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Contos
14/01/2007 - 15h12
O ciumento
Celamar Maione
 

Gelson e Martinha estavam casados há 10 anos. Não tinham filhos. A mulher era dedicadíssima ao marido. Tudo seria perfeito se não fosse o ciúme doentio de Gelson. Martinha, muitas vezes, era prisioneira em sua própria casa. O marido não deixava a esposa sair sozinha. Tinha medo que ela arranjasse um amante. Seus pertences eram sempre revistados.

Gelson vasculhava tudo achando que podia encontrar bilhete de algum amante. Não adiantava a mulher dizer que o amava e que nunca o iria trair. Ele tinha esse complexo de corno. Não tinha jeito. Nasceu assim. Devia ser coisa de outra vida.

Quando iam a algum restaurante era sempre a mesma ladainha:

- Martinha... aquele cara tá olhando para você. Se ele olhar novamente vou tomar satisfação.

Martinha ria do ciúme do marido e dava sempre um jeito de acalmá-lo:

- Amorzinho, não tem ninguém me olhando, deixa disso, vamos comer em paz, pelo menos dessa vez.

E voltavam a comer, aparentemente em paz. Pois Gelson ficava de olho sempre na mesa vizinha, com medo que alguém olhasse para sua esposa.

As amigas de Martinha não sabiam onde ela arranjava tanta paciência para conviver com o ciúme doentio do marido. De tanto falarem, ela também começou a ficar meio que enjoada de tanto ciúme sem motivo. Afinal, eram dez anos convivendo com as desconfianças de Gelson. Ela sabia que paciência tinha limite e a dela estava chegando ao fim.

Um belo dia a mulher estava sentada assistindo a novela preferida, quando o marido chegou eufórico:

- Martinha, você não sabe quem eu encontrei no Metrô. Sabe o Joaquinzinho, aquele meu amigo de faculdade, lembra? Eu falava muito dele pra você.

A mulher balançou a cabeça afirmativamente.

- Pois é, encontrei com ele. Batemos um longo papo. Ele também está casado. Eu o convidei para vir com a esposa almoçar aqui em casa no sábado.

No sábado, lá foi Martinha para a cozinha fazer a comida preferida do amigo do marido. Ela fazia de tudo para agradar, mas o danado do ciúme do marido estragava sempre tudo. Porém, dessa vez, foi diferente. Gelson estava empolgadíssimo com a visita do amigo que ele já não via há mais de 10 anos. E não fez nenhuma recomendação especial a Martinha.

Por volta do meio dia, a campainha tocou e Joaquinzinho apareceu acompanhado da esposa Rejane. Martinha ficou impressionada com a beleza de Joaquinzinho.

O almoço correu às mil maravilhas. Enquanto Gelson e Joaquinzinho recordavam os velhos tempos de faculdade, Rejane e Martinha aproveitaram para se conhecer melhor. O casal fez amizade. Passaram a sair para todos os lados juntos.

Pela primeira vez Martinha se sentia completamente feliz no casamento. O marido deixou um pouco aquele ciúme doentio de lado. Não foi capaz de perceber os olhares trocados entre Martinha e Joaquinzinho sempre que eles se encontravam.

Numa segunda-feira chuvosa, Martinha estava em casa lendo um livro, quando bateram na porta. Era Joaquinzinho. Ela abriu e ele foi entrando:

- Desculpe, é que eu vim visitar um cliente aqui perto e como está chovendo muito, acabei me molhando todo. Lembrei que vocês moravam aqui perto e vim aqui tentar me ajeitar um pouco e... e...

Meia hora depois Joaquinzinho e Martinha estavam entre beijos e amassos na cama onde ela dormia com o marido ciumento. Depois de fazerem amor como dois selvagens, Joaquinzinho confessou:

- Foi tesão à primeira vista. Assim que a vi pela primeira vez senti que você seria minha.

Martinha deu uma sonora gargalhada:

- Eu também, assim que o vi pela primeira vez, meu coração bateu mais forte.

Tornaram-se amantes, com a cumplicidade indireta do marido. Gelson confiava plenamente no amigo. Sempre que os quatro se encontravam e iam jantar, Martinha e Joaquinzinho trocavam carícias, com os pés, por debaixo da mesa.

Depois, na cama, riam da ingenuidade de Gelson.

Aliás, ele continuou ciumento, desconfiava do padeiro, do vizinho, do homem da loja de móveis, até mesmo do irmão. Nunca desconfiou de Joaquinzinho. Para ele, o amigo era sagrado.

Martinha e Joaquizinho tiveram a certeza de uma coisa: se o amor era cego, o ciúme era muito mais!


Nota do Editor: Celamar Maione é radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical, Rádio Globo e Rádio Tupi. Faz freelance na época do Carnaval na Rádio Tupi, na cobertura de barracão de escolas de samba e na Marquês de Sapucaí. Leciona Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

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