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COLUNISTA
Alexandru Solomon
17/10/2009 - 11h02
Olimpíada 2016
 
 
Conversa (des)afinada

Conta Pausânias que coube a Heracles a glória de ter instituído os Jogos, dando-lhes o nome Olímpicos. Ele decidiu que teriam de se desenrolar a cada cinco anos, já que ele tinha quatro irmãos. Fazendo uma conta rápida, chega-se ao número cinco. Posteriormente quis o destino que eles se desenrolassem a cada quatro anos.

E eis que a honra de sediar a Olimpíada de 2016 coube ao Brasil.

Patriotadas e ‘Nunca antes na história deste país’ à parte, há motivos de sobra para festejarmos a escolha do COI, mesmo o Sr. Jacques Rogge tendo afirmado que o papel do NOSSOPRESIDENTE não foi o fator determinante na escolha.

Será uma festa para a qual devemos nos preparar, para que imagens imperecíveis sejam evocadas por gerações. Todos se lembram das lágrimas do ursinho Misha – na olimpíada de Moscou de 1980, ou do discurso dublado da chinesinha anônima em Pequim 2008, ou da imagem de Emil Zatopek em Helsinque 1952. Teremos de fazer bonito, encontrar alguma coisa que marque o evento como “Nunca antes na história dos Jogos Olímpicos”.

O conselheiro Acácio, numa tirada facilmente previsível, diria que para se ter um evento notável é preciso investir.

Investir? Ah, bom, nisso não temos problemas. Fala-se em 20-30 bilhões, só não decidimos ainda se serão Reais, dólares ou coroas dinamarquesas. Dinheiro há de sobra e já veio a ordem do NOSSOPRESIDENTE: “Pouco importa o quanto gastaremos, o importante é quanto ganharemos com isso”.

Será que ganharemos? Em outros locais onde, é bem verdade, não canta o sabiá, contabilizaram-se perdas, mas isso é de menos.

Sejamos otimistas.

Segundo Tristan Bernard otimistas e pessimistas sentem igual medo da realidade. Com um pequeno esforço, tentemos ser realistas.

O investimento é de vulto. Há quem fale em PAC das Olimpíadas, como se essa sigla mágica fosse a chave de tudo. Muitos investimentos permanecerão e, de fato, trarão benefícios, alguns até de difícil quantificação: edificar uma Vila Olímpica, construir uma linha de metrô, aprimorar o trânsito com aquele conjunto de nome complicado etc. A importância de alguns desses investimentos é tal que motivam a pergunta trivial: ”Será que se não houvesse a Olimpíada não deveríamos encará-los!?”.

Grupos de trabalho já foram constituídos ou estão em estado adiantado de gestação. É sabido que criar uma comissão resolve todos os problemas, desde a colocação de uma lâmpada à imortalidade da alma. Tudo será fiscalizado com redobrado vigor, como se até hoje nunca houvesse fiscalização de obra alguma. É verdade que ostentamos alguma alergia ao TCU e falamos em “flexibilizar”. Era o que nos faltava: sem flexibilização, nada feito.

A rede hoteleira do RIO terá de ser ampliada - a isso chamamos dimensionar pelo pico. Hoje temos uma ocupação insatisfatória; passados os JO teremos uma capacidade ociosa maior ainda, mas que importa? E nada de piadinhas, por favor. O símbolo continuará sendo o conjunto dos cinco anéis entrelaçados. Podemos apostar que depois dos Jogos não serão quatro. A bandidagem será controlada: o pessoal da pesada oferecerá coroas de flores, no melhor estilo havaiano, aos visitantes. Não vamos maliciar com essas coroas.

Enfim, com um orçamento flexibilizado – os Jogos Panamericanos foram uma amostra edificante – chegaremos à estrutura desejada. Claro, haverá atropelos, assim como houve em Atenas e Pequim, mas com cartazes avisando: “Cuidado, tinta fresca” tudo se resolverá a contento, para gáudio das lavanderias. Mais um estímulo ao PIB.

Um certo acesso de ufanismo já nos faz antever catadupas de medalhas.

Como?

Sempre fomos uma potência média e dificilmente sairemos desse nível, mantida a atual mentalidade. Quando a China decidiu fazer bonito em 2008 houve um esforço impressionante. A partir dos resultados conseguidos em Atenas já se previa que os atletas - e as atletas – arrasariam, quatro anos mais tarde. Com efeito, conseguiram já em 2004 uma safra importante de medalhas. Sem querer ser pessimista, será que em Londres, tirando algumas estrelas, já teremos preparado a geração vencedora de 2016? Um Joaquim Cruz não surge por geração espontânea. Discursos não geram campeões. Os grupos de trabalho abrirão o caminho...

Como?

Com ‘paitrocinio’ de César Cielo, com uma Jade Barbosa que nem salário recebe? Será que reunir presidentes de federações, bater na mesa e exigir resultados bastará? O que de mais notável conseguimos no atletismo foi uma coleção de resultados positivos... de doping, levando ao desespero o dedicado empresário Jorge Queiroz de Morais do Grupo Rede.

É claro que apostar no surgimento de novos talentos é importante. Mas apostar somente não bastará. Para isso temos a Mega-Sena.

É importante estimular a juventude para que possamos, depois de grandes esforços – e os sete anos que nos restam poderão ser ou não suficientes, dependendo do empenho dos dirigentes, conseguirmos alcançar o ‘status’ de potência olímpica.

Com certeza, se pensarmos como Bernard Shaw que dizia que o único esporte que praticou foi a caminhada, acompanhando o enterro dos seus amigos esportistas não chegaremos lá.


Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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