Os três vinham subindo a rua. A mãe, com malas e sacolas, a menina com um lindo vestidinho verde com detalhes em rosa – presente do último aniversário – e o menino, com uma blusa de frio – própria para o inverno russo. Pareciam felizes. O sol estava quente. Muito quente. O chão de terra parecia refletir e aumentava ainda mais o calor. As sacolas aumentavam sua agonia e seu enorme cabelo pinicava-lhe o pescoço. O suor escorria pela face e pelos braços. Ela desejava chuva. Ou um rio. Mas um descanso seria perfeito. Lindas e perfumadas flores enfeitavam a beira do caminho. O calçamento lembrava as ruas francesas, com grandes pedras do tempo colonial. Pétalas caíam do alto, como gotas de chuva. Havia arcos por sobre os três, protegendo-os do sol, soberano. A pequena Maria pulava e dançava, embalada pelo canto dos pássaros. E pela sua imaginação. O menino João brincava com as pedras. Chutava-as pela rua, como se direcionando o posicionamento de cada uma para o seu bem-estar. Os pés, ainda pequenos, davam passos firmes para um local desconhecido. Não se importava, já que não sabia o que estava acontecendo. O sol continuava o mesmo. As árvores, os montes e as plantações de milho no caminho eram novidade para as duas crianças. Brincavam a cada passo. Olhar admirado e confuso alternando-se a cada frustração momentânea. - Está perto? - Sim. - Nosso avô já nos viu? - Não. - Nem por fotos? - Não. O sapato de João estava empoeirado. O vestidinho verde de Maria também. Seus pés estavam machucados de tanto andar. O menino queria colo, mas sua mãe não tinha condições. Caminhavam há um bom tempo. A Caravan preta deixara-os acerca de seis quilômetros da nova casa. Um aperto sufocante. A caminhada era bem-vinda assim que desceram. Mas, dez minutos depois, tornara-se um martírio andar naquele calor. De longe os avistou. Respirou aliviada: estava próximo. O sorriso tomou-lhe a face e já não mais sentia cansaço. Andou apressada, desejando um abraço dos pais. As crianças andavam mais comedidas, uma vez que desconhecia os avôs – não os viram nem ao menos por foto. A felicidade se misturava com medo de rejeição. A casa era pequena, com um rio que corria próximo. Lindas árvores, um pequeno chiqueiro, algumas plantações. Sensação de segurança e acolhimento. Ela se lembrou da infância. E do amor incondicional de seus pais. E das lutas para sua sobrevivência. Percebeu aquele lugar como seu melhor lar, de onde não deveria ter saído. As lágrimas começaram a surgir. O avô levantou o pequeno João e o abraçou com orgulho. A avó ficou aguardando a decisão da neta: abraçada à mãe, escondendo o rosto, temendo não se acostumar com o novo ambiente. Mas a incerteza não durou um minuto. Os tios surgiram do quintal para dar boas-vindas. E os cachorros latiam e uivavam de forma estranha e interessante. Todos se abraçaram e celebraram o retorno dela. O sol foi embora, desolado – não notaram mais sua presença. A família, em festa, sorria e clamava por um futuro mais digno. Ela, com as crianças, davam início à nova vida. Uma mistura de realidade e fantasia.
Nota do Editor: Mateus dos Santos Modesto é jornalista. Veja também em www.mateusmodesto.com.br.
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