Eram apaixonados um pelo outro. Amor no duro. Daqueles de dar inveja a mocinha de novela. Silvinha e Marcelino estavam com casamento marcado para o final do mês de novembro. Porém, tudo seria perfeito se não fosse Zequinha. Zequinha era o irmão mais velho de Silvinha. Perseguia a caçula desde que ela nasceu. Quando Silvinha veio ao mundo, as atenções se voltaram para ela. Zequinha acusava os pais de desleixo: - Depois que essa garota nasceu vocês dois não gostam mais de mim. Me deixaram de lado. Me tratam como se eu fosse lixo. Os pais achavam bobagem o ciúme de Zequinha. Diziam que era coisa de criança. Mas o tempo passou, os dois cresceram e as brincadeiras de mau gosto de Zequinha incomodavam a todos dentro de casa. Era barata no armário da irmã. Fofoca com as amigas de Silvinha. Fazia da vida da irmã um verdadeiro inferno. Até que Silvinha conheceu Marcelino e as implicâncias diminuíram. Porém, faltando um mês para o casamento, Zequinha resolveu estragar o enlace matrimonial da irmã. Marcelino se despedia de Silvinha no portão de casa e nem reparou que Zequinha o observava: - Tchau amor. Amanhã, assim que eu pegar o carro na oficina, venho para cá e a gente vai na igreja conversar com o padre. - Tá amor. Cuidado. Não gosto que você ande de ônibus. Quando chegar em casa me liga. Despediram-se com um beijo estalado. Marcelino descia a rua, quando sentiu alguém puxando seu braço. Era Zequinha: - Caramba, Zequinha, já ia te dar uma porrada! Pensei que fosse assalto. O que foi? O que aconteceu? Zequinha foi direto. Sem rodeios. - Preciso falar com você. - Fala homem, o que foi? - Não casa com a minha irmã. Ela é uma puta. Putona. Daquelas rameiras deslavadas. Marcelino estufou o peito e foi pra cima dele: - O que é isso cara? Como você chama a mulher com que eu vou casar de puta? Ela é tua irmã e vai ser minha esposa. Além do mais, é uma moça direita. Zequinha deu uma sonora gargalhada: - Isso é o que você pensa. Ela é puta. Das boas. Estou só querendo ajudá-lo. Os dois começaram a discutir. Marcelino deu um soco em Zequinha, que caiu em cima de um carro. Nisso, começou a juntar gente na rua e a turma do deixa disso conseguiu separar a briga. De um lado, Marcelino gritava: - Você é um babaca. Você tem inveja da sua irmã. É isso, maricas, otário! Do outro lado, Zequinha, com a cara mais cínica do mundo, gritava: - Pode falar o que você quiser, gritar, espernear, mas ela é puta, putona mesmo! A vizinhança conseguiu levar Zequinha pra casa. Quando ele entrou com a boca sangrando, Silvinha se preocupou: - O que é isso? Alguém bateu em você? - Não foi nada. Esbarrei com os lábios no balcão do armazém. Não foi nada. Me deixa em paz! Marcelino foi para casa bufando de raiva. Ligou para Silvinha, quando chegou, mas não comentou sobre a briga com o irmão dela. Naquela noite, não conseguiu dormir. As palavras do futuro cunhado ecoavam na cabeça dele: "Ela é puta, putona mesmo!" E ele se perguntava: "Será? Não é possível!" Só que a semente da dúvida se instalou na cabeça e no coração de Marcelino. De manhã, sem pregar o olho, foi para o trabalho. No final da tarde, pegou o carro na oficina e foi ver Silvinha. Assim que olhou a futura esposa, as palavras de Zequinha vieram à sua cabeça: "Puta, putona". Marcelino ficou esquisito, calado. Silvinha notou: - Amor, o que você tem hoje? Tá caladinho. Quer que eu faça um cafuné? - Não quero nada. Vamos na igreja falar com o padre e depois eu a deixo em casa. Estou com dor no estômago. Foram à igreja. Conversaram com o padre. Marcelino deixou a noiva na porta de casa. Não quis entrar. Ela insistiu: “Vamos, papai quer ver você. Vem, vamos.” Acabou cedendo. Logo se arrependeu. Não deu dois minutos que estavam sentados no sofá, conversando com o pai de Silvinha, quando Zequinha chegou. Zequinha olhou para a cara de Marcelino e passou a língua nos lábios. Depois, deu uma piscadinha. O sangue de Marcelino ferveu. Conteve-se. Quando se despediu de Silvinha, tomou coragem e perguntou: - Silvinha, me diga uma coisa, seu irmão é gay? - Gay??????? Tá maluco??? Meu irmão é galinha! Vive saindo com uma e com outra. Galinhão! Dizem que queria até me pegar. Mas por que você está me perguntando isso? - Nada não. Esquece. Deixa pra lá. Me dá um beijo. No dia seguinte, o telefone tocou no trabalho. Era Zequinha. Marcelino atendeu e quando ouviu a voz do futuro cunhado, suou frio: - Fala, o que você quer? - Estou ligando para dizer que minha irmã é uma puta. Putona. Rameira da pior espécie. Os motoristas de táxi lá do subúrbio é que sabem. Durante três dias, Zequinha martelou a cabeça de Marcelino com a história da irmã. Até que Marcelino comprou uma arma e chamou Zequinha para conversar: - Cara, vamos tomar um chope hoje. Eu preciso que você me conte essa história direito. Vamos em paz. Sem brigas. Zequinha aceitou o convite. Beberam um pouco. Conversaram amenidades. A arma na cintura de Marcelino, por baixo da camisa: - Vamos dar uma volta pela cidade - sugeriu Zequinha, inocente, sem desconfiar de nada, aceitou. Os dois chegaram num local deserto e Marcelino perguntou: - Me diz uma coisa, quem sabe dessa história da Silvinha ser puta? - Eu. Eu a vi saindo com um taxista. Investiguei um mês e descobri que ela tem compulsão por motoristas de táxi. - Tem certeza? Só você sabe dessa história? - Só eu. Mais ninguém. Marcelino pegou na arma, sem que o outro percebesse. Mexeu nela, ia tirar da cintura. Suou frio, as pernas bambearam, o coração bateu acelerado, não teve coragem de atirar no futuro cunhado. Deixou Zequinha em casa. Despediu-se dele, parou o carro na rua de trás e chorou como uma criança. Sentiu-se o pior dos homens: - Sou um maricas. Nem coragem pra matar esse babaca eu tenho. Resolveu contratar alguém para matar Zequinha. Se só Zequinha sabia que a irmã era puta, se é que era mesmo, esse segredo morreria com ele. Contratou um matador profissional. Queria a morte para o dia do casamento. De tarde. Assim não daria tempo de Silvinha tomar conhecimento da morte do irmão e o casamento sairia. Depois, lua-de-mel. Ficariam fora um mês. Dia do casamento. Quando chegou na porta da igreja, o celular tocou. Marcelino atendeu, com as mãos trêmulas. Do outro lado, uma voz seca falou: - Serviço feito. Acabou. Marcelino respirou aliviado. Meia hora depois, Silvinha chegou à igreja. Marcelino ficou embevecido ao ver a mulher amada vestida de branco. Pegou Silvinha das mãos do pai dela e subiu ao altar. Começou a cerimônia. Silêncio. Só se ouvia a voz do padre. Cinco minutos depois, a voz do religioso foi abafada por um som de palmas que vinha da porta da igreja. Era Zequinha. Os convidados olharam para trás. Quando Marcelino viu o cunhado vivo, arregalou os olhos de pavor. Zequinha estufou o peito e gritou: - Vejam esta mulher de branco no altar!!????? Estão vendo? Olhem bem para ela!! É uma puta. Putona. Comida de taxista! Cheio de ódio na voz, continuava o discurso, avacalhando com a irmã. Burburinho geral. Marcelino sentiu uma fisgada no peito. De repente, o nó da gravata apertou. Caiu ali mesmo, no altar. Enfarto. Fulminante. Silvinha saiu rasgando o vestido, igreja afora, desnorteada. Os pais da noiva desmaiaram. Enquanto isso, um riso estridente ecoava por todo o ambiente. Era Zequinha que, num acesso de fúria, arrancava as rosas que ornamentavam a igreja. Depois, jogava as pétalas na cara do noivo morto, caído no altar: - Eu disse para você não casar com ela. Eu avisei, eu avisei, seu otário! Zequinha ria, enlouquecidamente. Os convidados estavam em estado de choque. O padre só fazia rezar. Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical, Rádio Globo e Rádio Tupi. Faz freelance na época do Carnaval na Rádio Tupi, na cobertura de barracão de escolas de samba e na Marquês de Sapucaí. Leciona Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.
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