Conversa (des)afinada
A PDVSA apresenta garantias para refinaria. Finalmente, a PDVSA apresentou duas cartas de fiança no valor de R$ 4 bilhões, como garantia ao BNDES para a participação na construção da refinaria Abreu e Lima. (O Estado 4/10 B8) É o momento de utilizar o linguajar CVMês padrão: “Os termos ’antecipa’, ’acredita’, ’espera’, ’prevê’, ’pretende’, ’planeja’, ’projeta’, ’objetiva’, ’deverá’, bem como outros termos similares, visam a identificar tais previsões, as quais, evidentemente, envolvem riscos ou incertezas previstos ou não pela Companhia. Portanto, os resultados futuros das operações da Companhia podem diferir das atuais expectativas, e o leitor não deve se basear exclusivamente nas informações aqui contidas.” Dessa maneira, ninguém poderá dizer que esse texto é capcioso. “Acredita-se” que o custo atualizado da refinaria seja de R$ 26 bilhões, sendo esse valor algo como o triplo do inicialmente projetado. O acordo firmado entre Suas Excelências Lula e Chávez previa que a participação venezuelana seria de 40%. Esse percentual foi o resultado de intensa negociação. Agora, a boa notícia. O BNDES aprovou as garantias, e as apresentará à Petrobras. Pergunta óbvia: O que tem a ver a Petrobras com o uso que o BNDES fará do dinheiro? Perguntará ao BNDES se tem certeza que vai emprestar à PDVSA, ou que receberá o dinheiro de volta no prazo pactuado? Uma notícia morna: As cartas de fiança apresentadas atestam que o português Banco do Espírito Santo cobrirá 75% do valor e o ‘nosso’ BB o restante (25%). Ou seja, a PDVSA receberá RS 4 bilhões do BNDES, com um quarto disso garantido pelo BB. Além de entrar com um petróleo de pior qualidade, fato que “deverá” encarecer a obra, o que fará a PDVSA, além de cobrar através de Chávez maior espírito de colaboração da Petrobras, onde de acordo com o presidente venezuelano “há setores que não querem o acordo, assunto que será tratado com ’minha querida Dilma’”? A má notícia: Se o custo for de R$ 26 bi, como se “antecipa”, a parte da PDVSA seria um pouco maior que os RS 4 bi que o BNDES emprestará. Calma, a PDVSA, por enquanto “objetiva” cobrir apenas 40% dos custos incorridos até agora. Depois... “prevê” integralizar o restante. Não haverá problemas, mesmo porque a obtenção das garantias atuais foi bem rápida – alguns meses de tensas negociações. Evidentemente há “riscos envolvidos”, mesmo nesse negócio entre irmãos. Não cabe analisar de quem são os riscos, embora a resposta seja óbvia. De qualquer maneira, até a PDVSA fornecer seu quinhão de petróleo, “antecipa-se” que o BNDES financiará também a parcela restante da PDVSA. Não cabe discutir a relação BNDES Petrobras, porque tudo estará em casa. Talvez, um ou outro minoritário da Petrobras questione. Problema dele. O que se pode “prever”, a curto prazo, é uma longa discussão para identificar o quanto já se gastou, para determinar o valor dos 40% venezuelanos – sem necessidade de CPI. Chávez não é tolo! Como as condições do financiamento do BNDES não devem ser escorchantes, o projeto se pagará com relativa rapidez e a PDVSA poderá “planejar” quitar o empréstimo, com o resultado da empreitada, e sobrará apenas uma pergunta: Para quê essa parceria, já que em breve o pré-sal, além da discussão sobre o pagamento de royalties, estará produzindo à toda, a OGX do empresário Eike deixará de produzir apenas “fatos relevantes” e poderá vender parte de sua produção de petróleo à refinaria Abreu e Lima, sem contar a HRT e outros produtores menores? Depois de assentada a poeira, a PDVSA ficará com 40% do resultado de exploração e... poderemos, mais tarde, imaginar que ela ‘pretenda’ reviver o “episódio Itaipu”. Seria temerário “acreditar” que sem grandes gastos – não limitados apenas ao custo das cartas de fiança –, a PDVSA “deverá” se tornar sócio na proporção 40/60 da mais moderna refinaria da América do Sul?
Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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