Laurindo abriu a geladeira, olhou durante alguns segundo e gritou para a esposa: - Glorinha, cadê minhas cervejas? - Ora essa! E eu que vou saber? Você bebeu. - Não bebi não. Ontem ainda tinha três latas. Em tom irônico e debochado Glorinha respondeu: - Então foi o outro. Laurindo foi até o quarto, colocou uma bermuda, pegou a carteira e saiu pisando firme: - Vou comprar mais. Se você jogar minhas cervejas fora de novo... Glorinha interrompeu e peitou o marido: - Se eu jogar fora o que vai acontecer? Vai me bater? Não tenho medo de homem, não. As crianças que almoçavam assistindo desenho ficaram quietas e só quando o pai bateu a porta e a mãe foi para a cozinha, o irmão mais novo comentou: - Sacanagem Osvaldo, você jogou as cervejas do papai fora só para eles brigarem. O irmão riu, se levantou da mesa e antes de levar o prato para a cozinha cochichou no ouvido do irmão mais novo: - É que assim eles ficam discutindo e não enchem o saco da gente. E ainda me deixam ficar no computador o dia todo. Quando o pai voltou com as cervejas, os meninos estavam no computador e a mãe no telefone. Glorinha reclamava do marido com uma amiga: - Não agüento mais esse homem. Só faz beber. Trabalha e ganha uma miséria. Ganho mais que ele. Agora mesmo a gente estava discutindo. Às vezes me pergunto que mal eu fiz a Deus para ter um marido como esse. Quando ouviu Laurindo voltar da rua disfarçou: - Preciso desligar, ele está voltando. Passaram o final de semana emburrados, para alegria das crianças, que não precisaram participar dos passeios enfadonhos, como ir ao zoológico ou visitar os avós, que os pais gostavam de fazer nos finais de semana. Na segunda-feira, enquanto se arrumavam para o trabalho e esperavam as crianças para levá-las ao colégio, nova discussão começou: - Glorinha, cadê minha meia bege? Não estou achando. Ela combina com o meu paletó marrom. - Coloca a meia branca. A bege deve estar molhada. - Eu quero a meia bege. Gritavam por causa de uma simples meia. Quem deu a discussão por encerrada foi Helinho, o filho mais novo, que veio com a meia nas mãos: - Toma pai, já secou, tava na corda. Foram trabalhar brigados. A mãe levava Helinho para a escola, enquanto o pai levava Osvaldo. No caminho Helinho comentou com a mãe: - Já sei porque papai quer ficar bonito hoje. Porque hoje é segunda-feira. - Sim e o que tem segunda-feira diferente dos outros dias além de ser início de semana? - Hoje ele vai se encontrar com a Iracema. - Iracema? Quem é Iracema, garoto? - Vai me dizer que a senhora não sabe? A namorada do papai. Aquela moça que mora na primeira casa da rua. Glorinha chamou o filho de mentiroso. O menino jurou que era verdade, ainda mostrou um presente que Iracema havia lhe dado quando esteve na casa dela com o pai. A notícia deixou Glorinha perdida. Nem trabalhou direito. Quase trocou os relatórios. Levou bronca do chefe. - Está com a cabeça no mundo da lua, Glorinha? - Desculpe. seu Astolfo, são problemas particulares. - Então faz o que tem que fazer logo e vai embora mais cedo. Não quero funcionário inútil no escritório. Deixou o expediente antes das cinco. No caminho, jurou vingança. Não gostava mais de Laurindo, mas não perdoaria a traição. "Miserável, me enganando e ainda coloca meu filho como cúmplice. Mas ele me paga. Se me paga!", pensou. Chegou em casa, arrumou as malas do marido e quando ia saindo, Helinho perguntou: - Que malas são essas? Vai fugir de casa, mãe? - Você não disse que seu pai tava de caso com a Iracema da rua? Pois é lá que vou deixar as malas dele. Não é segunda que ele diz que fica no trabalho até mais tarde e visita a amante? Pois então. Saiu e foi tocar na porta da rival. Iracema abriu a porta. Se assustou ao ver Glorinha com as malas na mão: - O que significa isso? - São do Laurindo. Ele não está aí? Pode ficar com ele. É todo seu. Virou as costas e ainda viu o marido de cuecas gritando da porta do quarto da amante. Glorinha trocou as fechaduras da porta e proibiu as crianças de falarem com o pai. Um mês depois, Iracema ligou para reclamar de Laurindo: - Por isso que você não quis ficar com ele, né? Além de beber cerveja todo dia, ainda é porco, não gosta de banho. - Pois é, agora agüenta. Fiquei livre desse traste. No inicio dói ser enganada, mas depois, a gente até comemora. Iracema e Glorinha ficaram amigas. Passavam os dias falando mal de Laurindo. A vida na casa da amante também virou um inferno de cobranças. O maior golpe, porém, veio quando depois de um dia cansativo de trabalho, chegou em casa e encontrou as malas na porta. Nervoso, tocou a campanhia: - O que significa isso? Me colocando pra fora, Iracema? Pra onde eu vou agora? - Se vira. Laurindo forçou a entrada: - Tem alguém com você. Você está me traindo. Vou entrar. Empurrou Iracema. Ela ainda gritou: - Vai se arrepender! Quando abriu a porta do quarto, encontrou Glorinha embaixo do edredon, com um copo de vinho na mão assistindo um filme pornográfico. Laurindo pegou as malas e sob o peso da humilhação, partiu sem deixar rastro. Um ano depois, alguns vizinhos dizem ver Laurindo vagando pelas ruas do Centro do Rio, com roupas rasgadas, falando sozinho e gesticulando muito. Não reconhece ninguém e não lembra nem do nome. Glorinha e Iracema assumiram a relação amorosa. Para conquistar os enteados, Iracema deu a eles um poodle. Em homenagem ao pai sumido, os meninos colocaram o nome do cachorro de Laurindo. Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Atualmente, é Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou, recentemente, Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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