Jurandir chegou batendo a porta e foi direto para o quarto. A mãe, que estava na cozinha, fazendo almoço, foi atrás. - O que houve, Jurandir? - Não vai haver mais casamento. - Por quê? - Não amo Adelaidinha. Amo outra mulher. Se ela me procurar, diga que não estou. NÃO ESTOU EM CASA, ENTENDEU?! Dez minutos depois de se trancar no quarto, a campainha tocou. Era Adelaidinha. Estava pálida, com os olhos vermelhos de tanto chorar. Penalizada, Cleomira convidou a jovem para entrar. Adelaidinha se lamentou: - Dona Cleomira, o Jurandir terminou o noivado. A culpa é daquela piranha que ele conheceu na faculdade. Mas homem é assim mesmo, só gosta de mulher que não pisa nele. Eu o perdi por amá-lo demais! Falava sem parar. Cleomira aconselhou. Adelaidinha repetia a mesma coisa: - E digo mais, dona Cleomira! Escreve o que estou dizendo: essa mulher vai ser a desgraça da vida do Jurandir. Aposta quanto? Cleomira se arrepiou. Sentiu medo. Disse que o filho estava no quarto. Adelaidinha foi até o quarto. Abriu a porta. Quando Jurandir a viu, se irritou: - Mãe, eu não disse que era para dizer que eu não estava em casa? - Sua mãe não tem culpa. Você me deve uma explicação. Por quê? A gente se ama. Por quê? Começou a chorar. O peito doía-lhe. Sentia vertigem. Tentou agarrar Jurandir. Foi rejeitada. Esmurrou a porta. Foram parar na sala discutindo. Jurandir, sem paciência, ofendeu Adelaidinha: - Não quero mais você! Amo outra mulher! Me deixa em paz! Adelaidinha deu um urro assustador. Saiu correndo pela vila. Atravessou a rua sem olhar. O ônibus a pegou em cheio. Morreu na hora. Depois do enterro, Jurandir sentiu uma mistura de pena e alívio. Estava livre para conquistar Odete. Alta, loira e bonita, Odete gostava de homens com dinheiro. Jurandir era um simples escriturário. Quando ele a convidou para sair, levou um fora: - Com esse carro velho?! Gosto de cheiro de couro novo. Jurandir colocou na cabeça que conquistaria Odete a qualquer preço. Quanto mais rejeitado, mais apaixonado ficava. Arrumou outro emprego. Seis meses depois, estava de carro novo e mostrou para Odete: - É meu. Cheira o estofado. Couro novo. Novinho! Odete saboreava o estofado novo do carro de Jurandir. Saiu com ele. Passearam por Copacabana. Quando Jurandir tentou beijá-la, foi empurrado. - Não, não, não! Homem tem que ter dinheiro. Não é só um carro novo que vai me conquistar. Homem para me conquistar tem que me dar muito mais do que um passeio num carro novo por Copacabana. Apaixonado, quanto mais Odete pedia, mais ele se virava para realizar os caprichos da mulher amada. Trancou a faculdade e arrumou outro emprego. Quase não dormia. Só fazia trabalhar. Presenteou Odete com um cartão de crédito. - É todo seu. Pode gastar á vontade! Jurandir se endividava. Trabalhava para comprar jóias, roupas e perfumes para Odete. Quanto mais ele a presenteava, mais ela o chantageava. - Beijo só depois que me der uma casa. Meu sonho é dar uma casa de presente para minha mãe. As contas chegavam. Jurandir não tinha dinheiro para pagar. Não conseguia manter as despesas feitas por Odete. Se desesperava. Parecia um mendigo faminto a implorar comida. - Odete, faço tudo por você. Não mereço um beijo? - Me dá as coisas porque quer. Isso não significa que vamos ter algo mais. Não sou prostituta. Podemos ir para a cama com uma condição: meu sonho é dar uma casa para minha mãe. Jurandir trabalhava noite e dia na esperança de realizar o sonho da casa própria para Odete. Chegava em casa tão estafado que, apesar das dívidas e dos problemas, deitava na cama e logo adormecia. Sonhou com Adelaidinha. No sonho ela lhe dizia: - Sinto saudades de você! Quero lhe ajudar! Me escute: a única maneira de ganhar dinheiro para pagar suas dividas é assaltar um banco. Assalte um banco! Jurandir acordou impressionado. O sonho parecia real. Sentiu saudades de Adelaidinha. Com a operadora de cartão de crédito ligando para cobrar as dívidas, com Odete querendo uma casa e o homem da concessionária ameaçando tomar-lhe o carro, viu-se, cada vez mais, pressionado. Ainda tinha Adelaidinha, depois de morta, a dar-lhe conselhos dia e noite: - Assalta um banco. Protejo você. Ainda o amo. É sua única saída. A idéia do assalto foi se materializando. Passou um mês estudando o movimento de um banco longe de casa. Dormia imaginando-se rico, desfilando com Odete numa Mercedes conversível. No dia de colocar o plano em prática, saiu de casa e beijou a mãe na testa. - Mãe, se hoje me acontecer alguma coisa, saiba que a amo muito. Cleomira se preocupou. - Não faz nenhuma besteira, meu filho. Pelo amor de Deus! O coração de Cleomira apertou. Foi até a mesa de cabeceira rezar em frente à imagem de Santo Expedito. Pediu proteção para o filho desnorteado. O assalto não deu certo. Jurandir foi preso ao tirar o revólver da cintura. Assim que Cleomira chegou à delegacia, presenciou um quadro deprimente. O filho, algemado, gritava, adementado, apontando as mãos unidas para a parede: - A culpa é sua! Você disse que daria certo! Você me paga, Adelaidinha! Me paga! Vou atrás de você no inferno. Me aguarde! Jurandir via Adelaidinha, encostada na parede, com um vestido negro, comprido, rindo, enlouquecidamente. Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Atualmente, é Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou, recentemente, Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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