As touradas são consideradas esporte. Não são, estão longe de ser e deveriam envergonhar a espécie humana. Esportes existem quando os oponentes usam recursos semelhantes. As maratonas são exemplo de esporte, natação é esporte, até o violento boxe é um esporte. É uma luta entre dois homens. Ambos com pesos equivalentes e armas semelhantes. Touradas são na verdade um ato de sadismo, onde um pobre animal é humilhado, privado de sua dignidade e morto por outro animal de cérebro maior. O espetáculo é deprimente. O touro considerado bom é o teimoso, aquele que uma vez fixada a direção do objeto a ser atacado, olha para baixo e investe. O toureiro desvia, faz alguns passes coreográficos e a platéia vem abaixo. É um combate desigual. O homem tem um cérebro poderoso que comanda mãos hábeis, capazes de empunhar armas letais. O oponente é um animal grande e forte de muitos músculos e pouquíssima inteligência. Por razões genéticas, não muda de direção quando ataca. Antes de receber a estocada final, o touro é torturado. Picadores, montados em cavalos, cravam banderilhas em suas costas. Servem para enfurecê-lo. Lanças com fisgas nas pontas. Cada movimento deve produzir dores horríveis. Torquemada não faria melhor. O animal não compreende a razão de tanta crueldade, sabe, pelos gritos de satisfação da platéia que seu martírio provoca prazer. Enquanto acontece o suplício, milhares de espectadores gritam olé. Hemingway escreveu sobre touradas, guerras e outras atividades humanas onde a violência prevalece. Ele gostava de sangue e escrevia bem. Virou cult nos Estados Unidos, a terra mais violenta do mundo, embora os americanos não sejam como os espanhóis que torturam e matam touros. Americanos matam tudo o que está vivo, inclusive touros, embora gostem mesmo é de matar outros americanos. Uma forma de acabar com as touradas seria operar uma mutação genética nos touros, tornando-os mais próximos das vacas. Ninguém seria louco de tourear uma vaca, elas avançam com os olhos fixos no adversário, caso ele desvie, elas desviam também. Escrevo sobre o tema porque uma crônica do jornal El País chamou a minha atenção. Numa tarde de touros recente, o touro recebeu uma banderilhada em lugar errado, a fisga atingiu um nervo. O animal, impedido pela dor, atacou sem olhar para o chão. Quando o toureiro preparava-se para mais um volteio foi surpreendido pelo impacto dos cornos rasgando suas carnes. Foi atingido na virilha. A estocada arrancou parte da musculatura da perna, expondo o fêmur e dilacerando a veia femural. O toureiro agonizou ao lado do touro, também moribundo. Naqueles breves instantes deve ter compreendido que sua vida foi inútil. As pessoas deveriam fazer mais sexo e deixar a violência de lado. É uma pena que sexo seja pecado.
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
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