Corria o ano de 1998. Nessa época eu vivia em São Paulo, na Vila Olímpia. Um dia, ao fugir da geléia de tráfego entrei na rua do hospital São Luiz. "Foi maus tio", diria o meu sobrinho que só não o fez porque não estava presente. Quase no cruzamento da avenida Santo Amaro notei haver um tumulto. Era dia de jogo no Morumbi, jogo do Corinthians. Diversos ônibus seguiam para a "batalha", repletos de torcedores barulhentos. Com metade do corpo para fora das janelas a malta batucava sem ritmo e importunava a todos que cruzassem o seu caminho. Na entrada do hospital havia um carro manobrando. Num certo instante a janela traseira do carro se abriu e um torcedor que viajava num dos ônibus percebeu que o passageiro era o cantor Leonardo, da dupla sertaneja Leandro e Leonardo. Com câncer em estado adiantado, o pobre rapaz ia para o hospital fazer tratamento. A visão do ídolo fez momentaneamente com que a batucada cessasse. Começou um coro ritmado: Leonardo, Leonardo, Leonardo. O cantor abriu totalmente a janela e acenou para os fãs que de um momento para o outro mudaram o tema e passaram a repetir de forma cadenciada: vai morrer, vai morrer, vai morrer. Eu estava próximo e pude ver o ar de espanto no rosto do cantor, que de fato morreria dias depois. Na hora concluí que se há no universo alguma coisa realmente infinita, sem dúvida é a estupidez humana.
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
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