“Tem dias que a gente se sente Como quem partiu ou morreu...” Chico Buarque Às vezes bate a sensação de que todo dia temos que pegar um touro a unha e apesar dos esforços a realidade não muda para melhor. Hoje, mais uma vez ouvi uma pessoa dizer que uma das dificuldades para que os conselhos funcionem é a falta de participação popular. Vindo de um representante da sociedade civil me causa profunda irritação. Em geral, os Conselhos funcionam no horário comercial e os representantes do poder público participam durante o horário de trabalho, sendo, portanto, pagos pela população. E cada um deles, teoricamente deveria contribuir com a experiência e o conhecimento da área em que atuam e, cada um deles tem um suplente para garantir a participação. No entanto, não é isso que acontece no CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, em Ubatuba (SP). Há representantes que raramente participam, contribuindo para a falta de quórum o que impossibilita a tomada de decisões. O ECA, em seu Artigo 4º diz: “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos...” Frente a essa realidade podemos dizer que o Poder Público está cumprindo a lei? Como exigir dos cidadãos o cumprimento se ele é o primeiro a descumprir. Muito diferente é a participação da sociedade civil. Sabemos que as instituições da sociedade civil são muito frágeis ainda e lutam para sobreviver, dependendo do esforço voluntário através da mão de obra e até dispendendo recursos econômicos próprios. Para participar do Conselho tem que abrir mão de outras atividades e do convívio com a própria família, sacrificando horas de trabalho e de lazer. Para se deslocar, não conta com carro oficial tendo que arcar com custos de transporte. As condições de participação são muito desiguais. Como persistir na participação quando você deixa seus afazeres e perde o seu tempo se deslocando e o trabalho não anda porque não houve o quórum necessário? Esse processo de desmonte do Conselho vivemos no ano passado e acreditávamos que iria ser superado depois do processo de autoavaliação do CMDCA e do Conselho Tutelar proposto pelo programa Ação Proteção. Pensávamos que se a Prefeitura assinou um termo de parceria com a Fundação Telefônica, seria para valer e haveria uma real mudança de atitude no que se refere ao CMDCA e ao Conselho Tutelar. No entanto, não é isso que está acontecendo. Estamos de novo entrando num processo de esgarçamento de ações, num processo de empurrar com a barriga. No processo de autoavaliação ficou claro a necessidade de formação dos membros dos conselhos e a participação no Programa Ação Proteção tem se revelado um instrumento eficiente porque abrange os vários aspectos do atendimento à criança e ao adolescente: a evolução histórica da questão, as contribuições da Psicologia, da Sociologia, do Serviço Social, das questões jurídicas e das inter-relações entre as várias instituições. Mas como se formar e avançar se não há continuidade na participação?
Nota do Editor: Rui Alves Grilo é professor da rede pública de ensino desde 1971. Assessor e militante de Educação Popular.
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