanto brigavam, Cremilda se aproximou e cochichou no ouvido de Albertino. Ele acompanha Cremilda até o quarto. É recebido com um sorriso por tia Vitória. Ela pega-lhe nas mãos e pede que sente na cama ao lado dela. Depois, fala baixinho com o sobrinho. Ele dá uma gargalhada, que ecoa no quarto:
- Então é isso? Saudade, tia?
- Exatamente.
- Realizarei seu desejo. Licencinha meninas!
E sai empurrando as tias que estão na porta.

Volta, acompanhado de Olavinho. Olavinho se abaixa e beija tia Vitória na boca. Um beijo longo, de língua. Tia Vitória se levanta da cama, dá as mãos a Olavinho. Nos lábios, um sorriso revigorante. Chega na sala e começa a dançar. Não larga mais Olavinho. Albertino sorri e fala com a mãe:
- Tia Vitória sabe o que é bom.
Os convidados ficam boquiabertos com o assanhamento da aniversariante. Os comentários não pararam mais:
- Velha assanhada!
- Só pode estar esclerosada!

Tia Marinete pegou a bolsa:
- É o fim do mundo! Vou me embora.
Na hora do parabéns, tia Vitória choca ainda mais. Ela beija Olavinho na boca, na frente de todos os familiares e vizinhos. Quem olhava a tudo, de um canto da sala, com olhar invejoso, esfregando as mãos e engolindo em seco, era Celinho.


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Atualmente, é Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou, recentemente, Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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