O Secretário da Segurança do Rio de janeiro, Anthony Garotinho, agiu de forma leviana ao solicitar tropas federais para por fim à guerra do tráfico, que começou na Rocinha e espalhou-se por outras favelas. Para completar, sua mulher, Rosinha Garotinho, governadora do Estado, tergiversou dizendo que se o acontecimento fosse em São Paulo, a imprensa não daria tanto destaque. Citou o assalto sofrido pelo filho do governador Geraldo Alckmin e a morte do segurança do filho de Lula, numa tentativa de assalto, dizendo que a imprensa não deu maior destaque aos dois fatos. Em parte a governadora tem razão, a criminalidade avança em todo o país, notadamente em São Paulo, onde ocorrem dezenas de seqüestros relâmpagos por dia. No Rio, dada a notoriedade nacional e internacional da cidade os acontecimentos repercutem mais. Em São Paulo a exclusão fica longe do centro, só em alguns bairros acontece a mistura presente no Rio de Janeiro, onde favelas e bairros de classe média vivem lado-a-lado. Voltando ao pedido de Garotinho, vamos supor que o exército ocupasse os morros e lá ficasse. O que aconteceria? As tropas são oriundas, na sua maioria, de bolsões sociais parecidos com o da área de ocupação. Logo os soldados estariam namorando, fazendo amigos, convivendo com a população da favela. Seria um passo para que muitos fossem corrompidos pelo poder econômico do tráfico. Por outro lado, supondo que houvesse uma pacificação forçada na guerra entre os traficantes, ainda assim o tráfico continuaria a ser feito. A violência seria adiada, saindo as tropas, a guerra recomeçaria. E com ela as repercussões que tanto incomodam Rosinha. Fica uma pergunta no ar? O que o secretário Garotinho quer? Se a intenção dele é solucionar o problema então o enfoque deveria ser outro. Primeiro entender o tráfico, para depois tomar uma atitude. Isso implica em analisar o comportamento da sociedade em relação às drogas. Vai incomodar muita gente. Vai exalar mau cheiro, feder, há muita hipocrisia no ar quando o assunto são as drogas e principalmente quando se fala dos usuários delas. Eu já vi todos os tipos de cidadãos de destaque, consumindo cocaína, nos mais respeitáveis salões do país. Delegados, jornalistas, cirurgiões, pilotos de linha aérea, políticos, arquitetos, banqueiros, promotores, artistas, professores, enfim, membros da fina flor da sociedade aspirando suas carreiras com brilho. Sempre em festas. No outro dia o delegado prendeu um bêbado. O jornalista escreveu sobre os males das drogas e o promotor acusou um traficante. Assim segue a vida com a terra girando impávida ao redor de seu eixo e em torno do Sol. E vai continuar sendo assim, até o dia em que for inventado um produto que adicionado às drogas, tornará a pele do usuário listrada como a das zebras. Aí a hipocrisia que campeia nestas paragens vai ficar exposta, não haverá como explicar o visual inusitado. Solucionar o problema passa primeiramente por esquecer o que fazem os americanos em relação ao problema. Eles estão tentando acabar com o pecado do álcool e das drogas desde a Lei Seca. Não conseguiram e não vão conseguir, continuarão fazendo a mesma coisa todos os dias e apesar de não ter dado certo até hoje, esperam que um dia isso mude. Insensatez para não dizer estupidez. Copiar os métodos deles em nada vai ajudar a resolver o problema nacional. É o que está sendo feito. Drogas fazem parte da sociedade. As pessoas se drogam e vão continuar, isso é uma questão de foro íntimo. Esportistas não costumam usar drogas que possam prejudicar seu desempenho, embora aceitem de bom grado qualquer aditivo que os coloque no pódio. Desde é claro, que não apareça nos exames antidoping. Costumam aparecer na televisão fazendo campanhas antidrogas. Sabe-se que todos os recordistas das mais diversas modalidades usam ou usaram algum tipo de doping. Onde está a verdade? O fato é que enquanto houver consumidores, haverá vendedores prontos para satisfazer seus desejos. Portanto, se hoje a polícia prender ou matar todos os traficantes do país, amanhã outros assumirão. Se for repetido o feito amanhã, depois de amanhã haverá uma nova safra de traficantes, oferecendo o de sempre. Enquanto existirem drogados, haverá tráfico. E sempre haverá gente consumindo drogas, é da natureza humana. Atire a primeira pedra quem nunca fumou um cigarro (tabaco) ou nunca bebeu uma cerveja. Tabaco e álcool são drogas, muita gente já morreu em prisões por traficar esses produtos. O Brasil está vivendo uma gigantesca crise moral, onde a hipocrisia que sempre campeou está sendo colocada em xeque. É positivo. Alguma solução sairá disso. Resolver o dilema do poder dos traficantes é das questões mais urgentes do país. Eles poderão, se não forem contidos, organizar-se e criar problemas como na Colômbia, onde exércitos lutam para controlar os lucros provenientes das drogas. Pouco está sendo feito para mudar o quadro.
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
|