25/11/2024  09h40
· Guia 2024     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
COLUNISTA
Mateus Modesto
23/05/2008 - 11h41
Amor platônico
 
 

Ela o viu chegar e não conteve o sorriso. Tentou disfarçar, olhando-o apenas pelo reflexo da tela do computador. Ela suspirava por Renato. Sempre quando sentia seu perfume, ou ouvia sua risada ou sua voz. Ou quando pensava nele.
Esperou ele aparecer em sua mesa. “Fingirei que não o vi chegar”, pensou. Continuou a digitar. Salvava o arquivo, apagava e recomeçava a digitação, tudo para não girar a cabeça na direção dele. E ficou nessa estratégia até se cansar: longos cinco minutos. Resolveu levantar-se e ir tomar uma água, um café, um chá, um ar fresco. Seus olhos se mexiam para os dois lados, mas não avistou Renato.

- Onde ele está? – pensou alto.
- Ele quem? – indagou uma das colegas.
- “Ele quem” o quê? – ar de desentendida.
- Eu que pergunto.
- O quê?
- “O quê” o quê?
- “Eu que pergunto”, disse você. O quê?
- Anh?

Ficou na discussão que não viu Renato entrar e sair de uma sala.
Continuou a busca e não o encontrou. Bebeu água, chá, café, foi ao banheiro... Suspirou e voltou ao serviço.
Renato é um ex-colega de trabalho. Permaneceu na empresa por “inesquecíveis dez meses e quinze dias”. Ficava com ela todos os dias na mesma sala – os dois e mais três pessoas. Ela o amou em segredo desde o primeiro minuto. Era possível perceber seu olhar perdido, suas mãos trêmulas, seu sorriso bobo e todas as outras indicações de uma enorme paixão.
Imaginava uma vida com ele. Passeios, piqueniques, entardecer no Farol da Barra, jantar no restaurante da esquina, sanduíche natural, três filhos e um cachorro... Seriam muito felizes. Mas Renato não havia atentado em todo aquele tempo.
Ela agora estava desamparada em frente ao computador. Olhava para alguns papéis, para o armário, lixeira, mesa... Não via razão em mais nada. O seu dia chegaria ao fim se não pudesse falar com ele. E clamou a Deus por isso. E assim Ele fez.
Renato apareceu repentinamente. Conversou qualquer coisa com um ou outro e ficou perdido no meio do corredor. “É agora!”. Levantou-se e se dirigiu a ele com passos firmes. Não via mais ninguém. “Eu digo: ‘Olá! Há quanto tempo’ e dou meu olhar cativante”, formulou. Mas, receando um mau hálito, desviou do percurso e entrou no banheiro. Caçou uma bala no bolso e chupou rápido, praticamente comendo-a. Ajeitou os cabelos e saiu.
Ele ainda estava no corredor. Mas com outras duas mulheres. Ela não pensou duas vezes. Andou firme, vagarosamente, olhando de cima a baixo, analisando toda a situação. Todos perceberam aquilo. Não era seu estado normal. Com um olhar intimidante, voltou ao banheiro para chorar.

- Você é mais bonita, mais inteligente, mais alta, mais sociável... – olhando-se para o espelho. – Você é mais inteligente, mais alta, mais sociável... – analisando-se. – Você é mais inteligente, mais sociável... – refletindo sobre sua vida. – Você é mais inteligente! É sim!

Saiu mais uma vez decidida a falar com ele. Encontrou-o numa roda de amigos. Sentou-se próximo e falou baixinho: “Oooi, Rê!”. Tão baixo que ninguém escutou. Aumentou o tom de voz, gradativamente, mas ninguém ouvia. “Renato!”, gritou nervosa. Ele se assustou.

- Claudia, queria mesmo falar com você...
- Comigo? – seu coração explodiu.
- Sim. Nunca mais...
- ... conversamos nem nos beijamos? É. Sinto falta de você também. Seus abraços, seu sorriso, seu perfume, seu “bom dia”... – pensou ela.
- Carla!
- Oi!? – arregalou os olhos.
- Está aí? Você... Seu olhar parece perdido...

Ela ficou sem graça. Alguns tentavam segurar o riso. Outros a olhavam diferente. Imaginou que houvesse comentado o que não deveria. Havia pensado alto novamente? Não sabia se saía da sala ou mantinha a inocência. Ter a certeza do acontecido poderia humilhá-la. Mas a curiosidade a matava. Ficou em silêncio por duros 60 segundos.

- Eu te amo! Você nunca reparou nisso? Você me ama? Acha que podemos sair para um encontro? Fala alguma coisa! – pensou.

Diante de tantas incertezas, fez o óbvio. Pediu licença, levantou-se e andou até o banheiro. Trancou-se no reservado, arrancou uns metros de papel higiênico e começou a chorar.


Nota do Editor: Mateus dos Santos Modesto é jornalista. Veja também em www.mateusmodesto.com.br.
PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "CRÔNICAS"Índice das publicações sobre "CRÔNICAS"
31/12/2022 - 07h23 Enfim, `Arteado´!
30/12/2022 - 05h37 É pracabá
29/12/2022 - 06h33 Onde nascem os meus monstros
28/12/2022 - 06h39 Um Natal adulto
27/12/2022 - 07h36 Holy Night
26/12/2022 - 07h44 A vitória da Argentina
ÚLTIMAS DA COLUNA "MATEUS MODESTO"Índice da coluna "Mateus Modesto"
02/03/2014 - 10h00 Tarde na roça
02/02/2014 - 08h00 O amor
29/04/2009 - 07h01 Noite inesquecível
16/01/2009 - 13h09 A Velha
09/01/2009 - 07h11 Carta de despedida
18/12/2008 - 12h11 Incongruência
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2024, UbaWeb. Direitos Reservados.