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COLUNISTA
Alexandru Solomon
23/03/2011 - 13h13
Reflexões
 
 
Conversa (des)afinada

Segundo Sacha Guitry, ao ouvirmos uma peça de Mozart, temos a satisfação de saber que o silêncio que se segue ainda é de autoria de Mozart. Seria o caso de apreciar o silêncio que se segue às fanfarras que acompanhavam os discursos do Nossoexpresidente. Esse silêncio é de autoria dele.

Na falta dos imponentes decibéis, só nos resta conformarmo-nos com as falas comedidas de sua sucessora. É visível a saia justa na qual está metida, por não poder aludir, a não ser de maneira elogiosa ao solene abacaxi com o qual se depara, legado indigesto do “Cara”.

Restam-lhe afirmações de menor impacto, se bem que de maior profundidade. Mesmo assim, por força do convívio com o ilustre antecessor, vez por outra escapam algumas pérolas, como na entrevista concedida ao jornal Valor.

“Não permitirei a volta da inflação”. Fácil de dizer, como se o fenômeno inflacionário estiver a lhe pedir licença para se manifestar. “Inflation, go home!”. Simples assim. Como se tudo fosse apenas questão da tão decantada “vontade política”. Não se trata de uma pequena inflação que poderia fazer um grande bem. Fechamos a porta à inflação “tout court”.

Como a lendária Dolores Ibárruri, Dilma profere seu no passaran.

Resta saber como, louvando todavia a firme determinação.

Muito se tem falado do famoso corte de R$ 50 bi, em que pese um certo ceticismo quanto à exeqüibilidade de tal façanha, já que há itens intocáveis e escasso espaço de manobra. Os cortes propostos atingiriam emendas paroquiais de parlamentares e encetariam um trato mais severo dirigido a algumas despesas de custeio – viagens, diárias etc. Louvável, mas insuficiente! O tempo validará essa manifestação de louváveis intenções.

Mais preocupante parece a intenção de injetar 55 bi no BNDES em paralelo à louvável austeridade. Argumenta-se que, dessa maneira, recursos fluiriam para as indústrias, possibilitando um aumento da oferta, de modo que a demanda – cujo crescimento é admitido, mesmo se com ressalvas – seria atendida.

Falta colocar o eixo dos tempos nesse gráfico e observar que os financiamentos – por melhores que sejam, não frutificam instantaneamente. Então?

Um ou outro purista seria capaz de identificar nessas repetidas injeções – algo como R$ 250 bi, nesses últimos três anos – a irrefreável tendência de chamar de idiotas a quem manifestasse alguma preocupação com nosso endividamento. Ora, se de um lado injetamos e se do outro lado o BNDES se torna devedor, o efeito líquido é nulo dizem os nossos Kirchneristas, entrincheirados no MF.

Para não repetir a comparação com o barão de Münchausen que pretendia voar puxando para cima a crina de seu cavalo, resta uma analogia mais prosaica. É a tentativa de voar ministrando-nos impactos, como no conhecido exercício que consiste em bater com os calcanhares nos próprios glúteos. Se funciona nos treinos de corrida, não há motivo para que não seja aplicável na economia.

Um outro mito que se propaga atualmente é o do efeito salutar do “Senhor crise” – como foi apelidado por conhecido jornalista econômico – sobre a economia do Japão. Naturalmente, ninguém pode falar sobre o desastre que infelicitou o Japão sem externar a angústia que a tragédia desperta em qualquer ser humano. Horror à parte, floresce uma crença algo equivocada.

O argumento apresentado é que por força da tragédia, os japoneses cerrarão fileiras e partirão para a reconstrução que envolveria algo com USD 180 bilhões. Pouco importa identificar de que maneira foi obtido esse número, que ameaça virar consenso de tanto que foi repetido.

O fato é que, seguramente, essa mobilização acontecerá. Seguramente, recursos serão alocados na reconstrução, o que agitará a economia estagnada do Japão. No entanto, é óbvio o exagero e o desejo de simplificação.

Se reconstruir é tão benéfico, que tal destruirmos também, criando oportunidades para uma alocação ótima de recursos. Essa observação vem de um longínquo 1850 e pertence a Frédéric Bastiat. Não se tem notícia do efeito benéfico sobre o nosso PIB advindo dos nossos desastres ambientais.

Obviamente, haverá uma atividade febril de reconstrução – seja qual for seu custo. No entanto, isso levará apenas à volta ao estado anterior à desgraça, com substituição de ativos por outros de melhor qualidade. É claro que haverá mobilização de mão de obra, recrutada no seio do exército industrial de reserva. Haverá aumento da massa salarial e o botão START estaria sendo apertado. E as perdas decorrentes da catástrofe? Guerras e catástrofes naturais são motivos de mobilização redentora, sim. Reconstruir, no entanto, leva apenas em passo acelerado à situação de antes do drama.

Devido à urgência, haverá beneficiários – o Brasil, entre outros – mas enxergar uma oportunidade nisso, só porque um ideograma chinês tanto pode significar crise como oportunidade parece exagero.


Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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