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COLUNISTA
Alexandru Solomon
17/04/2010 - 07h10
Mitos, quimeras e discursos de campanha
 
 
Conversa (des)afinada

Enquanto os entendidos discutem se atravessamos uma recessão violenta, uma depressão benigna ou uma reles marolinha, se a recuperação tem forma de L, V, W ou até WWW, é possível, sem correr o risco de ser chamado de “lobo em pele de cordeiro” tecer algumas considerações a respeito de uma causa perdida de antemão. Refiro-me aos mercados que sabem cuidar de si.

A “falência da crença” teria recebido sua impactante confirmação nesse chacoalhão de grau 8 na escala Richter que abalou as economias do planeta. A incapacidade dos mercados virou dogma, com a bênção de ilustres premiados, ou legítimos aspirantes ao Nobel. Talvez fosse possível censurar-lhes o timing de suas vibrantes teses. Mas essa é uma outra história.

Para poupar o tempo (de quem escreve e de quem lê) vamos pressupor que os episódios Bear Sterns, Lehman brothers, Fanny & Freddie continuam presentes na memória. Falou-se muito no cassino global e na irresponsabilidade dos bancos. Faltou dar a devida importância a uma faceta humana; o comum dos mortais adora achar-se mais esperto do que o vizinho do prédio ao lado. Obviamente, os aplicadores, investidores, especuladores etc. levaram chumbo grosso por querer “novidades” de alto retorno. Sim, queriam investir nos tentadores papéis de altíssima rentabilidade, num momento em que os juros baixos garantiam retornos seguros, porém ínfimos aos investidores cautelosos. Ser prudente virou sinônimo de ser trouxa, e isso poucos aceitam, quando a fortuna do tal vizinho cresce vertiginosamente. Daí, foram criados os produtos subprime com falsos selos de qualidade AAA e os ativos tóxicos invadiram o planeta, como se fosse possível auferir indefinidamente grandes lucros com riscos decrescentes. Por sinal, aqui nada de muito grave aconteceu por uma questão de tempo. A maionese internacional desandou com demasiada rapidez. Faltou, por sorte, tempo hábil para que importássemos os monstrengos e, não nos esqueçamos que aqui existe um sistema de controle que fez muita falta alhures. (As traulitadas da Sadia e Aracruz foram de outra natureza: as vítimas, movidas por intenso patriotismo, apostaram no Real e não contra, como andaram dizendo por aí.)

Uma vez declarada a pandemia, os governos entraram pesado, injetando trilhões em TARP´s (ativos dodói), comprando ações dos bancos gravemente feridos, baixando os juros etc. Isso teve um custo e a conta ainda não foi apresentada na sua totalidade.

Vamos a uma assertiva que poderá me valer a cadeira elétrica. Os mercados se autorregulam, sim, senhor. O problema é que em 2008-2009, essa autorregulação teria sido catastrófica. Passaria por um cenário de horror, com hordas de desempregados vagando sem rumo, quebra de bancos, guerra civil, enfim, cenas de apocalipse, claramente inaceitáveis. Naturalmente, era impossível deixar as coisas degringolarem até o reencontro do novo ponto de equilíbrio. Ninguém se atreveria a estimar onde se encontraria tal ponto. Seria como se, para resolver os engarrafamentos nas cidades grandes, se decidisse aguardar um momento de grande congestionamento e asfaltar por cima. Os sobreviventes estariam num mundo melhor – os soterrados, também, diriam os cínicos. Perfeitamente justificável, portanto, a intervenção dos governos.

O que já não é tão convincente é a frase tantas vezes ouvida:

“Primeiro falaram no deus-mercado e depois ao constatar a falência do modelo todos correram para os braços do Estado. Os neoliberais julgavam ser o mercado infalível e, na verdade, só o estado o é”, com o corolário: “Estado mínimo, nunca mais!”

É claro que a intervenção estatal era imprescindível, e isso nada tem a ver com o tamanho do estado. O mercado não cobra impostos, quem determina as alíquotas é o estado. Se, por aqui, houve renuncia fiscal, renunciou quem tinha a possibilidade de cobrar. O mercado não estabelece as alíquotas de IPI dos automóveis, móveis e eletrodomésticos. Se me perdoam a visão mecanicista e a aproximação grosseira, falar a respeito do mercado é como comentar a lei da gravidade. Se não prestarmos atenção, haverá tombos, por isso inventaram redes para trapezistas. Sem intervenção um funâmbulo desastrado constataria que além das fraturas há sempre um ponto de equilíbrio no chão.

Wells Fargo, Sogen ou Santander não podem emitir moeda – embora possam emitir quase-moeda. Quem o faz é o estado, seja ele mínimo, máximo ou médio. As famosas injeções de liquidez não tiveram por origem a vontade divina, ou tiveram, já não sei mais. Afirmar que não saíram de graça é falar mais do mesmo óbvio ululante.

Pelo fato de os governos terem voado em auxílio das instituições financeiras à deriva – alguns queriam que houvessem ajudado os devedores pessoas físicas – não está demonstrado que haja necessidade de um estado anabolizado e onipresente.

Depois de tomar uma pancada na cabeça, a tendência é procurar um abrigo seguro. Foi o que ainda não deixou de acontecer. Sustentar que o desejável é um estado mamute para que possa ser visualizado no meio da procela é piada de péssimo gosto. Os olhares se voltam na direção de quem efetivamente ajudará.

Nesse momento entra a teoria – não se trata de unanimidade, por sorte – segundo a qual o estado é mais capaz de gerenciar a complexa máquina econômica. Nem tanto. Tivemos por aqui exemplos de ineficiência e de ocupação insensata de alguns espaços. Dificilmente poderá se demonstrar que o estado é um grande gestor de redes hoteleiras.

Por isso não faz muito sentido apostar em verdades únicas, passando por Estado-indutor, sedutor, redentor etc. As decantadas vantagens de um planejamento centralizado ainda não foram demonstradas e dificilmente o serão.

Há mais um aspecto a ser discutido, já que sobrevivi até aqui.

Qualquer medida econômica funciona durante determinado tempo, por mais equivocada que ela seja. Por exemplo: nossos congelamentos, a paridade peso x dólar imposta na Argentina, a amarração da onça de ouro a 35 dólares etc. Sim, Berenice, funcionaram. Resta saber se a perturbação introduzida surtirá efeitos positivos perenes ou terá a duração de um sonho administrativo. Mais importante ainda. Será que passada a fase bem-sucedida, virá a hora de pagar a cristaleira detonada? Ou, tanto faz o que for acontecer, desde que seja no próximo governo?

No Brasil, a saída encontrada foi estimular o consumo, sem dar muita bola para o investimento. O endividamento das famílias aumentou com o crédito farto, mas o mercado interno vitaminado fez frente à desgraça. Funcionou! Ninguém sabe o que teria acontecido caso privilegiássemos o investimento, se os juros caíssem a zero, se, se, se... E daí que o superávit primário encolheu e que precisou de mandracarias contábeis (somar depósitos judiciais, ignorar para esse efeito alguns investimentos, antecipar dividendos de estatais) para distanciá-lo de Zero? Who cares? As observações possíveis são sinônimo de descobertas de alternativas melhores? Como saber? As medidas foram tomadas pelo governo, ninguém discute. Foram salutares. Por conta disso vamos afirmar que o governo deve ser sócio permanente da indústria de fertilizantes?

Em Pindorama, não é de se esperar que novos gigantes estatais sejam uma panacéia. Tanto o sufixo “Brás”, quanto o prefixo “Embra”, não são uma tábua de salvação!


Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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