Sempre que me vêm à cabeça imagens das férias da juventude, lembro-me das pessoas, dos passeios, das conversas e por último dos lugares. A maior parte dessas férias aconteceram em Santos, um emaranhado de edifícios com uma praia enorme na frente. Íamos de bonde de um lado ao outro da cidade. Visitávamos o Orquidário, o Aquário e nos fins de tarde costumávamos pescar na Ponta da Praia. Tenho vagas lembranças dos lugares, mas me lembro nitidamente das conversas com os amigos. O mesmo aconteceu quando comecei a vir para Ubatuba. Minha primeira viagem foi com um colega de escola, depois continuei vindo de forma autônoma e depois ainda com a minha mulher. A grande atração das viagens eram as conversas, a troca de idéias, as impressões sobre a vida, os planos, as venturas e desventuras de cada um. A praia e as paisagens eram complementos. Se os amigos estivessem reunidos num sítio dava na mesma. Em 1966 fui preso em uma manifestação estudantil, na rua Maria Antônia. Eu era um mero espectador. Estava olhando curioso o movimento quando a Polícia Marítima cercou o quarteirão. Os policiais não se dobraram aos meus argumentos. Depois de levar algumas cacetadas para ficar quieto, fui colocado em um ônibus. Destino, DOPS. Houve então um festival de interrogatórios. Na seqüência nos acomodaram em celas. Onde cabiam vinte pessoas puseram sessenta. Ficamos lá esperando que as famílias viessem nos libertar. Fora o incômodo do sanitário, um buraco no chão no fundo da cela, foram dois dias de puro divertimento. Estavam presentes estudantes de Filosofia, de Economia, enfim, gente da nata da USP, hoje alguns em posição de destaque no cenário nacional. Ficamos presos dois dias, dois dias em que aprendi muito com os colegas que se tornaram amigos. Eles tinham a maior das qualidades humanas. A disposição de discutir, de trocar idéias, de conversar. Sinto falta disso. Muita falta. Sobram paisagens, faltam idéias. É um imenso vazio. Está chegando a hora de fazer as malas.