Ela estava ali, mas ninguém a notava. Durante todo o dia. Apenas um “bom-dia” sem olhar para o seu rosto. Com certeza não conseguiriam identificar a cor do batom ou da maquiagem que estava sobre os olhos. O seu nome era Carla, mas todos a chamavam de Bia. Até hoje não se sabe o motivo. Talvez tenha sido uma brincadeira em seu primeiro dia de trabalho, ou alguém que se parecia com ela e tinha esse nome. Ela não se importava com isso. Apenas queria ser lembrada nas festas de aniversário, na praia de domingo ou no passeio no parque aos sábados. Coisas simples e divertidas. Mas era tímida para convidar e mais ainda para aceitar. - Bom dia! – disse seu novo colega de trabalho. - Bom... – ela não respondeu por completo, porque nunca a esperavam responder. - Não tomou café hoje? Ela se assustou. Ficou confusa. Não era relacionado com o trabalho, mas com ela. Algo além do comum. Não sabia o quê responder. Nem se era necessário. Ela ficou olhando-o estática. Ele permaneceu ali. - Olá! Alguém aí? - O-oi! Er... desculpe, meu nome é Bia. - E por que você está com o crachá de Carla? Alguém havia reparado nela. Ela quase desmaiou. E, novamente, não sabia o que fazer. Parecia tão óbvio – apenas responder. Mas não para ela. Apenas sorriu e passou a mão no cabelo, colocando-o atrás da orelha. - Quando eu voltar, vou querer a resposta. - Assim me chamam. - Você gosta? Ela nada respondeu. - Então não deveriam. O dia parecia outro. Ela estava radiante, completamente diferente. Percebeu que não precisava esconder-se só para ser aceitável. Não a respeitavam, tratavam-na como alguém insignificante – ainda que não atentassem a isso. - Bom dia, Bia! - Carla. - Oi? - Meu nome é Carla. Não sei quem é Bia. Essa foi a primeira de muitas mudanças. Algumas perceptíveis apenas para ela. Outras, sentidas por todos os seus colegas. Ela não ficou mais chata ou mais amigável, nem mais bonita ou mais feia. Alterou sua postura: mais confiante, opinativa, decidida. Passou de um peso morto a uma voz num deserto. Antes que o mês terminasse, ela viajou, saiu para o cinema, foi a uma festa de aniversário e passeou no parque. Tudo com seus colegas. Tudo o que queria. Coisas simples, mas divertidas. Muito divertidas. Principalmente para ela.
Nota do Editor: Mateus dos Santos Modesto é jornalista. Veja também em www.mateusmodesto.com.br.
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