Conversa (des)afinada
No seu excelente artigo “Quem são mesmo os porcos nesta história?”, José Neumanne analisa, dentro das limitações de espaço do Estadão, a ‘era da faxina’, marcada por demissões, afastamentos e oportunas entradas em férias. Essa onda purificadora decerto arrancará, cedo ou tarde, do nosso sempre loquaz ex-presidente, constatações do tipo: “Com tantas contusões, fica difícil escalar o time”. Afinal, com sua aguda percepção, e a inabalável adesão às metáforas futebolísticas, Sua Excelência resumiu o embate situação x oposição nesses termos lapidares: “Nesse jogo, os que estão no banco torcem para que o titular quebre a perna”. De fato, o atual Dream Team sofre perdas que dificilmente poderiam ser lamentadas, mas estão criados vazios nos organogramas. Esses vácuos atraem o olhar rútilo do pessoal da fila de espera, que agita as senhas e entoa palavras de ordem. A base aliada – outros preferem grafar alugada – entra em ebulição. O despertar da cobiça é apenas um efeito secundário, mas sempre digno de menção. Por enquanto, as perdas – a exemplo de certas gordurinhas – estão localizadas, nem vale a pena citar a localização. Ou vale? Está bem. “Por enquanto”, foram detectados indícios de podridão numa área restrita. Nem é possível afirmar, embora, um ou outro possa ter um palpite mais forte, se estamos diante de uma jazida, um lençol ou apenas ocorrências esparsas. Tampouco merece crédito a teoria segundo a qual os malfeitos estariam circunscritos no feudo do PR. É possível assumir sem enormes riscos a hipótese de estarmos diante de uma ‘província’ da corrupção. Uma espécie de pré-sal. Debaixo de uma crosta, blindagem segundo alguns, haveria uma verdadeira festa. O potencial das reservas imorais seria aterrador – falando sempre no futuro do pretérito, nada de acusar sem provas. O que fazem os suínos no título? Simples. O autor alude ao rótulo PIG (Como todo aplicado aluno de Inglês sabe, trata-se de porco vivo. Jamais confundir com Pork.) A rigor, não há novidades no texto. Estamos “carecas de saber” que há falta de decoro em doses cavalares, embora dificilmente possamos avaliar, com alguma precisão, a extensão da praga que devasta a moral e as finanças públicas. Seria necessário efetuar novas ‘perfurações’ para ter um retrato completo. Falar em ‘doses cavalares’, talvez seja exagero. Falemos em doses para pôneis. Não vale a pena aprofundar a pesquisa, uma vez que, cedo ou tarde, determinado ex-ministro haverá de colocar os pingos nos is. José Neumanne dá nome aos bois – não que haja surpresa, já que todos eles se tornaram conhecidos nesses últimos 15 dias. Dados os nomes aos bois, localizou-se também o estábulo de origem. A Presidente está realizando uma enorme tarefa, mistura de dois trabalhos de Hércules: Derrotar a Hidra de Lerna – cujas cabeças renasciam depois de cortadas – e limpar os estábulos do rei Augias. (Coincidentemente estes nunca foram limpos durante 30 anos, vejam que coincidência!) Qual é o mérito do artigo? Está claro que é preciso reconstituir sempre, obstinadamente, à exaustão, os passos dos meliantes – nomeando-os –, sob pena de sobrar, com o passar do tempo e a ocorrência de ‘novas proezas’, apenas uma vaga lembrança de um malfeito sobre o qual a nomenklatura joga uma insistente e persistente cortina de fumaça. Sabemos como isso pode terminar: As denúncias são desqualificadas, os acusados são contemplados com o status de vítimas, não sei, não vi, tudo não passa de uma farsa, é tudo obra do PIG (Partido da Imprensa Golpista). Essa sigla repetida ad nauseam pode levar os menos informados a acreditar que estamos na iminência de um golpe. A legião dos aduladores do “mago metalúrgico’ não precisa de evidências. Acredita piamente e espalha. Já que falamos em PIG, por que não falar em PBL – Partido dos Blogueiros Lacaios, PSCV – Partido dos Sem Coluna Vertebral? No governo do PT fica clara a tendência de tentar fazer prevalecer as versões sobre os fatos. Por isso é tão importante repetir aquilo que os inconformados já sabem e os subservientes fazem questão de ignorar. Há níveis de sujeira que o discurso daqueles que “não governam apenas por um terço da população”, segundo modestamente afirmam, não consegue encobrir. Para todas as trapalhadas, com ou sem corrupção, o PBL contra-ataca. Tome-se um caso recente. A tentativa precipitada – o eufemismo cabe – do BNDES de participar do projeto Carrepão. As penas-pagas já têm a resposta na ponta do mouse. “Ora, e no caso da ´Privataria` (o termo já está dicionarizado), o BNDES financiou empresas e nem ao menos recebeu de volta”. Como se fosse possível definir previamente quem iria quitar ou não os financiamentos. Para isso existem garantias, e se forem mal escolhidas, castigue-se quem as aceitou. O BNDES não é uma organização ingênua, tanto é que não aceitou as garantias de Chávez para o projeto da refinaria Abreu e Lima. No entanto, colocar no mesmo patamar varejistas e empresas integrantes da infraestrutura é forçar a barra. Mas é uma bela tentativa, sobretudo em conversas que logo se transformam em invectivas, quando o nível da gritaria, medido em decibéis tenta fazer prevalecer o engodo. Excesso de decibéis não acrescenta credibilidade, mas isso é apenas um detalhe. Pode ser que isso não seja suficiente e que, ao fim e ao cabo, a gritaria não resolva. Nesses casos, surge uma resposta padrão a qualquer acusação: “Isso não é novidade (já estamos de saco cheio dessa história de mensalão que nunca existiu), informações requentadas, disputa de terceiro turno, tentativa de desestabilizar o governo e finalmente, tentativa de GOLPE. Diria um químico: Qualitativamente até pode ser, a corrupção não constitui novidade, mas quantitativamente, pelamordedeus!
Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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