Conversa (des)afinada
Numa nota lacônica, nossa presidente nega com veemência ter recebido uma herança pesada. Afirma tratar-se de uma herança bendita. Há herdeiros indulgentes, assim como há herdeiros ingratos, por vezes dentro da mesma agremiação partidária. É muito fácil listar episódios em que o governo adotou linhas de conduta discutíveis, bem como outras verdades incômodas, sem merecer, por essa observação, o rótulo de ressentido. Fácil, mas aparentemente isso não passa de um exercício estéril. A postura oficial consiste em “denunciar”, através de porta-vozes de plantão uma tentativa de golpe, de “destruição” do PT, tudo temperado com considerações endossadas por militantes indignados com a “torpeza das elites reacionárias”. Da mesma forma que não faz sentido negar méritos de diversas ações deste governo e do que o antecedeu, sem tornar-se eco de sua propaganda, o ato de endeusar o grande guia, omitindo erros cometidos por ele, a seu mando, ou seguindo sua orientação representa a tentativa de criar uma versão que não resistirá à apreciação objetiva da História. Vale lembrar que um crítico não se situa acima do bem e do mal, ao expressar suas opiniões, seja ele “acadêmico inovador”, ou autor de “uma tentativa menor de reescrever a história”. “É importante” - sustentava Baltasar Gracián, alguns séculos atrás - “discernir o homem que dá palavras daquele que dá efeitos”. Querer quebrar os espelhos do reino não tornará o príncipe mais fotogênico.
Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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