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COLUNISTA
Alexandru Solomon
05/09/2009 - 07h41
Ilusões perdidas
 
 

Para os meus fiéis leitores, um esclarecimento. Tentei, ou venho tentando – para quem tolera o uso abusivo do gerúndio – com que o Estadão, através do caderno Cultura fizesse uma resenha de algum dos meus livros. Tarefa ingrata, considerando as centenas de livros publicados mensalmente. Seria como pedir por um milagre estatístico. Estatística existe, porém os milagres são raros. Finalmente, estabeleci contato com os responsáveis do Cultura, e me foi dito que o caminho indicado seria a remessa, através da minha editora, da obra candidata à imortalização. Quod fecit. O que se seguiria – imaginava eu – seria uma análise crítica da obra, e caso fosse considerada merecedora de uma resenha, seria essa publicada nesse nobre espaço, aspiração de qualquer autor.

Após alguns anos de labuta reconhecida através de premiações no Algarve, Sicilia, Basileia e diversos certames locais, imaginei, cúmulo da pretensão, encontrar no jornal do qual sou assinante há 40 anos – mero detalhe – uma acolhida crítica aos meus textos.

Decorrido algum tempo, sem resposta, solicitei novidades através de e-mail. Novidades havia e da pior espécie para as minhas pretensões... ”com espaço reduzido no caderno Cultura para resenhas e também tínhamos seção fixa relacionada ao Ano de Euclides, evento multimídia do jornal, dedicado a homenagear a passagem do centésimo aniversário de morte do autor de Os Sertões. Com isso, mesmo críticas prioritárias – na avaliação de nossos especialistas – estavam ficando para trás.

Vamos continuar cobrindo, até o fim do ano, com destaque, eventos relacionados a Euclides, mas, para além disso, o volume de próximos lançamentos (estamos às vésperas de mais uma Bienal do Livro) exige, de fato, uma seleção ainda maior. Tudo isso, sem falar que o Cultura, conforme o senhor acompanha, cobre outras áreas além de livros”. Seguia a assinatura do responsável.

Imprensado entre comitês de redação das grandes editoras – repletos de talento e acne juvenil – e as grandes livrarias, cujo comportamento ombreia-se, no trato com seus “fornecedores”, a gigantes éticos como o Carrefour, supus, algo precipitadamente, que encontraria um espaço, por menor que fosse, alguns inestimáveis centímetros quadrados no caderno Cultura. Não seria a revanche do gênio ignorado e sim, uma menção que, desnecessário insistir, seria uma mão na roda. Mão esquerda ou direita, quem iria se importar? Nessas horas, os críticos são ambidestros.

O normal seria, digo isso olhando com veneração meu umbigo, uma vez dada a mostra de gentileza de acolher meu último livro, que se desse alguma sequência ao processo, ou, se fosse o caso que se cortasse pela raiz minha arrogante pretensão. Para que se dispor a receber um livro que não seria lido?

A história foi escrita de maneira diversa.

A opção escolhida foi evitar um não definitivo, algo como: “Não vê que estamos ocupados?” ou, numa concessão à polidez “Desolados, informamos haver irreconciliável conflito entre nossas intenções e nossos compromissos, não podendo receber seu livro” e que se encerrasse o diálogo. Perfeitamente razoável. Não se impõe coisa alguma a um jornal. Não numa democracia. Ainda estamos numa.

É sempre desagradável dizer não. Melhor optar por evasivas do tipo "é meio difícil". Quem leu, nos anos sessenta, um livrinho “Brasil para principiantes” – fulminado em editorial do Estadão – há de se lembrar desse pormenor.

Não foi uma enorme surpresa receber após minha justificável insistência, uma resposta afirmando estar a redação assoberbada de tarefas - inclusive ter sido, aparentemente, colhida de surpresa pelo advento do centenário de Euclydes da Cunha – fato que obviamente, constitui um evento totalmente imprevisível. Assim sendo, fui informado que há mais coisas a se fazer do que debruçar-se sobre o mais recente - espero que não o último – trabalho deste petulante autor.

Dissessem isso de início, nada poderia contestar. A pergunta: “Por qual motivo solicitaram o envio do livro?” permanece no ar.

Estava disposto a acolher com bravura uma sentença inapelável do tipo: “Apesar de insanos esforços, nada encontramos na leitura desse O desmonte de Vênus – nome do livro – que merecesse algo mais que um sorriso piedoso, que dizer uma resenha!” Era um risco ao qual meu ego se expôs voluntariamente.

Aceitar o livro, para em seguida informar que a Bienal se aproxima encerra um certo toque sádico - involuntário, vá lá que seja.

Passei o final de semana relendo um livrinho interessante “Comment devenir um brillant écrivain alors que rien (mais rien) ne vous y prédispose!

Ou seja: Como tornar-se um escritor brilhante quando nada (mas nada mesmo) o predispõe a tal. Escrito em tom de troça – por um autor que se esconde sob o pseudônimo de Aloysius Chabussot – ele respondeu a dúvidas atrozes e, de certa forma as solucionou.

Não é o caso de exclamar como um Zola dos trópicos: J´accuse. Limito-me a um simples Je proteste contra uma promessa vazia.

Moral da história: Só alguém em quem se deposita alguma esperança é capaz de proporcionar uma desilusão.


Nota do Editor: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de “Almanaque Anacrônico”, “Versos Anacrônicos”, “Apetite Famélico”, “Mãos Outonais”, “Sessão da Tarde”, “Desespero Provisório”, “Não basta sonhar”, “Um Triângulo de Bermudas”, “O Desmonte de Vênus”, “Plataforma G”, “Bucareste”, “A luta continua” e “A Volta”. Nas livrarias Cultura e Siciliano. E-mail do autor: asolo@alexandru.com.br.
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