Conversa (des)afinada
A Olimpíada 2012 terminou. Imagino não ter contado nenhuma novidade. Imagino. Agora, estamos contemplando as 17 medalhas conquistadas e surge a pergunta: E daí? Surgem os indignados com aquilo que julgam ter sido um desempenho pífio. Como foi possível? Nós, a sexta economia do mundo, termos ficado atrás de nações com menor relevância etc. e tal. Muito bem, pelo critério das medalhas de ouro conquistadas, estamos ocupando o 22° lugar. Isso é grave? É bom lembrar que não está em jogo a afirmação de uma nação, de um sistema político, de um “nunca antes na história deste País”. Colhemos o que plantamos, como poderá dizer qualquer observador desapaixonado. E o que plantamos? Onde estão as inúmeras praças poliesportivas, as piscinas, os técnicos e onde está escondido o material humano imprescindível para se subir nessa escala de valores? Onde foi parar o Ostapenko? Vamos lembrar que não há um embate entre países, apenas um confronto entre o que de melhor do ponto de vista atlético levamos à arena, com outros indivíduos talentosos e igualmente sedentos de sucesso. Com o risco de ser repetitivo, tornarei a citar Jacques Brel: “À la minceur dês épluchures, on voit la grandeur des nations”. (Pela espessura das cascas - no caso de batatas - se mede a grandeza das nações.) Ele estava satirizando, e nós estamos levando isso a sério. A grandeza do Brasil não se mede em quilos de medalhas. Com seu refinado savoir-faire, nossa presidenta comentou logo depois da cerimônia de abertura que aquilo era muito bonito, mas nós saberemos fazer melhor. Disse-o para a alegre trupe de acompanhantes - mais de 50 pessoas. De boas intenções... Ocorre que se a idéia for apresentar algo melhor em termos de desempenho, acordamos tarde. Foram gastos no ciclo olímpico mais de 2 bilhões de R$, e o resultado foi o que se viu. Logo, não é só o dinheiro, mas como foi gasta essa grana. Não é hora de buscar indicadores do tipo; medalhas / km² de extensão territorial, ou medalhas por participante (já fizeram essa conta e deu 15.2 medalha por atleta), ou ainda medalha/PIB. É melhor deixar essas estatísticas do lado. O fato é que, esquecendo o número de vezes que “batemos na trave”, poderíamos ter apresentado um resultado algo melhor, mas ainda ficaríamos longe das potências olímpicas. Temos condições de alcançá-las? A resposta é SIM. Resta saber quando. Sem partir do famoso “está tudo errado”, vejamos o que poderá ser feito. Desde já, uma péssima notícia. Já não há mais tempo suficiente. Os atletas que lá estiveram poderão melhorar um pouco, mas dificilmente progredirão o suficiente. Sim, o Esquiva poderá ser ouro, o vôlei masculino e de praia poderão... o handebol feminino... a Fabiana Murer poderá encontrar ventos favoráveis, a Mauren ficará mais nova, o Duda poderá saltar melhor. Mesmo assim, é muito pouco. Concordo que não será fácil encontrar um Felpis, ou um Zé Bolt nacional. Esses não nascem todo dia, mas melhorar o desempenho de nadadores, corredores, arremessadores (de ambos os sexos) é uma tarefa que se inicia cedo. Não precisamos usar os métodos empregados na China, ou no antigo bloco socialista, nem apelar para farmácias de manipulação, na tentativa de driblar os exames anti-doping. É preciso observar, que a exemplo da gravidez, há prazos. Um moleque brilhante que hoje está com 12 anos, dificilmente reluzirá em 2016. Nossas esperanças para 2016 deverão residir na melhora dos atuais protagonistas - naqueles que não se aposentarem até lá - e no talento daqueles que hoje veem nascer fios de bigode e seios - sem maliciar, por favor, refiro-me aos próprios atributos. Temos Bolsa-atleta. Ótimo. Melhor ainda se, deixando o anti-americanismo de lado, copiarmos algumas práticas que por lá vicejam, como as bolsas em instituições de ensino - conciliando o polimento das nossas gemas com o estudo. Em suma, um sistema de quotas. Por que não? Como não pensaram nisso? Para tanto, melhor deixar a discurseira ufanista de lado e vamos tentar recuperar, na medida do possível, o tempo perdido. Não existe geração espontânea de atletas. Os Bolt, e Blake surgiram a partir de um sistema de ‘peneira’ criado a partir de competições escolares. Como fazer isso se, nas nossas escolas, as aulas de Educação Física topam com dificuldades ridículas: falta de professores, falta de quadras, falta de piscinas. Bobagem falar em mercenários já milionários que não dão a mínima. Os jogadores de basquete da NBA ganham o que nossos melhores profissionais nem sonham e se dedicaram de corpo e alma. Finalmente, deixando espaço para comentários futuros, é hora de parar com tolices como as que alijaram nossa melhor jogadora de basquete - Iziane, ou nossa melhor ginasta Jade Barbosa, em função de picuinhas que poderiam ter sido resolvidas com mais inteligência. Enquanto a inteligência estiver cumprindo suspensão automática, as chances serão poucas. Nem tudo está perdido. Poderemos brilhar, organizando um evento inesquecível, ganhar a medalha de ouro da hospitalidade, cumprir cronogramas e assimilar lições proporcionadas pela nossa experiência. Alguém se lembra do que foi o PAN?
Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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