Troco figurinhas pelo Skype com meu amigo Samuca. Eu em Ubatuba, ele em Shenzhen, na China. Samuca é piloto de Boeing 737, trabalhou quase 20 anos na Varig e hoje vive com a família, mulher e dois filhos, em Hong Kong. Estão de mudança para Los Angeles. Ele já morou em Los Angeles antes, em 1981, quando fez curso de piloto de helicóptero. Ao chegar à cidade, com pouco domínio da língua, alugou uma casa apenas dando o nome e pagando dois meses adiantados, mais uma taxa de limpeza para quando deixasse o imóvel. Desta vez, na mesma imobiliária, exigiram uma penca de documentos, inclusive criando caso com a declaração de rendimentos da China. O corretor o reconheceu e disse que os Estados Unidos estão copiando o Brasil. O crédito está difícil. O sistema capitalista floresce quando há crédito. Sem capital não há como prosperar. O capitalismo brasileiro é conservador desde sempre, aqui há dinheiro farto para quem não precisa. Na conversa nos lembramos de um colega de aeroclube que passou maus bocados na crise do início dos anos 80. Dono de empresa sólida, de repente se viu ante a uma séria crise de liquidez. O jeito foi vender casa, sítio, apartamento no Guarujá, carros, enfim, queimar patrimônio. No mercado financeiro não houve como conseguir dinheiro. Os juros praticados eram muito altos, acima do imaginável. Honrar os compromissos assumidos com 500 empregados custou caro. A crise passou, a empresa recuperou a saúde financeira e os bancos vivem oferecendo facilidades, que ele polidamente recusa. Nos Estados Unidos o crédito fácil acabou gerando a crise que está levando à bancarrota símbolos antes tidos como inabaláveis. Quem poderia imaginar a GM estatizada? Penso com a minha monumental ignorância em assuntos financeiros, mas com a experiência de quem sabe observar, que a virtude está no meio. Nem tanto liberalismo lá, nem tanta rigidez aqui. Aprendi mais uma lição. A falta de crédito que antes foi motivo de atraso e de chacotas, hoje é exemplo, o mundo desenvolvido aplaude e tenta copiar. Definitivamente não há verdade absoluta, tudo é relativo...
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
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