| Arquivo UbaWeb | | | | Bado Todão na ópera `As lavadeiras de rio e seus amores de mar´. |
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Acabo de sair da casa da Marisa Muniz, onde o grupo Ubacunhã apresentou uma peça musical para marcar a passagem da Paz de Iperoig. Ou seria da Traição de Iperoig? Como se sabe, temendo os tamoios, os portugueses propuseram um acordo com os índios para depois traí-los e dizimá-los. Enquanto assistia a apresentação, vários sentimentos afloravam: orgulho por ver e ouvir uma apresentação tão bonita, e, ao mesmo tempo, de muita tristeza pelo fato de que apenas um pequeno grupo tenha acesso a fruir desse espetáculo cultural. Não por culpa d os artistas mas das nossas autoridades constituídas e comerciantes que não percebem que o apoio aos nossos artistas, propiciando condições dignas de produção e exibição, poderia ser um motor para alavancar o turismo e o comércio da cidade. É só olhar o exemplo de Paraty e São Luiz do Paraitinga. Talvez, poucos saibam que o Bado conquistou o prêmio de teatro Myriam Muniz garantindo-lhe os recursos para montagem da ópera “As Lavadeiras de rio e seus amores de mar”, uma história de amor que tem como fundo o universo caiçara. Como contrapartida deverá fazer apresentações em oito cidades do litoral paulista. Para mim, ficou muito presente a imagem de Heitor Villa Lobos, porque, como o Bado, o alicerce, a essência de sua produção é a cultura popular. No entanto, o maior reconhecimento de sua obra veio do exterior. Quase toda a sua produção foi gravada fora do Brasil e, talvez seja o músico erudito brasileiro mais conhecido e interpretado no exterior. Há alguns anos atrás houve um movimento cultural e artístico chamado “Tambores da Paz” com o objetivo de combater a intolerância e fortalecer os laços de solidariedade através da música, essa arte mais primitiva, que mais mexe com a sensibilidade e que podemos produzir sem nenhum instrumento, apenas com nosso próprio corpo. Como a “Paz de Iperoig” é considerado o primeiro tratado de paz das Américas, comemorado inclusive como feriado municipal, poderia ser celebrado com grande pompa e circunstância como uma luta pela paz verdadeira cujas bases sejam o respeito e solidariedade entre as diferentes culturas e identidades. Os vários grupos culturais – negros, índios e brancos, jovens e velhos – fariam um grande desfile pelas principais ruas da cidade culminando com um grande show celebrando a vida e a alegria. A incorporação dessa festa no calendário turístico da cidade e o empenho na garantia da infraestrutura adequada, poderia ser mais um fator de estímulo às atividades turísticas e comerciais, contribuindo para o aumento da autoestima dos moradores e para a geração de emprego e renda. Muito se fala em desenvolvimento sustentável. Mas não haverá desenvolvimento se não se levar em conta que o maior recurso que o município possui é o seu povo e a sua cultura. Cabe aos governantes o planejamento e a destinação de recursos para o seu pleno desenvolvimento.
Nota do Editor: Rui Alves Grilo é professor da rede pública de ensino desde 1971. Assessor e militante de Educação Popular.
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