No trajeto entre o aeroporto de Funchal e Ribeira Brava (cerca de 31 km) o taxista comenta o progresso da Ilha da Madeira impulsionado com verbas do Mercado Comum Europeu. Como exemplo desse progresso ele cita a construção da via expressa que percorríamos e que permitia vencer a distância em cerca de 20 minutos. No entanto, a utilização das antigas vias, embora mais demorados, nos permite uma melhor contemplação das vilas e terraços em forma de escadas, construídos com pedras, material muito abundante. Nesses terraços se cultivam hortaliças e frutas (bananas, anonas, laranjas...). A construção de mais de uma centena de túneis facilitou a integração entre as várias cidades e vilarejos da ilha, vencendo o terreno extremamente acidentado. E para garantir a segurança dos pousos, a pista do aeroporto foi ampliada sobre o mar, como se fosse um imenso viaduto, debaixo do qual foram instalados equipamentos esportivos. Ao lado do aeroporto, em Machica, se vê uma pequena praia dourada. A guia nos explica que são areias trazidas do deserto do Sahara para encobrir as pedras pretas vulcânicas da beira do mar. A grande atração de Porto Moniz são as pequenas cascatas nas encostas e piscinas naturais no interior dos recifes, as quais proporcionam maior segurança aos banhistas e um espetáculo bonito de se ver quando as ondas se elevam em brancas espumas ao se chocarem com os recifes. Cada pedaço da ilha é explorado pela indústria do turismo que é a principal fonte de renda. Suas maiores atrações são seus bordados e a beleza natural que é realçada pelo cultivo de muitas flores. Há roteiros para todos os gostos e idades e caminhos que circundam toda a ilha, atravessando-a de norte a sul e de leste a oeste. Até os canais de irrigação (as levadas) que levam a água para as partes mais secas são usados como trilhas para caminhadas de curta, média e grande dificuldade e esforço. Os vários aspectos da flora, fauna, história, cultura, gastronomia e artesanato local são expostos pelos guias em várias línguas. Mas a dificuldade de absorção da mão de obra fez com que grande parte da população emigrasse para a Europa e para a Venezuela, para onde há vôos diretos semanais (para o Brasil não há). A população reclama que, devido à crise européia, houve um aumento de impostos e a Ilha é meio esquecida. Os portugueses do continente reclamam que sustentam a Ilha porque lá o imposto é menor e muito da dívida de Portugal foi usado para financiar a infraestrutura da ilha e um padrão de consumo irreal para a economia da Ilha. Com as facilidades de financiamento desse novo padrão de vida, muitos habitantes abandonaram a produção agrícola, predominantemente manual e familiar, devido ao tamanho das propriedades e ao extremo declive do solo. Hoje, há uma volta dos jovens à atividade agrícola nas propriedades dos pais e parentes. Quando lá chegamos, estava se iniciando a segunda maior festa, que atrai o maior número de turistas - a Festa das Flores - largamente divulgada em todos os meios de comunicação e da Rede de Televisão Portuguesa, que fazia a cobertura ao vivo diariamente. Essa festa é aberta com a construção do Muro das Flores, em forma de arquibancada, pelas crianças das escolas na Praça do Município. Também são construídos tapetes de flores nas ruas centrais e na porta dos principais hotéis. Nessa festa se destacam as estrelizias, proteas e orquídeas, as quais aparecem em belíssimos arranjos e reproduzidas nos bordados e no artesanato local. As proteas, flores símbolo da África do Sul, de cores e formatos variados, se parecem um pouco com o nosso bastão do imperador são cultivadas por toda a ilha e exportadas chegando a alcançar o valor de 3 euros por unidade (mais de 8 reais). Vendo os tapetes feitos com flores me lembrei dos tapetes da procissão de Corpus Christi e de quanto não valorizamos nossos produtos e nossas tradições. Se lá, que apenas se chega por mar e pelo ar, a Festa das Flores está atraindo quase o mesmo número de turistas que no réveillon, porque não podemos investir nesse filão se temos uma variedade de flores tropicais de grande beleza e durabilidade como as helicônias, alpínias, bromélias e outras. A tradição dos tapetes já temos. E pesquisas com nossas flores também já temos porque o Horto Florestal tem desenvolvido novas variedades dessas flores. E lá, embora a temperatura seja mais amena que em Portugal, na primavera suas águas são muito frias. Para pegar uma praia como as nossas só indo para ilha de Porto Santo.
Nota do Editor: Rui Alves Grilo é professor da rede pública de ensino desde 1971. Assessor e militante de Educação Popular.
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