Na última sexta-feira tive de dar uma passadinha por São Paulo. Coisa rápida. Fui de manhã e à noite já estava de volta. Depois de fazer as minhas obrigações, resolvi caminhar pelo centro da cidade, lembrar de tempos que não voltam mais. Enquanto andava pela Praça do Patriarca, não pude deixar de notar duas velhas senhoras, que conheço há muito tempo e que há muito tempo não via. A última vez em que nos encontramos foi no velório da prima de uma delas. Já faz mais de quinze anos. As primas eram idênticas na essência, porém tinham gênios distintos. Um caso patológico, embora brigassem o tempo todo, estavam sempre juntas. Desde a morte da prima a sobrevivente permanece sem eira nem beira. Ou se preferirem, perdeu o eixo, como ocasionalmente acontece com um conhecido senador da República que gosta de cantar. Quando me viram as duas abriram um largo sorriso e me convidaram para o chá, na Confeitaria Vienense, logo ali na Barão de Itapetininga. Sem tempo, acabamos entrando num café que fica defronte às Arcadas, no Largo São Francisco. Os leitores devem estar curiosos para saber quem são as minhas amigas. Faço pois as apresentações. Uma é a Direita, a outra a Elite. Conservadoras, outrora foram grandes aliadas em conspirações, agora já estão mais acostumadas com as voltas que o mundo deu. Elite por exemplo, está parecendo uma garotinha. Siliconada e turbinada de tanto puxar ferro, nem parece ter quatrocentos anos. Já a Direita, coitadinha, está velha e decadente. Desde a morte da prima Esquerda, à qual me referi no começo desta narrativa, perdeu a razão de viver.

- O que as duas queridinhas fazem aqui, perguntei.

- Estamos comprando passagem para o México disse Elite. Você sabe como é a Direita, quando descobriu que encontraram a arma que Mercader usou para fazer um furo na cabeça de Trotski, perdeu o sossego.

- É sim menino, continuou Direita. Vou comprar o furador de gelo e exibir para os meus amigos. Será o meu troféu preferido. Ramón Mercader merecia ser canonizado pelo serviço prestado à humanidade.

Elite me olhou com ar de espanto e fez sinal que a outra está meio biruta. Sorrimos levemente de cumplicidade. Eu não poderia deixar de perguntar o que elas estavam achando da crise.

- Qual crise o quê. Onde você está vendo crise, perguntou Elite. Nosso xodó, o presidente Lula vai limpar o PT e continuar fazendo do Brasil um exemplo para o mundo. Economia estável e atraente para os investidores, contas em dia com o FMI e credibilidade internacional. O que queremos mais?

Nosso primo Mercado ligou de Paris e disse que pega em armas para defender Lula caso os esquerdistas saiam da linha. Esses barbudinhos vão ver o que é bom. Aconteça o que acontecer Lula pode contar com Elite, Direita e Mercado. Estamos com ele e não abrimos. Depois de pagar os cafés nos despedimos e elas foram embora em direção ao Teatro Municipal. Falando mal de Roberto Jefferson.