Silvia acordou feliz. Aliás, felicíssima. Soube que Paulo, seu antigo amor, estava de volta à cidade depois de longos seis anos. Ela não o havia esquecido. Tentara, mas não conseguira. Suas amigas não imaginavam que ainda tinha uma “quedinha” por ele. Ela sempre negava. Mal falava seu nome. Mas quando lhe contaram que ele retornaria, ela terminou o namoro de cinco meses com Murilo, alegando monotonia. Paulo se mudara da cidade para tentar a vida na capital. Estudou em duas faculdades, mas não terminou nenhuma. Trabalhava em uma grande empresa como assistente administrativo. Ganhava bem, mas não o suficiente. Morava com amigos. Há muito sem ver os pais. Não estava feliz. Silvia sonhava com Paulo. Lembrava dos tempos que namoravam: foram quase três anos. Não se recorda do motivo do término do relacionamento. Hoje, acredita que podem reatar. Sorri sozinha pelos corredores da casa e do trabalho. Até planos de casamento ela já tem. - Mas, menina, você acha que ele ainda quer alguma coisa? – questionava uma das amigas. - Não sei. Mas algo me diz que ele ainda me ama. – respirava fundo. - Sei... cuidado! O coração nos engana. Ela não estava enganada. Cada suspiro era a certeza do amor dos dois – assim pensava. Trabalhava mais feliz. Arrumava a casa sem reclamar. Beijava o espelho e se cuidava mais ainda. Paulo a viu na rua. De longe, mas não teve certeza. “Está tão linda!”, falou baixinho. Não teve coragem de ir até ela. Seu coração acelerou. - Será que ela sabe que estou aqui? - Quem? - Silvia. Será que ainda sente algo por mim? - Quem? - Silvia. - Silvia? Ela namora Murilo. - Terminou. – respondeu outro amigo. - Mesmo? – animou-se Paulo. Os dois sonhavam com o casamento. E acordavam, no meio da noite, sorrindo. E não conseguiam mais dormir. Planejavam o reencontro, o pedido de namoro, o noivado, os filhos... amavam-se mais ainda. Paulo não namorava ninguém. Silvia não queria saber dos meninos da cidade. Aguardava seu velho amor. - Há um mês que ele está aqui e nunca veio te ver. - Ela ainda não falou de você para nenhum de nós. - Ele ficou seis anos fora. Deve ter algum novo amor. Uma noiva, talvez. - Ela estava com Murilo. Desde que você foi embora, ela nunca ficou sozinha. - E por que você? Ele pode ter qualquer uma. Não se iluda. - E por que ela vai reatar, rapaz? Vocês namoraram quando adolescentes. Isso já faz quase dez anos. Não volte não. Os dois não conseguiram dormir naquele dia. Todos os sonhos agora pareciam loucura. Era bobagem pensar em um novo relacionamento. Não valia a pena insistir. Eles choraram. No dia seguinte, caminhando pela rua, Paulo se bate com Silvia. Literalmente. Ele, andando de costas, observando uma vitrine. Ela, conversando. Tudo parou. Olharam-se nos olhos. Pensaram em todos os tempos juntos, os sonhos de dias atrás, o que falar. Ela tremeu. Ele ficou com a garganta seca. O coração dos dois parecia gritar. - Oi. - Oi. - Há quanto tempo... - Pois é. - Você está bonita. - Obrigada. Os dois ficaram novamente calados. Não sabiam o que conversar. - Bom, preciso ir, Paulo. Vou trabalhar. - É... Que bom. Ela estendeu a mão para ele. Nervosa, quase o beijou na boca. Sorriu, mais desajeitada ainda. Seu coração apertou quando o viu sumir na esquina. “Por que não daria certo?”. “Porque não daria certo”. Baixou a cabeça, respirou fundo e voltou à realidade.
Nota do Editor: Mateus dos Santos Modesto é jornalista. Veja também em www.mateusmodesto.com.br.
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