Conversa (des)afinada
"Brasil x Espanha 1950; ou Paris vaut bien une messe." O resultado daquele jogo foi 6 x 1, não 7 x 0, conforme saiu no Estadão do dia 1 de junho. Por que fui mencionar isso? Para poder em seguida, partindo de uma verdade, tentar entender o modo petista de debater. Vamos ao ’silogismo’ – que nada tem de silogismo. Nada mesmo, aí está a graça. Abramos aspas: "O Brasil ganhou de 6 x 1, não de 7 x 0 como tentou fazer crer determinado órgão da mídia reacionária e golpista" – amordaçado há mais de 10 meses, não se sabe por quanto tempo, aliás ninguém parece dar bola, temos assuntos mais importantes do que lamentar a desdita do periódico. Vamos ao "corolário" da "neológica". Mais aspas: "Esse jornal se valeu dessa mesma maneira torpe de distorcer os fatos para afirmar que 90% da cocaína que ingressa no Brasil o faz pela via cocalera, como pretende o Sr. Serra – o sujeito que irá cortar férias e mexer no FGTS, segundo o bem informado Paulinho, partidário da farsa (sem trocadilho) de espalhar o terror, um gentleman, em suma. Na verdade o valor correto seria 83,75852% o que demonstra a má-fé do candidato e do jornal. Se houve uma informação errada – dirão os neoaristotélicos – o resultado do jogo, para quem ninguém mais dá pelota, não será mais possível dar crédito total ao Estadão. Quod erat demonstrandum! Bonito e elegante! Doravante, vamos acreditar nos golden boys da situação. Um marciano recém-chegado, ao tomar conhecimento dessa bulshitagem geral, concluiria que além de demonizar o governo boliviano, Serra deve seguramente alimentar-se de criancinhas (isso se o seu gastro não proibir). O problema não são as conclusões dos marcianos, infelizmente. Conforme assinalou um assinante bem-informado, numa epístola ao jornal sectário que mesmo assim publicou a bobagem, o maior consumidor de cocaína são os EUA, fato não mencionado pelo subserviente – numa apreciação imparcial desse mesmo assinante. Serra omitiu esse dado fundamental – assim como o é a temperatura de fusão do urânio enriquecido ou empobrecido – talvez, pela boa e simples razão que o assunto era outro. Tadinho do governo boliviano, agredido dessa maneira. Justo esse governo irmão que, delicadamente invadiu as instalações da imperialista Petrobras – cujo valor de mercado é de ’muitas’ Bolívias. Mas que é nossa, enfim, deles. Não, é nossa mesmo. O importante, nessa fase de denso nevoeiro – quando ninguém sabe ao certo até onde é possível jogar-se na área, pedindo pênalti, até ser expulso – é cometer o máximo de irregularidades inteligentes, infringir a lei. O custo, se houver, será infinitamente menor que o estrago causado "ao outro lado". "Aloprados" parecem brotar por geração espontânea, gargantas de aluguel, idem. Se Paris valeu uma missa para Henrique IV, a presidência vale meia-dúzia de multas. Multas... alguém dá bola, se quem paga, se algum dia pagar, será o contribuinte? Veremos a repetição de cenas de outras campanhas, nas quais o candidato declarava – citando Groucho Marx: São esses meus princípios, agora, se não gostarem, tenho outros. Pergunto: É possível haver um debate sério, decente, fidalgo?
Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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