Estranhei quando anunciaram o nome. Severino Cavalcante Spencer. Imaginei um nordestino com todas as peculiaridades dos habitantes da região. Levantou-se um senhor alto, loiro e mais britânico do que o chá das cinco. Depois de ser atendido sentou-se ao meu lado, estávamos no aeroporto aguardando embarque. A curiosidade falou mais alto, vencendo a timidez. Perguntei se ele era inglês e como a resposta fosse afirmativa, fiquei com cara de quem quer perguntar mais, o que pareceu divertir meu interlocutor. Com sotaque britânico ele afirmou que o nome tinha origem nas excentricidades do pai, Lord Spencer, famoso arqueólogo que esteve no Brasil pesquisando desenhos pré-históricos no Piauí. Depois de três meses na terra, sem contato com ninguém além de dois guias e três mulas, Lord Spencer foi para o Recife esperar pela chegada de Lady Spencer, sua mulher, cujo sorriso fazia lembrar vagamente uma das mulas. Enquanto aguardava a atracação do navio, Lord Spencer sentou-se num bar perto do cais, onde experimentou as iguarias servidas pelo dono, ex-marinheiro que falava um pouco de Inglês. Tomou caldo de sururu, bebeu catuaba e caipirinha e finalmente comeu uma buchada de bode. Quando Lady Spencer desceu do navio ele a levou para o primeiro hotel que havia e nove meses depois nasceu o fruto daquele louco amor vespertino. O nome foi uma homenagem ao dono do bar, na verdade Sebastião Valadares, mudado para Severino Cavalcante por razões comerciais. Lady Spencer morreu velhinha, portando o mal de Alzheimer. Sempre que ouvia a palavra Recife sorria com expressão de felicidade.
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
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